Os organismos públicos não actuam e a solução alternativa na luta contra a depredação das zonas marinhas protegidas está expressa no modo original a que a Greenpeace tem recorrido para garantir a protecção contra a pesca de arrasto. A última acção da Greenpeace — erguer uma barreira na costa da Cornualha, no Reino Unido, para preservar uma área com cerca de 230 quilómetros quadrados — deu continuidade a uma fórmula que tem resultado na protecção “imediata e segura” de algumas áreas marinhas protegidas contra grandes arrastões.
As redes que venham, eventualmente, a ser lançadas ficarão enganchadas nas enormes pedras de granito que, com toneladas de peso, bloqueiam o seu movimento. Algumas das rochas incluem a “assinatura” de personalidades que apoiam a acção.
“Só nos últimos 18 meses, os barcos de pesca industrial passaram cerca de 19 mil horas a pescar na zona”, mas a quantidade de rochas já colocadas nas águas da costa da Cornualha transformaram uma zona protegida num território livre de pesca de arrasto, salienta a Greenpeace em comunicado.
Após a blindagem dos fundos marinhos e para garantir a protecção e segurança dessas áreas, é anotada e comunicada a localização exacta dos blocos colocados, para que os navios arrastões saibam onde está a nova barreira rochosa e, assim, se mantenham fora dos limites da pesca de arrasto de fundo.
Antes desta operação, equipas da Greenpeace já haviam instalado barreiras rochosas em outras áreas marinhas protegidas de Dogger Bank, em 2020, e na offshore de Brighton, em 2021, fechando várias partes dessas áreas à pesca de arrasto. Este método de pesca “arrasa o fundo do mar, destrói habitats e coloca em risco, a longo prazo, as populações de peixes, invertebrados e corais”.
O modo de actuação consiste no arrastamento de gigantescas redes lastradas pelo fundo marinho. Grandes placas metálicas e rodas de borracha presas a essas redes “esmagam praticamente tudo no seu caminho”, explica o comunicado da organização ambientalista. A pesca de arrasto também afecta as comunidades pesqueiras locais, cujos métodos de captura não podem competir com uma extracção intensa praticado pelos arrastões.
“Não queremos ser testemunhas silenciosas dos enormes danos ambientais causados por uma das formas mais violentas de pesca actualmente praticada”, assume a organização ambientalista, recordando, em comunicado, que a intervenção efectuada na costa da Cornualha “não será, infelizmente, a última”.
Com efeito, a indústria de pesca comercial, baseada no arrasto, conhece as vantagens em actuar nos bancos pesqueiros existentes em áreas protegidas e já estendeu as suas “insustentáveis práticas” de pesca às águas profundas e às montanhas submarinas anteriormente inexploradas.
“Todas as provas demonstram que as formas de vida de águas profundas são muito lentas na recuperação de tais danos, demorando de dezenas a centenas de anos a conseguir fazê-lo”, observa a Greenpeace, acrescentando que o tipo de intervenção baseado na colocação de barreiras rochosas é um último recurso: “Preferiríamos que os governos fizessem o seu trabalho para proteger nossos oceanos.” No entanto, a organização lembra o insucesso da apresentação de petições com centenas de milhares de assinaturas e das “inúmeras reuniões com o Governo britânico”. “Os nossos oceanos estão em crise e o Governo britânico está à deriva. É por isso que decidimos tomar medidas desta maneira”, justifica.
Em 2022, a Marine Management Organization, subordinada ao Departamento de Meio Ambiente, Alimentos e Assuntos Rurais do Reino Unido, iniciou um processo judicial contra a Greenpeace pela acção que levou a cabo em Brighton, mas o juiz considerou que o órgão governamental “deveria proteger os mares em vez de optar por perseguir quem justamente o faz”. A acusação foi retirada, com o Governo a aceitar a sugestão do tribunal: “Que os seus recursos seriam mais bem direccionados para assuntos onde o risco de danos ao meio ambiente pode ser maior”, recorda a organização ambientalista.
As acções da Greenpeace também resultaram numa outra frente. Neste sábado, 4 de Março, as Nações Unidas alcançaram acordo para o Tratado Global dos Oceanos após quase duas décadas de negociações. Mais de 5,5 milhões de pessoas assinaram uma petição da Greenpeace nesse sentido.
“É um tratado viável e um ponto de partida para proteger 30% dos oceanos do mundo até 2030”, realçam os ambientalistas, embora reconheçam que ainda existem lacunas no texto final. Mesmo assim, possibilita um caminho para os governos garantirem que o tratado seja implementado de forma “eficaz e equitativa”.
Até agora, as águas marinhas localizadas a mais de 200 milhas náuticas da costa e que são partilhadas por todos os países foram geridas sob uma série de acordos e organizações internacionais sem jurisdição clara, sem muita coordenação e com padrões inadequados de protecção. Fica assim eliminada a tomada de decisão baseada em consenso, “algo que falhou” na protecção dos oceanos através de órgãos como a Comissão do Oceano Antárctico.
Os países vão ter de adoptar e ratificar formalmente o tratado “o mais rapidamente possível” para que possam ser criados os “santuários marinhos de que o nosso planeta precisa para nos livrar de novas ameaças, como a mineração em alto mar”, conclui a Greenpeace.