Alemanha anuncia “a legalização de cannabis mais liberal da Europa”
Ministro da Saúde alemão garantiu que o país terá “o mercado mais regulado” e que a tónica será na segurança. Proposta será apresentada a Bruxelas para verificar conformidade com legislação da UE.
O ministro da Saúde da Alemanha, Karl Lauterbach, anunciou que há um acordo no Governo para o plano de legalização que elaborou – e que quando for aprovado fará da Alemanha um dos países com legislação mais progressista no que toca à produção e consumo de cannabis, mesmo que para fins recreativos.
Segundo o plano, a compra e posse de um máximo de entre 20 a 30 gramas de cannabis para consumo pessoal, mesmo que recreativo, será legal. Numa conferência de imprensa em Berlim, Lauterbach congratulou-se com o facto de a Alemanha vir a ter assim “a legalização de cannabis mais liberal da Europa”, mas garantiu que o país terá “o mercado mais regulado”, com a distribuição controlada e a tónica na segurança. Deverá ainda ser permitido o autocultivo, provavelmente de até três plantas por adulto.
A legalização e regulação do mercado da marijuana fez parte da campanha eleitoral dos Verdes e do Partido Liberal Democrata, que foram também os dois partidos que mais votos conseguiram entre os jovens, e foi depois integrada no acordo de coligação entre os dois partidos e o Partido Social Democrata, do chanceler, Olaf Scholz, a que pertence também o ministro da Saúde, como uma das políticas de um Executivo apostado em mudar a Alemanha depois de 16 anos de governos liderados pela conservadora Angela Merkel.
Lauterbach adiantou que cerca de 4 milhões de pessoas consumiram cannabis no ano passado na Alemanha, das quais 25% têm entre 18 e 24 anos.
O Governo não irá impor um limite geral à quantidade de THC na cannabis produzida e vendida (quanto maior, mais potente é a substância) mas considera fazê-lo para venda para pessoas entre os 18 e 21 anos. A venda deverá ser feita em lojas licenciadas, que não podem ser locais onde se venda também álcool ou tabaco. Está a ser também considerada a possibilidade da venda em farmácias.
Segundo previsões feitas durante o processo de consulta para o plano, os benefícios económicos de ter um mercado regulado para o consumo doméstico, que se estima que possa ser de 400 toneladas por ano, o país arrecadaria mais 4,7 mil milhões de euros através de impostos e ainda na poupança de não levar a tribunal pessoas por uso recreativo ocasional, e seriam ainda criados 27 mil novos postos de trabalho, segundo um estudo do Düsseldorf Institute for Competition Economics (DICE).
A proposta do Governo propõe ainda que investigações e casos a correr na justiça com base em acusações que deixem de ser ilegais sejam também arquivadas sem acusação ou condenação. <_o3a_p>
A cannabis será sujeita ao IVA e ainda a um imposto especial sobre o consumo, cuja percentagem ainda não foi definida. A Alemanha não está a imitar o modelo dos Países Baixos, disse Lauterbach, sublinhando que este não tem um mercado regulado. Muitos outros países europeus tinham já legalizado o uso de cannabis para objectivos medicinais (a própria Alemanha fê-lo em 2017), enquanto outros descriminalizaram o consumo, mas não o legalizaram.
O primeiro país a legalizar o consumo e regular (e taxar) o mercado de marijuana foi o Uruguai, em 2013, seguido do Canadá, em 2018, e Malta em 2021.
A emissora Deutsche Welle nota ainda que o plano vai ser analisado pela Comissão Europeia para verificar a sua conformidade com a legislação da União Europeia, e o ministro acrescentou que só depois dessa verificação será apresentada a proposta de lei final. Lauterbach disse esperar que a proposta de lei possa levada ao Parlamento alemão no próximo ano.
Com uma aprovação na Alemanha prevê-se um efeito dominó noutros países da Europa. A legalização na Alemanha, a maior economia europeia, iria dar um forte impulso a um mercado em expansão na Europa, que se espera que traga receitas de mais de 3 mil milhões de euros em 2025, mais do que os 400 milhões deste ano, segundo o European Cannabis Report, da empresa de consultoria Prohibition Partners, citado pela agência Reuters.
O ministro alemão culpou a legislação actual por um mercado negro crescente, e um consumo problemático em termos de adição, mas nem sempre a legalização e regulação resolvem o recurso ao mercado ilegal. No Uruguai, um relatório do Instituto para a Regulação e Controlo da Cannabis de 2020 apontava para o reduzido número de farmácias em que era possível comprar cannabis (na altura, apenas 17) e a produção para consumo próprio e ainda dos clubes colectivos de produção não era suficiente para a procura. Em Malta pôs-se também o mesmo problema com a oferta, não havendo suficientes “clubes de cultivo” para responder à procura.