Vamos definir um dia exacto para o regresso às aulas?

Desconhecendo a data precisa do regresso às aulas, os pais têm de resolver em cima da hora como vão conciliar a vida profissional com a familiar. Viver no país do “indo e vendo” é tão desgastante como pouco eficiente.

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Só dia 19 de Setembro muitos alunos do ensino público verdadeiramente regressam às aulas Nuno Ferreira Santos

Só esta segunda-feira, dia 19 de Setembro, muitos alunos do ensino público verdadeiramente regressaram às aulas — apesar de o Despacho n.º 8356/2022 determinar que as “atividades educativas e letivas” (sic) deveriam iniciar entre os dias 13 e 16 de Setembro. Isto acontece porque várias escolas recorrem à solução criativa de marcar uma “apresentação” ou “reunião” no último dia do intervalo determinado pelo Ministério da Educação, empurrando o verdadeiro arranque do ano lectivo para a semana seguinte.

Esta interpretação alternativa do despacho ministerial é apenas uma das situações indesejáveis que deveriam levar a tutela a definir um dia exacto para o regresso às aulas — mesmo que esse dia variasse conforme os níveis de ensino, por forma a permitir um regresso faseado. Mas é urgente determinar um dia específico que permita as famílias (e à comunidade pedagógica) terem alguma previsibilidade.

No artigo de opinião “O estranho caso do início do ano letivo que não é”, Susana Peralta examina as questões suscitadas por este calendário flexível e mostra como outros países seguem caminhos mais profícuos. O texto cobre o essencial do que há a dizer sobre o assunto. Permito-me acrescentar algumas notas acerta do impacte deste intervalo na vida das famílias atípicas.

Um dos efeitos nefastos do intervalo proposto pelo Ministério é a impossibilidade de definir estrategicamente as férias. Este planeamento, relevante para qualquer família, constitui algo vital para pais e mães de crianças com deficiência. Se soubermos de antemão que as aulas do educando começam dia 19 de Setembro, então organizamo-nos para não trabalhar nas semanas em que há pouca oferta de campos de férias inclusivos. (Já escrevi aqui sobre o drama de encontrar actividades de tempos livres durante o período estival.) Se só somos informados na segunda semana de Setembro, resta-nos fazer uma gestão de crise. Não é preciso ser vidente para adivinhar que este cenário recorrente traz uma ansiedade desnecessária para a vida familiar, além de limitar a empregabilidade e o rendimento dos cuidadores.

A previsibilidade é um aspecto-chave de eventos importantes. É por isso que agendamos casamentos, consultas, audiências e concertos com antecedência. Precisamente porque se trata de algo relevante, inserimos aquela data específica no nosso calendário, privilegiamos aquele espaço no mapa mensal em detrimento de outras solicitações.

Imaginem receber um convite que indica a realização de uma cerimónia entre os dias 13 e 16 de Setembro. Como organizar a nossa vida se não sabemos para que datas específicas devemos reservar viagem e hotel? Sendo o arranque do ano lectivo um dos eventos mais importantes na vida de um aluno (e, por extensão, da das suas famílias), é legítimo que este evento mereça, na nossa moldura sociocultural, o mesmo tratamento que outros compromissos. Sem planeamento e organização, uma família atípica sucumbe.

No caso específico das crianças autistas, a previsibilidade é também uma questão de bem-estar. Alunos no espectro tendem a beneficiar de alguma antecipação para suavizar a mudança de rotinas. Definir uma data exacta para regressar à escola seria, portanto, uma atitude respeitosa para com esta comunidade vulnerável.

Desconhecendo a data exacta, os encarregados de educação têm de ir indo e vendo”, deixando para resolver em cima da hora como vão conciliar a vida profissional com a familiar nos últimos dias de férias escolares. Essa forma de estar “indo e vendo”, tão desgastante como pouco eficiente, acaba por ter um efeito em cascata em vários sectores da sociedade onde actuam pais com crianças matriculadas no ensino público. Se este modelo baseado num intervalo não serve a sociedade nem as famílias que dela fazem parte, porque insistimos em não definir uma data específica para o regresso às aulas?

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