Tomás, 11 anos, precisava de 350.000€ para curar leucemia. Conseguiu em 4 dias

O caso podia estar resolvido com a ajuda de uma irmã. Mas a doença voltou e o transplante, agendado para a última quinta-feira, foi cancelado. A cura pode estar, agora, em Telavive.

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O Tomás nasceu a 11 de Novembro de 2011 DR/Facebook Tomás Lamas

Estava tudo bem encaminhado: depois de muitas pesquisas, descobriu-se um hospital, em Israel, que fazia o tratamento de que Tomás precisava para entrar em remissão e, entre a família mais directa, foi encontrada uma pessoa 100% compatível, uma irmã.

Tomás, que a família trata por Batazu, regressou de Telavive a 25 de Outubro e seguiu para “o IPO para começar o processo de transplante”, recorda o pai, Tomás Lamas, em conversa com o PÚBLICO. Também regressou a tempo de celebrar os 11 anos com os irmãos. Mariana, de 9, Carlota, de 7, e Francisco, de 3. Só tinha de aguardar pelo dia do transplante de medula, marcado para quase um mês depois, 24 de Novembro.

Mas, uma semana antes, quando fez o mielograma, chegaram as piores notícias: a doença tinha voltado e o transplante foi “cancelado indefinidamente”, com indicação para passar o Tomás para a paliação, ou seja, limitar a terapêutica a apenas diminuir a dor. Um cenário difícil de aceitar, explica o pai, tendo em conta que o menino está “com força, a crescer, mais gordinho”.

Depois do choque, o pai passou ao plano B, aquele que “já tinha montado na cabeça”. Problema: ao contrário da primeira vez que foi a Israel, com recomendação médica e o apoio do hospital, tendo a terapêutica sido comparticipada, desta vez estaria por sua conta.

Tomás Lamas, que é médico intensivista nos Cuidados Intensivos do Hospital Egas Moniz e no Cuf Tejo, ambos em Lisboa, decidiu, então, lançar um apelo nas redes sociais para conseguir ultrapassar o único obstáculo entre o filho e a cura: 350 mil euros.

Quatro dias depois, a família voltou a publicar nas redes sociais, para informar o sucesso da campanha: o dinheiro já foi amealhado.

Difícil de assimilar

Tomás Lamas, que confessa ser hoje especialista da doença do seu filho, conta que nem sempre foi assim. No início, quando lhe foi diagnosticada uma leucemia mielóide aguda, o pai recorda o choque.

O pequeno Tomás tinha-se queixado de dores de ouvido e apresentava uma febrícula, o que levou os pais a pensarem que seria uma otite. Visitado o otorrino, estava tudo normal. Seguiu-se uma ida ao dentista, sem qualquer resultado. “Uma segunda de manhã, foi para a escola e a professora liga a dizer que ele tinha um alto na cara. A mãe foi lá buscá-lo e seguiu para Hospital de Santa Maria [em Lisboa]. Assim que veio o resultado do hemograma percebeu-se. Foi o primeiro embate.”

Sendo médico, Tomás Lamas admite que talvez seja pior, já que “não há paninhos quentes”; sabe-se exactamente do que se está a falar. “É um processo difícil de assimilar”, assume. “Confesso que durante esse período não consegui ler nenhum artigo ou ir para Internet ver o que é que era a doença, como é que se tratava. Confiei na equipa médica como qualquer outro pai. Pensei: ‘Tenho de ser pai, deixar os médicos fazerem o trabalho deles e dedicar-me àquilo que posso fazer que é mantê-lo feliz.’”. Mesmo implicando quebrar algumas regras: “Comprámos uma Nintendo e, depois, arranjámos um telemóvel já velhinho, mas que ajudou a que os internamentos passassem melhor.”

Tomás fez a quimioterapia e, não obstante as complicações, a doença entrou em remissão, com a família confiante de que o caso se viria a incluir na fatia de 60% de sucesso. Mas, ao fim de alguns meses, num exame de rotina, “acabámos por ter a má notícia de que a doença tinha voltado”.

Voltaram, assim, à quimioterapia, mas com a possibilidade de transplante em cima da mesa. “Fizemos os testes dentro da família toda e a nossa filha Mariana, que é número 2, com 9 anos, é 100% compatível com o Tomás.” A notícia era excelente, até porque uma compatibilidade destas é “raríssima”. Mas, entre a quimioterapia e o transplante, o Tomás teve outra recaída. “Fomo-nos muito abaixo.”

Accionar o plano B

Quando o transplante foi adiado, Tomás Lamas despiu o papel de apenas pai e vestiu a bata. “Nessa altura, fechei-me no escritório durante uma semana a fazer contactos com o mundo inteiro. E foi aí que comecei a encontrar informações sobre as CAR T Cells.”

Tomás Lamas compreendeu que a solução para o filho poderia passar por este tratamento. No entanto, a investigação não existe em todo o lado, há centros que fazem tratamentos para uns marcadores e não para outros e os ensaios clínicos com crianças escasseiam.

Até que, através de contacto familiar, chegou à fala com um hospital em Israel (Sheba Hospital). “Foi como encontrar a agulha no palheiro”, recorda. É que “a mutação que o Tomás tem apresenta uma característica muito específica, que é a expressão aberrante do CD 19, e o Centro de Israel estava a fazer um estudo clínico exactamente com CAR T Cells CD 19”.

O pedido foi feito à direcção do serviço, que o submeteu à direcção clínica para o remeter à Direcção-Geral da Saúde, onde a comissão técnica aprovou a ida do Tomás para o hospital de Israel para fazer o tratamento que seria seguido de transplante em Portugal.

No entanto, com o regresso da doença, o transplante tornou-se uma impossibilidade. E, para voltar à equação, entretanto excluída pelo IPO, é necessário voltar a fazer CAR T Cells, desta feita com o marcador CLL-1.

Apesar do desânimo do cancelamento do transplante, o médico não se esquece que o primeiro tratamento “foi fundamental para conseguir o que temos agora: um Tomás forte”.

As condições físicas do menino tornam-no, assim, um candidato ideal para regressar a um tratamento que, quando voltar a pôr a doença em remissão, abrirá a porta a um transplante, em Israel, sendo que, desta vez, a família não vai deixar passar tanto tempo entre a análise negativa da doença e o procedimento. “Obviamente que a doença é muito agressiva. Sabemos bem que o prognóstico é mau. Sabemos que as chances de sobrevivência são baixas”, desabafa o pai.

No entanto, “como intensivista”, Tomás Lamas sabe reconhecer quando um doente tem o que se chama de uma reserva fisiológica baixa, ou seja, quando não tem condições para aguentar tratamentos muito agressivos. “Não é o caso do Tomás. Não podia continuar sem procurar um tratamento para o nosso filho.”

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