Secretária de Estado da Agricultura sai do Governo 25 horas depois
Um dia depois de ter tomado posse, Carla Alves pediu a demissão de secretária de Estado da Agricultura, um pedido que foi “prontamente aceite”.
Carla Alves demitiu-se à 25.ª hora – literalmente. Passadas 25 horas de ter tomado posse como secretária de Estado da Agricultura, Carla Alves pediu esta quinta-feira a demissão, pedido que foi "prontamente aceite", segundo refere uma nota enviada às redacções pelo gabinete de imprensa do Ministério da Agricultura e Alimentação.
"A secretária de Estado da Agricultura, Carla Alves, apresentou esta tarde a sua demissão por entender não dispor de condições políticas e pessoais para iniciar funções no cargo. A demissão foi prontamente aceite", pode ler-se na curta nota.
Este pedido surge minutos depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter aberto a porta à saída de Carla Alves, ao considerar que o caso noticiado pelo Correio da Manhã (CM) representava um "peso político".
O CM avançou esta quinta-feira que o Ministério Público (MP) tinha identificado uma discrepância entre os rendimentos declarados por Américo Pereira, antigo presidente da Câmara de Vinhais e marido da agora demissionária secretária de Estado da Agricultura, e o balanço das contas bancárias entre os anos de 2013 e 2020. A notícia dava ainda conta de que Polícia Judiciária (PJ) investigou suspeitas de crimes de corrupção activa e prevaricação num negócio de compra de terrenos naquela localidade. Em reacção à informação de que a investigação abrange as contas bancárias do casal, Américo Pereira rejeitou a existência de qualquer ilegalidade.
Durante o debate da moção de censura ao Governo apresentada pela Iniciativa Liberal, o primeiro-ministro António Costa defendeu a governante recém-empossada sublinhando, porém, que não deixaria de a demitir se Carla Alves tivesse efectivamente recebido dinheiro não declarado numa conta pessoal: "Se estiver ferida a ética republicana, a secretária de Estado é demitida."
Ainda no Parlamento, António Costa revelou ainda querer falar com o Presidente da República com vista a "estabelecer um circuito entre a minha proposta e a nomeação de membros do Governo que permita evitar desconhecer factos que não estamos em condições de conhecer e garantir maior transparência e confiança de todos no momento da nomeação".
Pouco depois, no Teatro São Luiz, em Lisboa, Marcelo Rebelo de Sousa reagiu tanto à notícia sobre Carla Alves como à intenção anunciada por António Costa. Sobre a primeira, o Presidente da República voltou a abrir a porta à demissão de um governante do executivo socialista ao defender que Carla Alves "tem uma limitação política" devido ao caso judicial que envolve o marido.
"Não é arguida, não é acusada (...) Não há, neste momento, com os factos conhecidos, nenhum caso de inconstitucionalidade ou ilegalidade", começou por avaliar, para acrescentar que "outra coisa é a questão política". "E no domínio da questão política naturalmente que a questão é a seguinte: alguém, em abstracto, que tem uma ligação familiar próxima com alguém que é acusado num processo de uma determinada natureza, qualquer que seja a natureza criminal, à partida tem uma limitação política, é um ónus político", afirmou citado pela agência Lusa.
Sobre se Carla Alves dispunha de condições para prosseguir no executivo, e para que não restassem dúvidas, Marcelo colocou o ónus na governante: "Esse é o juízo que as pessoas devem formular sobre si próprias." "Porque as pessoas devem, quando avançam para determinados lugares, fazer um auto-escrutínio. Dizer: eu não tenho nada que legalmente seja contra mim, agora, isto diminui a força política ou não diminui. Pode acontecer que a pessoa diga: não diminui. É um juízo. Se entende assim, avança. E depois o futuro dirá se diminuía ou não diminuía", prosseguiu o Presidente da República ainda em declarações citadas pela Lusa.
Já quanto à busca de um modelo de escrutínio reforçado prévio às nomeações de governantes, Marcelo Rebelo de Sousa atirou essa responsabilidade para o primeiro-ministro, considerando que o sistema político português não é presidencialista.
“A haver uma intervenção para apurar problemas de ilegalidades, impedimentos ou outros, tem que ser antes de o Governo apresentar a proposta”, declarou aos jornalistas, rematando com a distinção de papéis: "O Presidente não se pode substituir ao primeiro-ministro."