Estudantes continuam ocupações pelo clima e já somam pequenas vitórias

Estudantes do Técnico conseguiram que conselho de escola analise a reabertura do plano estratégico do IST para incluir objectivos de neutralidade carbónica.

Foto
Manifestações sucendem-se nas escolas para apelar pela neutralidade carbónica Guillermo Vidal

Os dias de ocupação das escolas e faculdades têm passado cheios de actividades: palestras, distribuição de panfletos, almoço e jantar gratuito para todos (em alguns casos, com refeições vegan), abordagem dos colegas nos espaços comuns, interrupção das aulas para comunicar que o planeta está em risco e a chamar outros para se lhes juntarem, plenários para decidir os próximos passos de cada ocupação. Até agora, os alunos do movimento Fim ao Fóssil: Ocupa! têm juntado mais multidões nas escolas secundárias do que nas faculdades, mas há outras vitórias a registar.

No Instituto Superior Técnico (IST), por exemplo, os alunos conseguiram reunir com o presidente da instituição, Rogério Colaço, e já conquistaram a primeira garantia: a reunião desta quarta-feira do conselho de escola terá como ponto da ordem de trabalhos a decisão sobre uma eventual reabertura da discussão sobre o Plano Estratégico do IST, no sentido de incluir metas ambientais, como a eficiência energética e a neutralidade carbónica.

Estas recomendações, dizem os alunos, já tinham sido feitas pelo projecto Técnico Sustentável – Ambiente Sociedade Economia, delineado por professores e investigadores, mas ficaram de fora dos compromissos institucionais plasmados no plano estratégico do IST.

Apesar do reconhecimento de que “estas são questões importantes”, o presidente do IST não deixou garantias sobre compromissos nesta área, o que deixa os estudantes descontentes. “Não sabemos quantas destas propostas vão ser realmente aceites”, diz Ana Caeiro, uma das porta-vozes da Ocupa do Técnico. “Sabemos que não podemos ficar contentes com estas promessas um bocadinho ocas”, admite ao PÚBLICO, espelhando o sentimento dos colegas nas reuniões que vão fazendo ao longo dos dias.

No IST, como em outras ocupações, os alunos dividem-se entre as abordagens: aumentar o nível de “disrupção”, perturbando de facto o funcionamento das faculdades, ou obedecer às regras e manter os espaços ocupados durante mais tempo? Apostar nas reivindicações nacionais (exigir um compromisso do Governo de acabar com os combustíveis fósseis até 2030 e a demissão do ministro da Economia e do Mar, António Costa e Silva) ou nas questões específicas da faculdade – “entrar dentro da burocracia” , em que têm margem para negociar?

Na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da Universidade Nova de Lisboa, as negociações dos “ocupas” com a direcção também têm resultados que não satisfazem os estudantes. Uma das reivindicações do grupo é “o fim dos laços da Nova FCSH com o banco Santander, que investe em combustíveis fósseis”, mas a resposta de Luís Baptista, presidente da faculdade, foi que essa parceria permite a atribuição de bolsas de estudos a alguns estudantes.

A estudante Raquel Alcobia, uma das organizadoras da ocupação, identifica uma oportunidade de pôr em prática os princípios de justiça climática em contexto de transição: para não deixar os alunos bolseiros desprotegidos, a faculdade poderia optar ou por pressionar o patrocinador, ou por começar desde já a procurar outros parceiros que permitam financiar as bolsas.

Pouca imprensa, muito entusiasmo

Na Escola Artística António Arroio, onde dezenas de alunos têm dormido no hall de entrada e continuam reunidos, o segundo dia de greve amanheceu sem televisões à porta, um pormenor que não escapou a Gil Oliveira, um dos alunos organizadores da ocupação.

Aqui, os estudantes têm ocupado sob o olhar atento da direcção da escola, a supervisão das auxiliares “um pouco divididas” sobre como lidar com a situação e a boa recepção dos seguranças da escola, que parecem apreciar a companhia dos alunos durante os turnos nocturnos. “Uma das seguranças diz que até gostava de nos ter com ela lá até domingo”, comenta o aluno.

Na tarde desta quarta-feira, haverá uma reunião entre os porta-vozes do movimento e os directores da António Arroio e da Escola Secundária Luís de Camões, outra escola de Lisboa onde dezenas de alunos estão acampados pelo clima.

Os professores também têm posições diversas, desde os que “barricaram alunos dentro da sala” aos que adiam a matéria planeada para levar os estudantes para a ocupação. “Inclusive temos uma parte do 12.º ano que são as FCT, as formações em contexto de trabalho, em que se tivermos duas faltas chumbamos, e tivemos professores a adiar o início dos estágios”, conta Gil Oliveira, aluno do 12.º ano de Ourivesaria.

Os dias passam entre actividades desde a pintura de faixas até conversas sobre as questões que inquietam os alunos. Depois das refeições e ao longo dos dias, “quem suja limpa”; na altura de dormir, os colchões que os estudantes foram autorizados a buscar ao ginásio não são suficientes para tantos “ocupas”, mas os estudantes mostraram “espírito de entreajuda”. “Acho que está dentro do espírito arroiano o pessoal todo ser solidário uns com os outros”, completa o estudante.

Já houve também formações sobre desobediência civil, a que assistiram dezenas de estudantes (a que durou três horas teve “cerca de 90 alunos”), que explicam quais são os direitos dos alunos nestas situações e a postura recomendada de desobediência pacífica, sem recurso à violência. [Apesar da colaboração da direcção da escola até agora,] não sabemos até onde vai a paciência”, observa Gil. “Assim que acabar estamos preparados para isso, tendo em conta a formação que tivemos, que nos ensinou como resistir” caso sejam obrigados a sair.