Morreu Jock Zonfrillo, jurado do MasterChef Austrália, aos 46 anos
A morte, cuja causa não foi tornada pública, levou ao adiamento da estreia da nova temporada do concurso culinário. Zonfrillo era escocês mas revolucionou a imagem da cozinha australiana.
A morte inesperada, aos 46 anos, de Jock Zonfrillo, membro do júri do MasterChef Austrália, deixou a comunidade gastronómica internacional em choque. As redes sociais encheram-se esta terça-feira de manifestações de pesar depois de a família ter anunciado estar devastada com o desaparecimento, no domingo, deste “orgulhoso escocês” que a televisão catapultou para uma fama maior, mas que, antes disso, já fizera um importante trabalho de recuperação e revalorização dos produtos autóctones australianos.
A causa da morte não foi tornada pública, e a nova temporada do MasterChef Austrália, que deveria ter começado na noite de segunda-feira, foi adiada. “Com os corações completamente destroçados e sem saber como conseguiremos seguir em frente na vida sem ele, partilhamos, devastados, a notícia de que Jock morreu ontem”, dizia o comunicado da família divulgado segunda-feira. Zonfrillo era casado, pela terceira vez, com Lauren Fried, com quem tinha um filho, nascido em 2018 e uma filha nascida em 2020. Tinha ainda duas filhas dos casamentos anteriores.
Chefs como Jamie Oliver, Gordon Ramsay, assim como vários concorrentes do programa, reagiram imediatamente. “Não consigo dizer-vos como era bom trabalhar com ele”, escreveu Jamie Oliver, que foi também jurado no MasterChef, à semelhança de Ramsay. “Jock foi muito generoso para mim, com o seu tempo e espírito, no programa e estou-lhe muito grato por isso.”
Várias notícias sobre a morte de Zonfrillo destacaram a sua vida “de altos e baixos”. Nascido em 1976 em Glasgow com o nome de Barry, começou a trabalhar em restaurantes aos 13 anos, lavando pratos, e dois anos depois abandonava a escola para se dedicar inteiramente à cozinha, tendo sido aprendiz, em Londres, do famoso e controverso chef britânico Marco Pierre White, que considerava uma das suas maiores influências.
Tudo aconteceu bastante cedo na vida de Zionfrillo, recorda o The Guardian: aos 17 anos era viciado em heroína e vivia na rua, aos 22 chefiava a cozinha do hotel Tresanton em Cornwall, e aos 24 era head chef no restaurante 41, em Sydney, tendo sido despedido dois anos depois por ter, naquilo que descreveu como “uma piada”, pegado fogo às calças de um estagiário que trabalhava demasiado lentamente para o seu gosto. O estagiário, Martin Krammer, processou-o e ganhou, levando Zonfrillo a declarar falência em 2007, recorda o jornal britânico.
A viver na Austrália desde 2000, abriu vários restaurantes sendo o principal o premiado Orana, aberto em 2013 em Adelaide, no qual trabalhava com ingredientes australianos que descobriu em várias viagens de exploração pelo território australiano e estadias com as comunidades indígenas daquele país.
Esse trabalho levou-o a criar a Fundação Orana para, em parceria com a Universidades de Adelaide (com a qual entrou posteriormente em divergência e ruptura) e com o apoio financeiro estatal, aprofundar o estudo dos ingredientes nativos, criando uma ambiciosa base de dados. Em 2018 recebeu o Basque Culinary Word Prize, que distingue chefs cujo trabalho transforme a sociedade através da gastronomia.
Em 2019, um ano antes de o Orana ter fechado portas na sequência da pandemia de covid-19, Zonfrillo tornara-se jurado do MasterChef ao lado de Melissa Leong e Andy Allen, substituindo o famoso trio original do programa na Austrália, Matt Preston, George Calombaris e Gary Mehigan. Em 2021, publicou a sua biografia, Last Shot, na qual relata muitos dos episódios mais marcantes da sua vida e fala abertamente dos problemas de saúde mental que enfrentou.
A desaparecida revista de gastronomia Fool fez, no seu número 5, em 2014, capa com Zonfrillo, acompanhando as suas viagens pela Austrália. O autor do texto, Zane Lovitt, descreve a sua energia agitada, a forma como os seus dois telefones não paravam nunca, e como ele constantemente respondia a todas as mensagens que recebia. Quando as suas mãos estavam desocupadas, eram “bolas de energia inquieta, frenéticas, sem nada para fazer”.
Nesse artigo, Zonfrillo explicava a sua visão da Austrália: “As pessoas esquecem-se que os indígenas estão aqui há 40 mil anos, e não apenas sobrevivendo, mas prosperando. Jovens fortes. Famílias fortes, vivendo felizes nesta terra milhares de anos antes de termos aqui chegado.” A chegada à Austrália, em 2000, coincidiu com o fim de uma dependência da heroína que se prolongou por sete anos. Quando Lovitt lhe perguntou se substituíra a droga por outra coisa, Zonfrillo responde: “Não, excepto, talvez, o trabalho.”
O texto termina com uma promessa: “Não vou levar esta viagem até um determinado ponto e dizer ‘aqui está a cozinha australiana’. Isso vai acontecer muito depois de eu ter partido. E a Fundação Orana é para isso, para garantir que acontece, quer eu esteja aqui ou não. Isto vai continuar muito depois de eu morrer.”