Federer ganhou praticamente tudo o que havia para ganhar, tem 20 títulos de Grand Slam e deve ter perdido a conta aos dias que passou como n.º 1 do ranking ATP. Mas o mais impressionante será sempre recordar como conseguiu ser mais - muito mais - que os números ou os recordes.
Cada entrada num court foi um desfile de um talento natural e inigualável, de uma classe e graciosidade desarmantes em cada pancada na bola e no relacionamento que manteve com adversários, árbitros e público. Federer nasceu para jogar ténis e o ténis só pode ter sido inventado para que um dia alguém como Federer pudesse pegar numa raquete como quem pega numa batuta ou num pincel. Num desporto individual e personalista, mostrou como não precisava que o holofote estivesse sempre focado em si, com a grandeza de quem sabe que não precisa que os rivais estejam apagados para que ele próprio pudesse brilhar.
A dividir palco com Nadal, alimentou uma das rivalidades mais apaixonantes do desporto e foi precisamente ao lado do maior rival tornado amigo que encenou o último acto. Ombro a ombro, proporcionaram, sem precisarem de uma única palavra, a melhor representação do que foi e é Federer. Quando se é grande ao ponto de o maior antagonista que teve do lado oposto da rede estar lavado em lágrimas, junto a si, no momento da despedida, não há mais nada que precise de ser dito.
Comecei a admirar Federer pelo que o via fazer em court, mas, mesmo sem ter o privilégio de o conhecer, depressa se percebe que a sua elegância e elevação transcendem em larga medida os serviços, amorties e esquerdas a uma mão com que nos foi brindando. Vê-lo despedir-se em apoteose, feliz mas de olhos regados, a dedicar um agradecimento especial à mulher Mirka, foi um dos momentos mais emotivos a que assisti num evento desportivo. Serve de consolação saber que, pendurada a raquete, há-de continuar a saber inspirar quem o acompanha e fazer bem aos outros como sempre fez.
No fim, resta agradecer por nos ter definido a grandeza, por ter sido um modelo a seguir em todos os aspectos da sua vida e por ter refundado o ténis diante dos nossos olhos. Querendo ser apenas mais um, nunca será apenas mais um.
Obrigado por tudo, foi perfeito.