Militar dos Países Baixos é o novo director da Frontex
Hans Leijtens foi responsável dos serviços fiscais neerlandeses quando estes levaram a cabo práticas discriminatórias.
Hans Leijtens, comandante de um ramo das forças militares dos Países Baixos, foi nomeado na terça-feira director-executivo da Frontex, a maior agência europeia que tem como missão o controlo de fronteiras na União Europeia, e que é acusada de encobrir acções ilegais de Estados-membros como pushbacks – empurrar embarcações para fora das águas territoriais da União Europeia, em vez de os socorrer como exige a lei internacional.
A acusação levou à demissão do antigo director-executivo Fabrice Leggeri, e a lituana Aija Kalnaja, que ocupava o cargo desde Julho, foi entretanto referida numa investigação do organismo europeu anti-fraude (Olaf, a instituição que fez as primeiras investigações que levaram à saída de Leggeri) e afastar-se-á para dar lugar a Leijtens. O responsável militar dos Países Baixos, que chefia actualmente a Royal Netherlands Marechaussee, foi escolhido também por representar o país no conselho da agência Frontex, diz a revista alemã Der Spiegel, “conhecendo assim bem a agência – e os seus problemas”.
Na corrida ao lugar esteve ainda o antigo ministro da Administração Interna Eduardo Cabrita, que foi entretanto excluído da lista de finalistas.
Pouco depois da nomeação de Leijtens, o jornalista freelancer Felix Sassmannshausen lembrava, no Twitter, que Leijtens foi nomeado responsável da agência tributária da Holanda em 2015 (em 2017 saiu, prematuramente, do cargo, em desacordo com a tutela). Entre 2013 e 2019, a agência protagonizou um caso de “profiling em massa” que levou a acusações de fraude fiscal, sem base, a milhares de famílias nesse período.
Leijtens esteve na agência pouco mais de um ano, e por isso não é fácil dizer exactamente do que tinha conhecimento. Felix Sassmannshausen diz, no entanto, que, em 2016, Leijtens recebeu informação sobre queixas de práticas de discriminação na agência, mas não passou essas queixas ao Governo.
O fisco da Holanda usava um programa chamado System Risk Indication, criado para analisar grandes quantidades de dados de vários organismos públicos para identificar pessoas que tivessem mais probabilidade de cometer fraude fiscal.
Na sequência da utilização do programa, a autoridade tributária acusou mais de 26 mil famílias de fraude fiscal, por terem recebido abono de família indevidamente. A acção do fisco deixou muitas famílias na miséria – embora as acusações não fossem verdadeiras. Muitas das famílias eram migrantes ou tinham apelidos estrangeiros.
Um inquérito parlamentar concluiu, em 2021, que os “princípios fundamentais do Estado de direito foram violados” e, na sequência dessa conclusão, o Governo de Mark Rutte demitiu-se. Nas eleições antecipadas que se seguiram, Rutte foi reeleito.
No ano anterior, uma coligação de associações da sociedade civil venceu um processo contra o Estado neerlandês pelo uso do programa de “profiling em massa”, dizendo que este não respeita a legislação europeia de direitos humanos.
Mas, diz o grupo de jornalismo colaborativo Lighthouse Reports, que se dedica a questões de imigração e direitos de refugiados (e que com a revista alemã Der Spiegel e o jornal francês Le Monde publicaram partes de uma investigação da Olaf que mostrava encobrimento de crimes pela Frontex), algumas cidades dos Países Baixos usarão ainda programas semelhantes, centrando os seus esforços de encontrar fraudes em bairros onde moram pessoas com rendimentos baixos.
Depois de uma admissão oficial de “racismo institucional” por parte do Executivo dos Países Baixos, diz o grupo de jornalistas, “a maior parte do Governo foi reeleito e continuou a tentativa de cortar e poupar nos serviços sociais, e mantém-se questões sobre se tecnologias potencialmente danosas continuam a ser utilizadas”.