Marcelo e os abusos: “A posição da Conferência Episcopal foi uma desilusão”

Incompreensível, tardia, alheia à responsabilidade… o Presidente arrasa a posição da Conferência Episcopal sobre os abusos sexuais cometidos por membros do clero.

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“A posição da Conferência Episcopal foi uma desilusão”, diz Marcelo

O "Marcelo católico" seria ainda mais duro do que o "Marcelo chefe de Estado" na avaliação que faz à reacção da Conferência Episcopal Portuguesa às denúncias da comissão independente, que estimou em perto de cinco mil as crianças vítimas de abuso dentro da Igreja desde 1950 até à actualidade. Para o Presidente, a credibilidade e a confiabilidade da Igreja estão em causa.

Os padres suspeitos de abusos sexuais, pelo menos aqueles que fazem parte da lista apurada pela comissão independente, deviam ser suspensos preventivamente?
Isso é óbvio. A posição da Conferência Episcopal foi uma desilusão. Ficou aquém em todos os pontos que eram importantes. Ficou aquém no tempo: demorou 20 dias a reagir numa coisa que era imediata. Depois comunicou que iria continuar a reflectir por mais dois meses. Ficou aquém ao não assumir a responsabilidade. Para mim, é o mais grave, pois se qualquer associação desportiva, cultural, qualquer instituição social, IPSS, Misericórdia responde pelos actos que são individuais e legais e criminais dos seus membros, como é que não responde a Igreja Católica por actos praticados por alguém, que, além de invocar o múnus da fé, é representante de uma Igreja, certificado, legitimado, mandatado para falar sobre uma sua missão pastoral? Como? É incompreensível!

Ficou aquém ou não tomar medidas preventivas relativamente àqueles que se encontram envolvidos na investigação criminal. Pois se há bispos que transferem priores por causa de questões de dinheiro, de guerras locais, de questões de comportamento... num caso de abuso sexual qual é a hesitação quanto a tomar a medida cautelar? Esteve aquém quanto à reparação. Como não entender? Não é que se diga que se pode reparar uma vida estragada. Há danos morais que se deitou abaixou tão elevados que se sabe mesmo nos tribunais em relação ao direito criminal aplicável que isso não consegue reconstituir aquilo que foi destruído. Mas compensa.

A Conferência Episcopal passou ao lado destes problemas todos e isso a mim, como Presidente da República, preocupa-me porque a Igreja é uma instituição fundamental na sociedade portuguesa, na educação, na saúde, na unidade social. Faz falta ao país. E se de repente sofre na sua confiabilidade, na sua credibilidade, numa questão tão básica, isso depois repercute-se na vida dos portugueses.

A Igreja falhou?
A Conferência Episcopal, porque a Igreja é o povo de Deus como um todo. A Conferência Episcopal. Não sei se os bispos todos, porque houve bispos que perceberam, mas quem falou em nome da Conferência Episcopal, a meu ver, foi uma desilusão. Nem falo como católico. Eu evito falar como católico.

Eu, como católico, seria mais contundente ainda porque é um problema de credo e de princípios. Mas como Presidente da República, a expectativa que havia era tão simples. Era ser rápido, assumir a responsabilidade, tomar medidas preventivas e aceitar a reparação. E de repente é tudo ao contrário em termos gerais, ou cada um para seu lado! Eu pergunto: mas não houve ali um minuto? Vinte dias de reflexão não chegaram?

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Daniel Rocha

Enfim, é tão importante o papel da Igreja que agora não há nada como uma reflexão complementar para reencontrar o caminho que se perdeu neste contexto.

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