Dívidas, contratos falsos e influência no Benfica: a teia de César Boaventura

Empresário acusado de dez crimes. Ministério Público diz que apresentava declarações bancárias fictícias para se fingir de milionário, alegando guardar milhões de Luís Filipe Vieira no estrangeiro.

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César Boaventura foi detido em Dezembro de 2021 FACEBOOK

Um falso contrato em que César Boaventura garantia deter os direitos de exploração de imagem do ex-jogador do Benfica Gedson Fernandes foi, para o Ministério Público (MP), a porta de abertura do mundo de futebol para o principal arguido da Operação Malapata. Ter-se-ão seguido extractos bancários fictícios, facturas falsas e vários empréstimos que ficaram por saldar – e declarar ao fisco.

O agente César Boaventura é acusado pela autoria de dez crimes (cinco de burla qualificada, três de falsificação de documentos, um de fraude fiscal qualificada e outro de branqueamento de capitais). Na acusação, a que o PÚBLICO teve acesso, o MP traça o alegado modus operandi de Boaventura, detalhado que o arguido apresentava extractos bancários falsos de contas com milhões de euros, de modo a ganhar a confiança de empresários para conseguir empréstimos. Com essas verbas, Boaventura financiava uma vida de luxo, que contrastava com a condição de insolvência, decretada a 31 de Outubro de 2014 pelo Tribunal de Vila Nova de Famalicão.

“Para além da notoriedade que procurava e publicitava nas redes sociais, César Boaventura, para conferir maior credibilidade à sua veste de empresário de futebol de sucesso, fabricou contratos de exploração de direitos de imagem, confissões de dívida e extractos bancários, documentos esses utilizados para convencer terceiros a entregarem-lhe as importâncias que o mesmo foi pedindo e que foram canalizados para fins distintos ao que anunciava”, diz o MP.

Além dos documentos forjados e símbolos de riqueza que ostentava nas redes sociais, Boaventura usaria para seu proveito pessoal uma alegada proximidade com Luís Filipe Vieira, ex-presidente do Benfica. Garantia a quem lhe emprestava dinheiro ter a capacidade de integrar jogadores nas camadas jovens das “águias” e influenciar transferências, garantindo retornos fáceis.

No caso de Joe Lima, empresário luso canadiano do ramo da construção civil, o agente prometeu ter liquidez para saldar a dívida, alegando que possuía uma conta onde guardava dinheiro de Vieira, acusa o MP. A investigação estima que o empresário da construção civil emprestou mais de 300 mil euros ao arguido, ficando sem “as poupanças de uma vida”.

“Já no ano de 2021, César Boaventura, como forma de garantir que iria pagar o que devia a Joe Lima, informou que tinha 30 milhões de euros no estrangeiro, mas que apenas 20% lhe pertenciam, já que o remanescente seria do presidente do Benfica.

César Boaventura assegurou que o anterior presidente do Benfica, sabendo da existência de processos-crime em investigação, lhe tinha pedido para colocar nessa conta 22 milhões de euros, não podendo, pois, movimentar a respectiva conta”, escreve o MP.

Luís Filipe Vieira foi detido em Julho de 2021, no âmbito da Operação Cartão Vermelho, renunciando à presidência do Benfica e sendo substituído por Rui Costa.

Além de Joe Lima, há ainda outros cinco ofendidos no processo contra César Boaventura. O MP diz que o esquema seguia sempre a mesma rota: Boaventura aliciava os empresários com documentos bancários falsos, recebendo destes vários empréstimos. Sempre que estes questionavam o agente pelo dinheiro em dívida, Boaventura arranjava um motivo para justificar o atraso.

1,2 milhões por declarar

César Boaventura acabaria por conseguir entrar com sucesso nos meandros do futebol, movendo-se pelos corredores de diversos clubes e chegaria a participar em transferências de jogadores. O agente é suspeito de ter recorrido à emissão de facturas falsas, com a Autoridade Tributária a estimar que não foram devidamente declarados rendimentos no valor de 1,2 milhões de euros. É ainda suspeito de ter recorrido a casas de apostas online numa tentativa de branquear estas verbas não declaradas.

São ainda arguidos no processo Ilda Barbosa, José Meia, Ramiro Viana e Paulo Romeu, acusados de terem auxiliado César Boaventura no alegado esquema de fuga ao fisco. O MP diz que as verbas destinadas ao agente eram encaminhadas para as contas dos alegados colaboradores, numa tentativa de mascarar a origem do dinheiro.

César Boaventura foi detido a 15 de Dezembro de 2015, no âmbito da Operação Malapata, que motivou buscas no Estádio da Luz e em Alvalade. O agente ficou em regime de prisão domiciliária com pulseira electrónica, medida de coacção que se mantém inalterada.

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