Governo de Israel autoriza guarda nacional pedida por ministro de extrema-direita

Força foi exigida pelo ministro Ben-Gvir como contrapartida pela suspensão da reforma judicial. “Vai ser um exército privado no melhor dos casos e uma milícia no pior”, diz antigo chefe da polícia.

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Itamar Ben-Gvir na reunião de Governo no domingo em que foi aprovada a nova guarda nacional RONEN ZVULUN/EPA

O Governo israelita autorizou a criação de uma nova força policial, uma guarda nacional, que críticos consideram poder vir a tornar-se “uma milícia” do ministro da Segurança Interna, Itamar Ben-Gvir, de extrema-direita, com os avisos a virem de dentro da própria polícia e de vários antigos responsáveis pelas forças policiais.

A sublinhar a sua importância, Ben-Gvir exigiu esta força em contrapartida pelo seu apoio a uma suspensão da reforma judicial, que era um dos pontos centrais do programa da sua força política. O primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, cedeu-lha, embora os seus contornos sejam ainda pouco claros.

A concessão desta força ao ministro, assim como o facto de a reforma ter sido apenas suspensa e não afastada, manteve as manifestações nas ruas. Este fim-de-semana, saíram de novo à rua multidões gigantes em protesto, estimando-se uma participação de 150 mil pessoas em Telavive – os manifestantes temem ainda que esta nova guarda nacional venha a ser usada contra si.

Na aprovação, no domingo, o Governo deixou em aberto a questão mais polémica: quem terá autoridade directa sobre esta força. A ideia de a estabelecer tinha sido do anterior Governo centrista, que incluía um partido árabe – visava lidar com violência interna como a que aconteceu em 2021, em cidades “mistas”, com percentagens significativas de cidadãos palestinianos de Israel, ou árabes israelitas.

Mas tendo Ben-Gvir a pasta da Segurança Interna, a força tornou-se problemática. O ministro, que mora num colonato na Cisjordânia, já foi condenado no passado por terrorismo e incitamento ao ódio contra árabes.

A tutela sobre a força será decidida por um painel composto por uma série de agências que irá analisar este assunto, entre outros, e fazer uma recomendação dentro de 90 dias.

Ben-Gvir disse que o objectivo da nova guarda nacional será lidar com o crime em comunidades árabes. “Vai lidar com isso exclusivamente. A polícia não lida exclusivamente com isso, está ocupada com mil e uma outras coisas”, disse à Rádio do Exército.

O político afirmou ainda que queria o controlo da força, porque esta tem sido negligenciada pela chefia da polícia. “Mas se forem sérios e realmente o quiserem [, poderia ceder esse controlo], disse.

A força iria começar com um contingente inicial de 1850 efectivos, que poderiam incluir ainda polícias na reserva e voluntários, segundo a agência Reuters.

“Porque é que o Estado de Israel – que tem um exército, polícia, secreta militar, o Shin Bet (espionagem interna), a Mossad (espionagem externa), conselho de segurança nacional, serviço de prisões, polícia antimotim, uma equipa SWAT precisa de mais uma guarda nacional?” escreveu no Twitter o deputado árabe Ayman Odeh.

A criação de uma nova força está a causar apreensão na própria polícia. O chefe da polícia, Yaakov Shabtai, declarou, citado pelo site Ynet, que, se a força não estiver sob comando directo da polícia, “isso poderá trazer custos, e até perigos, para a segurança dos cidadãos”.

Moshe Karadi, um antigo chefe da polícia, disse Times of Israel que Ben-Gvir podia usar esta força para um golpe contra o governo. Netanyahu “devia aprender um pouco de história e ver o que acontece em países em que os políticos têm as suas próprias forças armadas”, afirmou.

Karadi pôs uma hipótese de haver manifestantes a bloquear uma auto-estrada, e o comando distrital permitir, mas o ministro não gostar. E Ben-Gvir poderia então dar ordem e, nas palavras de Karadi, “mandar os seus ‘guardas da revolução’ para desimpedir a estrada”, afirmou o antigo chefe da polícia, usando o nome da força de elite do arqui-inimigo Irão.

Também David Tzur, antigo chefe da polícia do distrito de Telavive, disse que uma força a responder directamente a um político iria criar problemas. “Vai ser um exército privado no melhor dos casos e uma milícia no pior”, avisou, em declarações ao canal 12 da TV de Israel.

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