EUA lançam na COP27 plano de compensação de emissões mas já há muitas críticas

Organizações ambientalistas criticam iniciativa norte-americana que pretende envolver empresas no financiamento de energias renováveis nos países em desenvolvimento.

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John Kerry assegurou que os créditos de carbono utilizados seriam “de alta qualidade e teriam salvaguardas reforçadas EPA/KHALED ELFIQI

John Kerry, o enviado especial do Presidente norte-americano Joe Biden para as alterações climáticas, revelou nesta quarta-feira na Conferência do Clima, em Sharm el-Sheikh, no Egipto, um plano que pretende fazer com que grandes empresas injectem dinheiro na economia de países em desenvolvimento para acelerar a sua transição para as energias renováveis.

O plano assenta num mecanismo de compensação das emissões de dióxido de carbono, o principal gás com efeito de estufa, das empresas – um mercado de carbono. “A nossa intenção é usar o carbono para mobilizar capital que faça acelerar a transição de formas poluentes de produção de energia para renováveis. Que permita encerrar centrais eléctricas a carvão e tornar mais rápida a expansão das tecnologias de energias renováveis”, afirmou John Kerry, citado pela Reuters.

O programa foi desenvolvido numa colaboração do Governo dos Estados Unidos com o Bezos Earth Fund (do milionário Jeff Bezos, proprietário da Amazon) e a Fundação Rockefeller. Kerry disse que o Banco da América, a Microsoft, a PepsiCo e o Standard Chartered Bank expressaram interesse em “ajudar a modelar” o desenvolvimento deste programa, denominado Acelerador da Transição Energética. Prevê-se que dure até 2030, com uma possível extensão até 2035.

O enviado para o clima dos Estados Unidos reconheceu que as críticas a esquemas de compensação das emissões de carbono são generalizadas entre os grupos ambientalistas. Estas preocupações foram partilhadas por uma task force criada pelo secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, que recomendou já na COP27 que os créditos de carbono sejam usados com moderação pelas empresas e pelos Governos, para que não acabem por boicotar os planos para atingir a neutralidade carbónica.

A estratégia baseia-se em atrair empresas que assumiram compromissos climáticos a comprarem compensações de carbono, ou seja, créditos para as suas emissões de dióxido de carbono, explica o New York Times. O dinheiro assim obtido seria canalizado para ajudar os países em desenvolvimento a acelerar a transição para energias renováveis. Em troca, as empresas receberiam créditos para as emissões que prometeram reduzir.

Uma manobra de distracção?

Mas há muitas críticas de grupos ambientalistas e think tanks da área dos recursos naturais, mesmo nos Estados Unidos.

“Este programa vai exacerbar o problema que pretende resolver, porque não vai reduzir as emissões de gases com efeito de estufa”, disse ao jornal The Guardian Rachel Rose Jackson, directora da organização não-governamental Corporate Accountability. “E vai distrair-nos da necessidade real e urgente de os Estados Unidos pagarem a sua dívida climática através do financiamento público”, declarou.

“O financiamento do sector público deve ser separado do que os países devem avançar ao abrigo da Convenção-Quadro nas Nações Unidas para as Alterações Climáticas”, disse ao mesmo jornal Mohamed Adow, director do think tank Power Shift Africa. “O que precisamos é de regras robustas que regulem o corte de emissões e um sistema de financiamento para o clima que force os países ricos a dar aquilo que prometem, e não a ir desencantar dinheiro do sector privado”, declarou.

John Kerry garantiu que António Guterres apoia esta iniciativa dos EUA baseada num mercado de carbono desse que existam salvaguardas, diz a Reuters. A fiabilidade destes mercados tem sido afectada por casos como os de empresas que encerram centrais a carvão num local, recebem créditos de carbono por isso, mas abrem uma central semelhante noutro local, nota o New York Times.

O enviado especial para o clima dos EUA prometeu que os créditos de carbono utilizados seriam “de alta qualidade” e teriam salvaguardas reforçadas e que países como o Chile a Nigéria estão entre os primeiros que mostraram interesse no programa, relata a Reuters.