Kevin McCarthy falha eleição para líder da Câmara dos Representantes

Republicanos ultraconservadores revoltaram-se contra o candidato do seu partido e impediram uma eleição rápida, o que não acontecia há 100 anos.

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Kevin McCarthy (ao centro) prometeu não desistir de tentar ser eleito EPA/SHAWN THEW

Pela primeira vez nos últimos 100 anos, nenhum candidato a presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos foi eleito na primeira ronda de votações. Nesta terça-feira, no dia marcado para a tomada de posse dos congressistas que foram eleitos em Novembro, um grupo de republicanos ultraconservadores revoltou-se contra o candidato do seu partido, Kevin McCarthy, e negou-lhe uma eleição rápida como speaker. Ao fim de uma terceira votação sem vencedor, o processo foi suspenso e será retomado na tarde de quarta-feira.

Numa bancada republicana com 222 congressistas, McCarthy recebeu apenas 203 votos na primeira ronda de votações — menos 15 do que os 218 necessários para garantir a eleição. Dezanove republicanos de uma ala ultraconservadora não votaram em McCarthy e deram os seus votos a outros actuais e antigos congressistas republicanos.

Num dia em que as atenções estavam viradas para o Congresso, e que deveria servir para transmitir uma imagem de união, a oposição interna a McCarthy é um forte indicador de que a ala mais à direita do Partido Republicano — onde se incluem muitos congressistas seguidores do estilo político de Donald Trump — está decidida a aumentar a sua influência no órgão legislativo.

Segundo o republicano Chip Roy — um dos opositores de McCarthy —, o seu grupo só irá apoiar uma de duas soluções: ou um candidato republicano que aceite transferir grande parte das decisões dos líderes partidários para os congressistas; ou alguém que se identifique com uma postura de maior confronto com o Partido Democrata.

Três votações

O candidato do Partido Democrata, Hakeem Jeffries, acabou por receber mais votos do que McCarthy (212) na primeira ronda, já que contou com os votos de todos os seus colegas de bancada. Mas esse facto não o deixa mais perto de vir a ser eleito speaker — com o Partido Republicano em maioria, Jeffries não tem hipótese de ir buscar votos à oposição.

Numa segunda tentativa, os 19 republicanos que não votaram em McCarthy na primeira ronda uniram-se à volta de um outro congressista ultraconservador, Jim Jordan — que, por sinal, é um apoiante de McCarthy. E a terceira ronda foi ainda pior para o principal pretendente ao cargo de speaker: 20 republicanos (mais um dos que nas duas primeiras rondas) votaram em Jordan e frustraram, mais uma vez, as pretensões de McCarthy.

Perante a recusa de McCarthy em renunciar à sua candidatura, os congressistas foram chamados a votar até que um candidato receba os votos mínimos necessários, num processo que foi suspenso após a terceira votação, por volta das 22h15 desta terça-feira, e que será retomado às 17h de quarta-feira (12h em Washington D.C.)

O próximo speaker vai suceder a Nancy Pelosi, do Partido Democrata, e não tem de ser um congressista em exercício; segundo a Constituição dos EUA, qualquer cidadão com mais de 25 anos pode ser eleito — o que levou alguns republicanos, no último ano, a sugerirem a eleição de Donald Trump.

É a primeira vez nos últimos 100 anos que um partido maioritário não consegue eleger o seu candidato a líder da Câmara dos Representantes na ronda inicial de votações. Em 1923, o republicano Frederick Gillett foi eleito após nove rondas.

O recorde foi estabelecido em 1856, numa altura em que o Congresso ainda não tinha entrado na sua actual fase de domínio bipartidário. Nesse ano, Nathaniel Banks foi eleito após 133 rondas, num processo que começou em Dezembro de 1855 e que ficou concluído em Fevereiro de 1856.

Sem acordo

O fracasso de McCarthy começou a ganhar forma após as eleições de Novembro para as duas câmaras do Congresso: a Câmara dos Representantes, que tem uma maioria republicana a partir desta terça-feira; e o Senado, onde o Partido Democrata manteve a maioria que vinha de 2020.

Apesar de os republicanos terem triunfado nas eleições para a Câmara dos Representantes, a dimensão dessa vitória ficou muito aquém daquilo que se esperava, e as desavenças antigas entre McCarthy e os ultraconservadores vieram ao de cima nas negociações para a escolha do próximo speaker.

Em 2015, a ala radical forçou a renúncia do republicano John Boehner da liderança da Câmara dos Representantes, acusando-o de fazer cedências ao Partido Democrata; e nas eleições que se seguiram para se encontrar o substituto de Boehner, a mesma ala apoiou Paul Ryan em detrimento de McCarthy — também ele acusado de não estar suficientemente à direita no partido.

Desta vez, os revoltosos fizeram uma série de exigências a McCarthy, com destaque para a reintrodução de uma regra que permitiria a um único congressista apresentar uma moção de censura contra o líder da Câmara dos Representantes.

Temendo que isso o deixasse refém dos ultraconservadores, McCarthy aceitou que uma moção de censura possa ser apresentada por cinco congressistas, o que não foi suficiente para a facção mais à direita.

A eleição de um speaker é a primeira tarefa na ordem de trabalhos dos congressistas no início de uma nova sessão da Câmara dos Representantes. Enquanto o órgão legislativo não tiver um novo líder em funções, os congressistas não podem tomar posse e nenhum outro trabalho pode ser adiantado.

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