Macron reabre dossier do sistema de pensões e sindicatos medem força na rua
Presidente francês quer aumentar a idade da reforma para os 65 anos e o seu ministro do Trabalho diz que está disposto a dissolver a Assembleia Nacional caso a oposição apresente uma moção de censura.
Três das maiores organizações sindicais francesas e algumas uniões estudantis convocaram para esta quinta-feira uma greve geral e mais de 200 manifestações em toda a França para exigir aumentos salariais e contestar o plano apresentado pelo Governo para aumentar o poder de compra, que estas estruturas consideram insuficiente face à elevada inflação.
A meio da tarde, a greve estava a ter forte impacto nas ligações ferroviárias e no funcionamento das centrais nucleares e das escolas, sectores em que a adesão dos trabalhadores foi expressiva.
O protesto foi convocado originalmente durante o Verão, mas foi-lhe acrescentada uma nova reivindicação nas últimas horas porque o Governo anunciou que quer aprovar uma reforma das pensões ainda este ano ou no início de 2023. A nova legislação tem como principais medidas o aumento da idade legal da reforma dos 62 para os 65 anos e a fixação de uma pensão mínima de 1100 euros.
Com palavras de ordem como “aumentem os salários, não a idade da reforma”, os manifestantes saíram às ruas de Marselha, Montpellier, Paris, Lille, Bordéus, Estrasburgo e Toulouse, entre outras cidades. “Precisávamos de um primeiro dia que permitisse a todos os que lutam pelos salários encontrarem-se e agir juntos”, disse o secretário-geral da Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT) ao L’Humanité.
Para a CGT, a Federação Sindical Unitária (FSU) e a União Sindical Solidários, movimentos ligados à esquerda, a greve é um “ponto de partida” para testar o actual ambiente social francês. A outra grande central sindical, a Confederação Francesa Democrática do Trabalho (CFDT), decidiu não aderir, mas o seu secretário-geral, Laurent Berger, prometeu “uma oposição frontal” à reforma das pensões se o Governo não a negociar com os sindicatos.
Em várias sondagens prévias às eleições legislativas de Junho, a maioria dos inquiridos colocava o “poder de compra” como principal preocupação. O executivo liderado por Élisabeth Borne decidiu há duas semanas limitar a subida dos preços do gás e da electricidade a 15% e entregar cheques-energia a uma parte da população, dependendo dos seus recursos. Em Agosto, tinha já sido aprovada uma lei que aumentava as pensões em 4% e os apoios sociais a idosos e a pessoas com deficiência.
Os sindicatos que esta quinta se manifestam consideram as medidas insuficientes. A CGT defende o aumento do salário mínimo para 2000 euros (é de 1329, actualmente), uma semana de trabalho de 32 horas e a reforma aos 60 anos.
Ameaça de dissolução
A intenção de subir a idade da reforma para os 65 anos foi lançada por Emmanuel Macron ainda durante o seu primeiro mandato, mas acabou por ficar na gaveta com o advento da pandemia de covid-19 e porque se gerou, entre o fim de 2019 e o início de 2020, um movimento de contestação liderado pelas centrais sindicais que esta quinta organizaram a greve, que levou centenas de milhares de pessoas às ruas. Uma sondagem publicada a meio deste mês revela que 55% dos inquiridos estão contra o relançamento desta reforma.
Esta quarta-feira, segundo a imprensa francesa, o Presidente reuniu no Eliseu os seus ministros e aliados mais próximos para decidir que metodologia adoptar para fazer passar a lei. “Há aqui apenas uma pessoa que correu riscos e apresentou este assunto aos eleitores: sou eu”, terá dito Macron aos convivas.
Élisabeth Borne explicou à AFP esta quinta-feira que a intenção do Governo é que haja “um aumento progressivo da idade da reforma de quatro meses por ano”, a começar em Janeiro de 2024 e “atingindo os 65 anos em 2031”. Também está previsto, ainda que não especificado como, criar uma excepção para os trabalhadores com empregos mais duros do ponto de vista físico e psicológico.
A intenção de Macron é discutir a lei antes do fim do ano, para que esta seja votada na Assembleia Nacional no princípio de 2023 e entre em vigor em meados do ano. No entanto, com uma maioria relativa, o partido presidencial está dependente dos votos da oposição e os dois maiores partidos – União Nacional e A França Insubmissa – já disseram ser contra o projecto de lei.
Existe um artigo na Constituição francesa, o 49.3, que permite ao Governo aprovar legislação sem uma votação na Assembleia Nacional. Se recorresse a ele, seguir-se-ia muito provavelmente uma moção de censura.
Em entrevista à televisão LCI, o ministro do Trabalho admitiu que Macron pode dissolver a Assembleia caso isso aconteça. “Se todas as oposições se coligarem para aprovar uma moção de censura e fazer cair o Governo, ele daria a palavra aos franceses e os franceses decidiriam e diriam qual é a nova maioria que querem”, disse Olivier Dussopt.