Santos Silva exclui Chega de visitas a parlamentos estrangeiros após protesto contra Lula
Decisão do presidente da Assembleia da República foi tomada após o protesto contra Lula da Silva protagonizado pelo Chega. André Ventura diz que “sanção” é “grau zero da democracia”.
O presidente da Assembleia da República informou, na manhã desta quarta-feira, o líder do Chega de que o partido iria ser excluído das delegações que o acompanham nas visitas oficiais ao estrangeiro, na sequência do protesto que a bancada fez contra o Presidente do Brasil na sessão desta terça-feira no Parlamento. Foi o próprio André Ventura que o anunciou aos jornalistas, uma informação só depois confirmada pelo gabinete de Augusto Santos Silva, indicando que a exclusão se aplicaria apenas a visitas a parlamentos estrangeiros.
A decisão terá sido transmitida por telefone a André Ventura e tem efeitos imediatos. Contactado pelo PÚBLICO, o gabinete de Augusto Santos Silva disse ter comunicado, na conferência de líderes, que "sempre que as suas deslocações em visita oficial a outros parlamentos incluam contactos com chefes de Estado, chefes de Governo ou ministros dos Negócios Estrangeiros, deixará de ser acompanhado por representantes de grupos parlamentares que, pela sua prática, tenham demonstrado não garantirem, a 100%, que respeitam essas altas entidades e, em geral, as obrigações de respeito e cortesia que há muito caracterizam e distinguem a acção externa de Portugal".
"Este critério aplica-se de imediato e significa a exclusão de qualquer representante do grupo parlamentar do Chega", acrescenta a nota, divulgada pouco tempo depois de a informação não ter sido dada durante o briefing oficial aos jornalistas da conferência de líderes desta manhã.
"É o grau zero na democracia. Esta atitude infantil e ditatorial não ajuda nada à democracia. Santos Silva não gostou do que aconteceu no 25 de Abril, nós também não", afirmou André Ventura, referindo-se à intervenção de Lula da Silva no plenário.
Questionado sobre qual o artigo do regimento que Santos Silva alegou para aplicar a decisão, André Ventura reconheceu não existir nenhum para sancionar deputados. "Como não há regras, não viajam comigo", disse como se estivesse a citar o presidente da Assembleia da República, e tendo referido até a hipótese de ameaças de "sanções penais a deputados".
O líder do Chega recordou que já houve "outros protestos contra chefes de Estado estrangeiros" e que a decisão de Santos Silva não "mete medo". Questionado sobre se considera que o protesto foi excessivo ao juntar a pateada a cartazes contra a corrupção – e que mereceu uma repreensão de Santos Silva –, Ventura disse que admitiu que "uma parte da sociedade civil" gostou, "outra parte, não".
O líder do Chega queixou-se de "todos os dias" lhe chamarem "fascista, criminoso" no Parlamento. "Isso viola a regras e nunca se viu aplicação de sanções a ninguém", disse, apelando ao PSD e à IL para assumirem se "vão alinhar nestas sanções".
Mas não foi um partido do seu espaço político que veio assumir uma posição sobre a matéria, antes o PS e para secundar a decisão de Santos Silva.
Houve uma "manifesta violação das regras de urbanidade e de cordialidade", considerou Pedro Delgado Alves, defendendo que a Assembleia da República tem de reflectir, não só sobre o incidente de terça-feira, mas também outros, como o protagonizado por Rita Matias e a vice-presidente da Assembleia, Edite Estrela, há duas semanas.
Era precisamente o debate sobre o comportamento do Chega que deveria ter sido feito na conferência de líderes desta quarta-feira de manhã, mas que foi adiado para a próxima reunião, daqui a duas semanas, segundo a porta-voz Maria de Luz Rosinha. A deputada foi questionada pelos jornalistas sobre as consequências que poderiam advir para o Chega por causa do protesto desta terça-feira, mas remeteu para o regimento da Assembleia e não referiu a comunicação feita por Santos Silva aos líderes das bancadas sobre a exclusão do Chega nas visitas oficiais.
Pedro Delgado Alves considerou que é o comportamento do Chega que "se auto-exclui [sic] de participar" em visitas oficiais, adiantando que a discussão se fará "olhando o regimento, o estatuto dos deputados e o código de conduta". O socialista referiu ainda a possibilidade de se fazer um levantamento sobre a matéria noutros parlamentos, uma vez que o regimento "está a ser revisto", e a de pedir que a Comissão da Transparência se pronuncie, mas rejeitou a possibilidade de se vir a rever o código de conduta.
"Não é a primeira vez que esta hostilidade e falta de respeito se acentuam", disse, referindo que "a vida parlamentar mudou no trato" e que tem havido "referências misóginas".