Morreu Peter Straub, mestre da literatura de terror, colaborador de Stephen King

Celebrado por Julia ou por Ghost Story, ambos adaptados ao cinema, e pelas colaborações com Stephen King em The Talisman e Black House, Straub teve uma longa e muito premiada carreira. A morte chegou este domingo, aos 79 anos.

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Stephen King destacou que Straub trouxe "uma sensibilidade de poeta" à literatura de terror twitter peter straub

“Na América não gostamos realmente da escuridão, mas existe uma imensidão a aprender ali, e todos passamos por ela nas nossas vidas.” Peter Straub disse-o em 2009, um ano depois de ter sido distinguido como “lenda vida” pela International Horror Guild, mais de três décadas depois do momento decisivo da sua carreira, a publicação de Julia, que foi o seu terceiro romance, mas que seria, na verdade, o marco do início oficial. Foi com Julia, afinal, que Straub abordou pela primeira vez o terror e o sobrenatural. E foi com eles, mergulhando na escuridão, que construiu a sua muito respeitada e premiada carreira, marcada pelas colaborações com Stephen King, com quem assinou The Talisman (1984) e Black House (2001).

Straub morreu num hospital em Manhattan, onde estava internado com uma fractura na anca, este domingo, aos 79 anos, anunciou esta quarta-feira a sua filha Emma, romancista, numa publicação no Instagram: “Peter Francis Straub, a pessoa mais inteligente e mais divertida em qualquer sala em que alguma vez tenha estado, 3/2/43 – 9/4/22. Quão afortunados fomos. Não há palavras suficientes no mundo”.

Stephen King, que manifestara em 2016 a intenção de voltar a colaborar com Straub numa terceira investida no universo The Talisman (Black House fora sequela do livro de 1984), o que nunca chegou a concretizar-se, tecera-lhe grandes elogios no passado, destacando a forma como “trouxe uma sensibilidade de poeta a esta área, criando uma síntese de terror e beleza” – as primeiras incursões literárias de Straub deram-se, precisamente, pela poesia, com a publicação de três livros no início dos anos 1970, período em que o encontrávamos na Universidade de Dublin para um doutoramento que nunca chegou a terminar.

No momento da morte do velho camarada de escrita, Stephen King escreveu no Twitter: “É um dia triste porque morreu Peter Straub, meu bom amigo e colega e colaborador incrivelmente talentoso. Trabalhar com ele foi uma das maiores alegrias da minha vida criativa”. Neil Gaiman, o escritor e autor de BD britânico, popularizado pela novela gráfica The Sandman, recentemente adaptada a série televisiva, também o recordou no Twitter: “Um dos melhores escritores que já li, um dos melhores amigos que conheci. Sempre gentil, engraçado, irascível, brilhante”, escreveu.

"E se tentasses um romance gótico?”

Nascido em 1943 em Milwaukee, no Wisconsin, escapou aos desejos dos pais – o pai ambicionava vê-lo como atleta profissional, a mãe imaginava-o pastor luterano —, formando-se em Literatura Inglesa na Universidade do Wisconsin, completando posteriormente, com distinção, um mestrado na Universidade de Columbia. Depois de três anos a trabalhar enquanto professor na escola que frequentara na adolescência, viajou até Dublin. O objectivo era um doutoramento mas, no seu íntimo, carregava o desejo de iniciar ali uma carreira literária.

Primeiro, a poesia, depois, dois romances, Marriages e Under Venus. Este último, escrito em 1974, conheceria publicação apenas dez anos depois. Originalmente recusado pelos seus editores, levaria o agente de Straub a fazer-lhe uma sugestão que se revelaria providencial: “E se tentasses um romance gótico?”. O resultado foi Julia, publicado em 1975 e adaptado ao cinema dois anos depois (The Haunting of Julia”, com Mia Farrow como protagonista).

Julia tornou-o um nome conhecido, Ghost Story, em 1979, transformou-o numa estrela — e seria também adaptado ao cinema, num filme homónimo realizado por John Irvin e com Fred Astaire, Melvyn Douglas, Douglas Fairbanks Jr. e Alice Krige como alguns dos protagonistas. A NPR recorda em obituário uma crítica publicada no seu site em 2009 por Benjamin Percy. “Peter Straub é um Henry James da era moderna, mas com dentes mais afiados e uma longa língua preta. Escreve literatura de terror em que as frases são compostas de forma elegante, as personagens totalmente credíveis e as circunstâncias ameaçadoras”.

Nomeado para o World Fantasy Award em 1981, por Shadowland (prémio que venceria três anos depois com The Talisman e que voltaria a vencer com Koko, de 1988, publicado em Portugal em dois volumes pela Clássica Editora, em 1991), e vencedor do August Derleth Award por Floating Dragon (1983), Peter Straub teria uma carreira recheada de distinções, onde se destacam as cinco vezes que foi distinguido com o Bram Stoker Award (um dos livros premiados, No Quarto da Noite, de 2004, foi publicado em Portugal em 2008, pela Dom Quixote).

Os últimos livros que assinou foram a colecção de contos Interior Darkness (2016) e a novela The Process (is a Process All its Own) (2017).

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