A marmelada das freiras de Odivelas recebe a bênção da União Europeia: Indicação Geográfica Protegida
A Marmelada Branca de Odivelas já tem IGP. São mais de 700 anos de história e muita doçura neste doce criado pelas freiras bernardas da Ordem de Cister do Convento de S. Dinis. Uma “tradição histórica transmitida de geração em geração”.
“A marmelada branca é confeccionada em vários lugares do país, com origem em tradições muitíssimo antigas, relacionadas com a preservação de frutos. No Mosteiro de Odivelas, desde há séculos, é feita uma marmelada branca que ficou famosa. As freiras deste mosteiro eram exímias doceiras e talvez tivessem outros atributos que ajudam a explicar a fama do doce. No séc. XIX, há notícia de que se juntavam no exterior do mosteiro poetas e cantores em busca de receber um olhar e um cubinho de marmelada, lançado da janela, por parte das freiras, que assim premiavam os talentos que mais lhes agradavam. É caso para dizer que assim se fazia marmelada.”
E é caso para dizer que assim se destacava e celebrava na Fugas, através do trabalho da especialista da história da doçaria em Portugal, Cristina Castro do projecto No Ponto, a Marmelada Branca de Odivelas, que esta segunda-feira viu a sua candidatura a Indicação Geográfica Protegida (IGP) aprovada pela Comissão Europeia.
“É um doce obtido exclusivamente da cozedura do mesocarpo do marmelo com açúcar branco, água e sumo de limão. O mesocarpo de marmelo é de cor amarela a amarela clara, podendo ter tonalidades esverdeadas. É utilizado açúcar branco para permitir obter esta marmelada, de cor próxima do branco. O sumo de limão é utilizado para evitar a oxidação da polpa do marmelo, após o descasque”, especifica o Jornal Oficial da União Europeia, onde se destaca que “todas as fases de transformação da Marmelada Branca de Odivelas têm lugar no interior da área delimitada, no concelho de Odivelas, distrito de Lisboa”.
Na receita exclusiva local estabelecem-se ainda outros parâmetros, como que “quantidades de polpa e ou polme utilizadas no fabrico de 1 000 g de produto acabado não poderão ser inferiores a 350 g de marmelos”. Ou que “para a preparação da calda de açúcar coloca-se ao lume a quantidade certa de água e açúcar, na proporção média de 1 quilo de açúcar para 2,5 dl de água”.
“Homogénea, próxima do branco”, de brilho “uniforme e intenso”, com uma consistência “sólida, que lhe permite ser cortada com faca” e o natural aroma “a marmelo”, a marmelada cuja confecção histórica se remete às monjas bernardas da Ordem de Cister do Mosteiro de São Dinis de Odivelas, tem como resumo de resultado no palato o óbvio: “sabor: doce”.
Os métodos tradicionais e o modo conventual de produção passam a ter na embalagem o selo IGP. Sublinha-se no documento da CE que as suas características “devem-se exclusivamente à sua reputação e aos factores humanos”.
A especificidade deste doce, “tradição histórica transmitida de geração em geração”, “resulta do saber fazer secular dos produtores de Odivelas que se dedicam a esta actividade”. O que inclui os “tachos e formas datados de há mais de 100 anos, que continuam a ser a base dos moldes de alguns formatos”.
Entre os muitos destaques, um precioso: o segredo da “determinação do ponto de açúcar óptimo designado como «ponto alto de açúcar» ou «bola forte rija», o qual é atingido quando, deitando uma pinga em água, esta coalhe, e que é determinado empiricamente pelos produtores locais, revelam a importância acrescida dos factores humanos”.
A humaníssima vida da Marmelada Branca de Odivelas já tinha sido atestada de várias formas, mas quem melhor do que Maria de Lourdes Modesto para assinar por baixo o louvor maior à divina criação?: “A melhor marmelada de todas é a que ainda se faz em Odivelas. Só é digna desse nome sagrado a que apresentar a cor mais próxima do branco puro, uma delícia”.
Este “legado secular” vale assim a Portugal mais um produto na lista europeia de IGP: na União Europeia são “1592 géneros alimentícios já protegidos, 154 dos quais são portugueses”, assinala-se em boletim informativo da CE. O doce de Odivelas junta-se a recentes entradas na lista como o Maranho da Sertã ou o Alho da Graciosa. Outros produtos portugueses buscam o mesmo destino, casos do Pão Alentejano e também do azeite da região.
Na rotulagem passarão a ser obrigatórios a menção “Marmelada Branca de Odivelas IGP" e o logótipo oficial. O caderno de especificações pode ser consultado aqui (.pdf).