Muitos lesados do BES “preferiam ter sido violentados, a terem perdido as poupanças de uma vida”
Advogado de 1600 lesados do caso Espírito Santo critica oposição do Ministério Público a que fosse reconhecido aos clientes estatuto de vítima.
Muitos lesados do BES “preferiam ter sido violentados pelos arguidos, a terem perdido as poupanças de uma vida”. A frase foi dita pelo advogado Nuno Silva Vieira esta quarta-feira no debate instrutório do caso BES, que decorre até sexta-feira no tribunal de Monsanto, em Lisboa.
O representante de 1600 lesados não poupou o próprio Ministério Público, que acusou o antigo banqueiro Ricardo Salgado e mais 24 arguidos no caso que apura responsabilidades criminais no colapso do universo Espírito Santo.
Em causa o facto de os procuradores se terem oposto a que fosse atribuído o estatuto de vítima especialmente vulnerável a muito dos lesados, entendendo que esse estatuto estava reservado a vítimas de crimes violentos e não abarcava vítimas de crimes financeiros.
O primeiro juiz de instrução do caso, Ivo Rosa e, mais tarde, o actual, Pedro Santos Correia, entenderam de forma diferente e concederam esse estatuto a mais de 1200 lesados neste caso. O principal benefício será poderem conseguir ser indemnizados mais rapidamente.
“O Ministério Público nunca esteve preocupado com certos temas. Preocupou-se em defender a sua acusação, de forma acérrima, mas nunca esteve preocupado com a compensação célere dos lesados”, afirmou Nuno Silva Vieira, que disse esperar que no futuro não seja necessário as vítimas terem de se defender do Ministério Público.
O defensor citou o Nobel da Economia Daniel Kahneman para falar na “dor de perder dinheiro” e nas investigações em neurociência que “mostram que a perda de dinheiro pode activar regiões cerebrais semelhantes às envolvidas na experiência de dor física”.
“Este não é o processo do doutor Ricardo Salgado. Este é o processo em que se apuram responsabilidades criminais, patrimoniais e não patrimoniais de várias pessoas que destruíram vidas, sonhos, casamentos, relações e tranquilidade familiar”, realçou Nuno Silva Vieira.
Sobre as 80 dezenas de sessões de instrução, Nuno Silva Vieira garante que só serviram para reforçar a prova que suporta a acusação e pediu que todos os arguidos acusados sejam levados a julgamento.