E o melhor tinto da Beira Interior é... um monovarietal de Rufete

A Quinta dos Termos venceu o concurso do Beira Interior — Vinhos & Sabores na categoria de Melhor Tinto. O vinho valoriza uma casta minoritária mas histórica. O melhor branco é dos Vinhos Aforista.

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João, Lurdes e Pedro Carvalho, as duas gerações que gerem actualmente a Quinta dos Termos. José Sérgio

O Quinta dos Termos Talhão da Serra Rufete Beira Interior Reserva 2019 foi eleito Melhor Tinto no concurso “Escolha da Imprensa” na 7.ª edição do evento Beira Interior — Vinhos & Sabores. Foram entregues, este sábado, quatro Grandes Prémios, em quatro categorias. Este, o de melhor vinho tinto, acaba por premiar não só a referência submetida a concurso, feita pelo reputado enólogo e académico Virgílio Loureiro, mas também a aposta que João Carvalho, o produtor, fez em castas minoritárias (variedades sem campo de multiplicação), como o Rufete mas também a branca Fonte Cal, há mais de 20 anos.

O Aforista Beira Interior Colheita Seleccionada 2019, dos irmãos Daniel e José Cavaleiro e com enologia de José Ribeiro Brandão, venceu o Grande Prémio na categoria de Vinhos Brancos. Nos Espumantes, o primeiro prémio foi atribuído ao Exilado Bruto Natural Beira Interior Grande Reserva 2015, da Vinumnostrum. E nos Rosados ficou em primeiro lugar o Pinhel Terras da Beira 2021, da Adega Cooperativa de Pinhel.

Num total de cerca de 90 hectares de vinha, na Quinta dos Termos (Belmonte) e na Herdade do Lousial (Castelo Branco), João Carvalho, o primeiro presidenteda Comissão Vitivinícola Regional e um visionário na Beira Interior, tem 15 hectares de Rufete plantados. Explica o seu filho, Pedro Carvalho, hoje com responsabilidades na empresa familiar, que o pai, “quando pegou na quinta, no início da década de 1990, quis apostar nas castas autóctones e identificou [então] a Fonte Cal, a Síria, o Rufete, o Mourisco, a Jaen e a Trincadeira”. Plantou essas vinhas com o apoio do viticólogo Francisco Santos. E plantar não foi, neste caso, só plantar.

“Não havia viveiristas a trabalhar” essas castas, porque “não havia procura por elas”, explica Pedro Carvalho. Em parceria com o ministério da Agricultura, recuperou-se a Fonte Cal — para a qual já há uma vinha mãe certificada no Inverno de 2021/22, que faz com que seja possível outros produtores encontrarem hoje nos viveiristas plantas certificadas —, modelo que a Quinta dos Termos está hoje a repetir com a casta branca Callum e a tinta Rufete (ambas variedades minoritárias).

“Apesar de haver algumas plantações de Rufete na região, também não existe material vegetal certificado. Portanto, o nosso objectivo com o Rufete também era fazer uma selecção clonal, para que se possa seleccionar os melhores clones, para que possa ser apetecível para o viticultor plantar Rufete, para que dê produção todos os anos e uvas de qualidade”, concretizou, em conversa com o Terroir.

Já o branco dos Vinhos Aforista é um lote de Arinto — que o enólogo usa “como tempero” —, Fernão Pires, Malvasia Fina e Viosinho. Curiosamente, um branco onde não está a Síria, uma das castas emblemáticas da Beira Interior e que este produtor também trabalha. Nos tintos, e nos 12 hectares de vinha dos irmãos Cavaleiro, reina o trio Touriga Franca, Touriga Nacional e Tinta Roriz, que a maioria conhecerá do Douro, região que faz fronteira com a Beira Interior. Mas José Ribeiro Brandão, que conta “17 vindimas” ao lado de Daniel e José, afiança que a Touriga Franca, onde vai “buscar frescura”, “é uma das castas de futuro na região”, assim como “outras que estão nas vinhas velhas”, como “o Rufete [lá está!], o Mourisco [tinto], o Rabigato, o Gouveio, a Folha de Figueira, o Castelão e a Baga”. Sim, a Baga: diz o enólogo com “escola feita no Dão e no Centro de Estudos de Nelas” que a Baga é “uma casta 4X4 [todo-o-terreno], que está muito bem adaptada à região”.

O enólogo José Ribeiro Brandão e o produtor Daniel Cavaleiro, dos Vinhos Aforista. José Sérgio
Uma das imagens que forram as garrafas dos Vinhos Aforista, que ainda antes da pandemia promoveram um concurso nas escolas de Pinhel e têm hoje dez rótulos assim, especiais e únicos. José Sérgio
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O enólogo José Ribeiro Brandão e o produtor Daniel Cavaleiro, dos Vinhos Aforista. José Sérgio

Se há quem esteja “a arrancar castas internacionais para plantar variedades autóctones”, como o Rufete ou a Fonte Cal, como conta Pedro Carvalho, é com tristeza que se percebe que muitos viticultores abandonaram e continuam a abandonar esses tesouros. Como é o caso de muitos dos 1200 cooperantes que fornecem uva à Adega Cooperativa de Pinhel, que já foi a segunda maior adega cooperativa em Portugal e hoje ocupa o quinto lugar na mesma lista.

Numa área de influência que rondará os 4000 hectares de vinha, os viticultores estão a reconverter vinhas de Rufete e Mourisco tinto para Alicante Bouchet e Tinta Roriz, variedades mais produtivas e que dão vinhos com mais cor. Num contexto que produz volume (na Adega Cooperativa de Pinhel são processadas 15 milhões de quilos de uvas por ano), percebe-se, mas não se entende. E é pena que ainda haja quem não entende que o caminho é o da tipicidade.

Nas categorias de Melhor Tinto e Melhor Branco, para além do Grande Prémio, foram distinguidos outros 18 vinhos (dez tintos e oito brancos). Nos tintos, levaram prémios (ex aequo) para casa estas referências: Raya Regional Terras da Beira 2017 (Horta de Gonçalpares - Raya Wine), Marquês d'Almeida Beira Interior Reserva 2018 (CARM), Entre Serras Beira Interior 2018 (Vinumnostrum), Quinta do Cardo Biológico Beira Interior Reserva 2019 (Agrocardo), Pinhel Celebração 250 anos Premium Beira Interior 2018 (Adega Cooperativa de Pinhel), Entrevinhas Beira Interior Grande Reserva 2018 (Sociedade Agropecuária Baraças Irmãos Unidos), Adega do Fundão Private Selection Beira Interior 2018 (Adega Cooperativa do Fundão), Quinta da Biaia Beira Interior Biológico Reserva 2018 (Quinta da Biaia), Quinta das Senhoras Dona Carolina Beira Interior Grande Reserva 2015 (Quinta das Senhoras) e Beyra Beira Interior Garrafeira 2017 (Rui Reboredo Madeira).

Nos brancos, foram distinguidos ex aequo os vinhos Beira Serra Beira Interior Reserva 2017 (Beira Serra Vinhos), Quinta do Cardo Biológico Superior Beira Interior 2021 (Agrocardo), Quinta dos Currais Beira Interior Colheita Selecionada 2020 (Quinta dos Currais), Adega do Fundão Private Selection Beira Interior 2019 (Adega Cooperativa do Fundão), Bal da Madre Biológico Beira Interior 2020 (Miss Vitis), Adega 23 Terras da Beira 2020 (Adega 23), 7 Capelas Beira Interior 2018 (Sociedade Agropecuária Baraças Irmãos Unidos) e Convento de Marialva Beira Interior Colheita Seleccionada 2020 (Caves Terras de Mêda).

O concurso foi promovido pela Comissão Vitivinícola Regional da Beira Interior (CVRBI), e organizado pela revista Grandes Escolhas, e o júri, composto por jornalistas especializados e outros provadores, avaliou 74 vinhos. Ao promover estes prémios, a CVRBI quis, nas palavras do seu presidente, Rodolfo Queirós, imprimir outra “visibilidade e notoriedade aos vinhos da região”. O evento Beira Interior — Vinhos & Sabores decorre no Centro Logístico de Pinhel e termina este domingo ao final da tarde.

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