A “infinita” Benetton leva uma vez mais a moda democrática à passerelle de Milão
O novo director criativo da marca italiana, Andrea Incontri, tem revisitado as pedras angulares da etiqueta, com referências mais arrojadas, mas sem perder a alegria da cor.
Pode parecer que a United Colors of Benetton é infinita por acompanhar, desde 1965, milhões de famílias em todo o mundo, provando que a moda (colorida) é para todos. Há menos de um ano a contar esta história, o director criativo Andrea Incontri recuou ao passado e quis retratar as diversas gerações que a etiqueta tem acompanhado. “Sinto-me responsável por fazer estas peças para todos os tempos”, contextualizou à imprensa, horas antes da primeira modelo pisar a passerelle, neste sábado, durante a Semana da Moda de Milão.
Raiava o sol na tipicamente cinzenta capital financeira de Itália, animada, por estes dias, pelo frenesim da moda. Durante uma semana, até dia 27, a indústria converge a Milão para ver o que reserva a próxima estação fria. Desfilam casas de luxo como a Gucci, Prada, Dolce&Gabbana ou a Moschino, mas sobra espaço também para dar palco à moda mais acessível, que leva a magia desta arte às massas.
Engane-se quem pense que, por ser uma marca mais acessível, a Benetton se desleixa na preparação do desfile. Na sala do espectáculo, no Museo della Permanente, as paredes estão forradas de espelhos, a conferir uma dimensão quase infinita ao espaço, espelhando e multiplicando a plateia, onde se sentam nomes sonantes da moda como a influencer Chiara Ferragni ou a editora da Vogue Japão, Anna Dello Russo.
André Incontri garante não criar a pensar em quem se senta na primeira fila do seu desfile, mas sim nas multidões que compram a Benetton há quase 60 anos. O italiano, a conduzir os destinos da marca de Treviso desde 2022, não faz “divisões entre classes” e defende os “produtos democráticos”, conseguidos através de uma produção industrial.
O designer não tem receio de destacar as vantagens de produzir em série, desde que se respeitem dois elementos, que considera “importantíssimos”: o material e a vestibilidade. Ou não fosse esta uma marca italiana ─ nação imortalizada pela qualidade da sua moda ─, a atenção está no detalhe e na qualidade da confecção, que se quer exímia, sobretudo nas malhas que popularizaram a etiqueta.
Para o próximo Outono/Inverno, na colecção Infinity, Incontri regressa às malhas, mas desconstruindo-as em novas variações e jacquards, combinando-as com alfaiataria, vinil e outras peças mais estruturadas. Há silhuetas que recuperam elementos do passado como as saias plissadas até ao joelho, as jaquetas em tweed ou os lenços acolchoados, colocados na cabeça como uma avó faria.
Nos padrões, impõe-se o bom humor do director criativo que parece querer fazer uma moda feliz. Os círculos perfeitos dão vida aos fatos de corte clássico, já os jacquards voltam a recuperar, à semelhança da última estação, elementos da natureza, como o coelho, o cogumelo ou a flor. A nível visual, as referências são trabalhadas para gerar ilusão de óptica e assemelharem-se a outros motivos, como mãos e bocas.
Destacam-se, ainda, os sobretudos de volume exagerado, muitos em imitação de pêlo. No que toca aos materiais, Andrea Incontri tem a preocupação de apostar ora nas fibras naturais como a lã, proveniente de “tosquia ecológica”, ora em alternativas sintéticas, como imitações de pele.
Passado vs. futuro
Ainda que pareça uma colorida viagem ao passado, “não queria mimetizar o design de outrora”, mas, sim, essa linguagem, juntando-lhe o conhecimento de hoje e “mais talento”, explicou aos jornalistas. O styling é, novamente, arrojado, quebrando com a imagem de uma marca familiar, que se vem afastando do rótulo de enfadonha e clássica. Incontri volta a levar a fluidez de género para a passerelle, vestindo homens e mulheres com qualquer peça, de qualquer cor.
Nesta proposta, não ambiciona vestir mães e filhas, como alguns sugeriram, nem um público específico, o que torna ainda “mais difícil” a tarefa. “Falo para amplificar a marca. É um projecto 360º que fala a diferentes gerações. É por isso que lhe chamo infinito. Não é para uma única mulher”, assevera Andrea Incontri, lembrando que a Benetton está presente em cinco continentes.
Em todo o mundo, passadas mais de cinco décadas, continua a ser impossível mencionar o legado da Benetton sem falar não só das suas icónicas campanhas de Oliviero Toscani, mas sobretudo da cor. “A cor significa sentimento, alegria e pertença. A cor dá vida aos sonhos”, elogia o criador. Mesmo sendo uma colecção de Inverno, nesta proposta domina o rosa, mas também o verde e o lilás, que Incontri trabalhou para serem mais agradáveis à vista e menos garridas.
As mesmas tonalidades dão vida aos acessórios, uma das fortes apostas da direcção criativa do italiano, que, antes de chegar à marca, tinha um projecto em nome próprio dedicado à marroquinaria. Além das carteiras de vários tamanhos e formatos, nota-se maior aposta no calçado, com plataformas exageradas estilo Versace em mocassins e botas. Por sua vez, a bijuteria esmaltada reproduz os motivos dos estampados.
Um desfile, analisa Andrea Incontri, é o expoente máximo da comunicação de uma marca e um momento importante para “passar algumas mensagens”, como a democratização da moda ou as questões de género. E define-se: “Sou o contador de histórias da marca.”
Depois de contar a sua história para a próxima estação, o director criativo vai voltar ao caminho que tem percorrido nos últimos meses. “Quero tratar das lojas, da comunicação entre os espaços arquitectónicos das lojas”, observa. Nessa viagem à volta do mundo, ambiciona compreender quais são as necessidades locais.
À medida que as vai descobrindo, vai trazendo-as também para a passerelle em Milão, mostrando que a moda é feliz, colorida e para todos. “Cresci com a Benetton e tenho muito carinho pelo projecto”, termina, com um brilho nos olhos.
O PÚBLICO viajou até Milão a convite da United Colors of Benetton.