Livro
Um arquitecto ouviu as histórias que os sanatórios portugueses têm para contar
A investigação de José Avelãs Nunes é agora o livro A Arquitectura Branca: Os sanatórios para a tuberculose em Portugal, vencedor em 2022 do prémio “Lusitania” da Academia Portuguesa de História.
As relações entre medicina e arquitectura parecem tão óbvias que “quase não se estudam”, comenta José Avelãs Nunes, cuja tese de doutoramento olhou para a simbiose dos dois campos em edifícios de um passado próximo: os sanatórios.
“São arquitecturas muito específicas para o tratamento de uma doença que agora já não tem um tratamento através da arquitectura, dos seus espaços, mas que está ainda presente na memória dos nossos pais e avós”, conta o investigador.
A tese de doutoramento A arquitectura dos sanatórios para a tuberculose em Portugal: 1850-1970 valeu ao arquitecto (tentado pela história da Ciência) o prémio Victor de Sá de História Contemporânea, de 2018, atribuído pelo Conselho Cultural da Universidade do Minho a jovens investigadores. A investigação é agora o livro A Arquitectura Branca: Os sanatórios para a tuberculose em Portugal, vencedor em 2022 do prémio “Lusitania” da Academia Portuguesa de História.
Ao longo de mais de 100 anos, a “arquitectura branca”, como o investigador lhe chamou, respondeu “aos diferentes tipos de programas médicos e respondeu também a escolas de arquitectura que eram diferenciadas e que têm a ver com o seu tempo”.
“A arquitectura dos sanatórios não se explica só através da arquitectura, ou seja, não é como outros edifícios, como as habitações, por exemplo. Tem uma explicação que é a explicação da história da medicina e da ciência. O olhar através da abordagem da história da medicina com o da abordagem da história da arquitectura permite explicar porque é que os sanatórios eram pensados e desenhados daquela forma e não de outra qualquer”, explica José Avelãs Nunes.
Os primeiros projectos de sanatórios assemelhavam-se a hotéis com jardins, diz, porque o tratamento era “meramente estar ao ar livre”; depois a arquitectura adaptou-se a requisitos específicos, “quase programáticos, como o repouso que tinha horas específicas e o arejamento que existe uma configuração diferente”.
“Depois, há uma questão de imagem. À medida que vamos evoluindo no tempo, a imagem dos hospitais passa a ser uma imagem mais asséptica, mais fria, mais limpa e que tem a ver com a aproximação à máquina de curar que eram os hospitais”, resume.
Entre os 30 sanatórios que analisou, o Sanatório Sousa Martins, na Guarda, ganha a distinção de “mais fascinante” por ser uma “cidade dentro de uma cidade”. “Tinha o seu posto de telégrafos, tinha a rádio (a radio Altitude nasce dentro do sanatório) e depois tinha avenidas, chalés”, diz, sobre o antigo sanatório classificado como conjunto de interesse público, desde 2014.
Muitas destas estâncias, normalmente em locais altos próximos de natureza, onde o ar se julgava mais puro, estão ao abandono, apesar de serem “muito polivalentes”.
Sem acesso ao arquivo da Assistência Nacional aos Tuberculosos, que o arquitecto diz ser inexistente, José Avelãs Nunes teve de procurar em vários repositórios as imagens nesta fotogaleria (e muitas outras) para recontar não só o que se passava entre paredes mas também o que “nos contam os sanatórios, através das suas paredes”.