Que ilações pedagógicas tirar da crise na Igreja?
Precisamos de lideranças espirituais que façam sentido e que voltem a ser significativas nas nossas vidas.
Não me apetece escrever sobre os abusos sexuais na Igreja Católica. Afinal o que é que este assunto tem a ver com educação? Pois é, nada disto teria a ver com educação, se a Igreja não fosse detentora de muitas escolas, em sentido lato, diocesanas ou de congregações religiosas; e não fosse a catequese o ensino da vida de Cristo e a vivência da espiritualidade cristã.
Do meu ponto de vista, de professora, educadora e líder educativa, o foco será sempre no prevenir, mais do que no reparar. Mas as duas situações terão sempre lugar.
Sendo os abusos sexuais de crianças uma coisa hedionda, sem qualquer margem para dúvida, importa, nesta situação, ocuparmo-nos das vítimas e deixar os agressores para a justiça.
Tal como em dimensões como a democracia e a paz, a educação para a prevenção contra este tipo de violência deve ser feita também nas escolas. E lá estamos nós a pensar que tudo o que tem de se aprender, as tais ferramentas para a vida, para além das disciplinas do currículo, aprende-se nas escolas. Pois tem de ser, complementando a educação que se fará, ou não, em casa.
Os programas de sensibilização para estas temáticas são de extrema importância, ao mesmo tempo que se podem desenvolver pequenas formações e informações de como nos devemos prevenir destas situações.
É claro que nesta situação em concreto, os pais entregam os seus filhos a estas instituições como se estivessem em casa — embora saibamos que em casa também existem relatos de abusos —, mas o que quero dizer, é que os entregam com toda a confiança, sabendo que ficam o melhor possível e que nada de mal lhes vai acontecer.
A prevenção implica falar sobre os assuntos, esclarecer no concreto, ensinar a perceber os sinais e gestos imediatos de prevenção e defesa, e incentivar as crianças que devem contar o que se passou consigo ou com outros e, ensinar os adultos a ouvir e a agir.
Isto implica acabar com crenças relativamente a uma série de assuntos que estão enraizados em muitos de nós, tais como, ‘nada de mal te pode acontecer neste ou naquele sitio’, neste caso na igreja, ou ‘tens que acreditar e aceitar isto ou aquilo que aquela pessoa te diz ou faz, pois é para o teu bem’, entre muitas outras.
Ensinar a pensar e a agir rápido é uma das melhores formas de educar. Não é à toa que ter capacidade para julgar de acordo com critérios como a preservação da dignidade, é imprescindível numa educação que se quer integral. E aqui julgar, é ter espírito crítico, capacidade para fazer um juízo crítico segundo valores de bem ou de mal. E agir, é tomar uma decisão rápida, quase por impulso, ou mesmo por impulso. E falar é não ter medo. E ouvir e escutar é estar ao serviço, ensinar, proteger e alavancar, implica agir.
Não é fácil fazer tudo isto, mas é necessário. A pergunta “como é que correu o dia?” continua a fazer todo o sentido e quando não funciona há que fazê-la de outra maneira, com outras palavras, pegando noutros pormenores.
Só se confia, confiando, é certo. Convém perceber quais os sinais que nos permitem depositar a confiança e que não seja porque está neste sítio ou porque desempenha determinada função.
Não podemos também generalizar e estender esta desconfiança a todos os estabelecimentos de ensino de congregações religiosas e diocesanas e paróquias, porque muitos há onde tudo, na realidade corre bem, sobre este ponto de vista. E ainda bem.
Ainda podíamos reflectir sobre a formação integral dos candidatos a sacerdotes, o que está claramente a faltar há muitos anos, educação sexual neste contexto tão especial, e o que lhes é incutido em demasia, a presunção de uma autoridade e poder naturais.
Outra perspectiva de análise de tudo isto e que, no meu entender, salta à vista, é o que um líder não deve fazer. Aprende-se muito com os erros, é verdade, mas quando se podem evitar, não é preciso estatelarmo-nos ao comprido.
Aprendemos muito mais com os olhos do que com os ouvidos e os exemplos que damos têm consequências na tal confiança e construção de uma aliança e de inspiração para a vida.
A vida espiritual e o seu desenvolvimento fazem parte do desenvolvimento integral que tanto adultos, como jovens e crianças precisam. Estes avanços e recuos de não queremos comissão, afinal queremos, recebemos os resultados, mas não recebemos os resultados que importam, não podemos fazer nada, mas afinal alguns até fazem, revela uma falta de alinhamento com aquilo que são as directrizes da liderança de topo, e uma casa muito mal arrumada em que cada um faz o que entende não dando ouvidos ao seu líder interno.
Daqui aprendemos o que não fazer. Precisamos de lideranças espirituais que façam sentido e que voltem a ser significativas nas nossas vidas. Estes não têm sido bons tempos de exemplo de liderança inspiradora e humilde, na Igreja. Liderar em águas mansas é fácil, os verdadeiros líderes mostram-se em tempos de tempestade.
Haja confiança, mas antes de mais que se restaurem as razões para confiarmos.