Presidente do Supremo alerta novos juízes contra tentativas de subjugação ao poder político
Henrique Araújo alertou os novos magistrados para o “escrutínio sem paralelo” a que vão estar sujeitos, recomendando-lhes “um comportamento cívico irrepreensível”.
O presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) alertou, esta segunda-feira, 39 novos juízes para as dificuldades de fazer justiça numa era de desinformação e para as “tentativas de subjugação dos juízes ao poder político”, comprometendo a independência judicial.
No discurso da tomada de posse de 39 juízes de direito, que concluíram o 35.º curso normal do Centro de Estudos Judiciários, e que decorreu no Supremo Tribunal de Justiça, Henrique Araújo, presidente do STJ, e do CSM por inerência, alertou os novos magistrados para o “escrutínio sem paralelo” a que vão estar sujeitos, recomendando-lhes “um comportamento cívico irrepreensível e uma actividade social discreta, com a moderação que a responsabilidade do cargo exige”.
Mas foi para as dificuldades actuais da tarefa da administração da Justiça, que “se afigura bem mais difícil do que há uns anos”, que Henrique Araújo deixou o primeiro alerta.
O juiz conselheiro afirmou que se nota na sociedade “um mal-estar difuso, uma irritação em relação às instituições, aos seus agentes e responsáveis, um ambiente de desconfiança alimentado por uma rede de ferramentas tecnológicas de informação que produz torrentes de notícias diárias”, facilmente acessíveis e, por vezes, “contraditórias, enganadoras, descontextualizadas ou simplesmente falsas”.
Tudo isto, continuou, “afecta o modo de pensar das pessoas, confunde-as, conduz ao extremismo, à radicalização, à exteriorização dos sentimentos mais primários”.
Sentenças com linguagem clara
“A Justiça tem-se mostrado um alvo apetecível destas campanhas de desinformação. Os juízes, o Conselho Superior da Magistratura e as leis de orgânica judiciária são postos em causa das mais diversas maneiras, num processo de deslegitimação e enfraquecimento do poder judicial que todos sabemos como pode acabar”, disse.
Lembrando os casos da Hungria e da Polónia, onde o poder judicial foi “funcionalizado pelo poder político”, o juiz presidente do STJ alertou que não se pode pensar que “a independência do poder judicial, que constitui um dos fundamentos das sociedades democráticas ocidentais, se tem por definitivamente adquirida”.
“Temos de continuar atentos às tentativas de subjugação dos juízes ao poder político e de mostrar, através do nosso trabalho e dedicação, que os tribunais cumprem o seu papel de pacificação social e de regulação jurisdicional dos litígios”, disse Henrique Araújo.
O presidente do STJ não terminou sem deixar conselhos sobre aquilo que considerou “uma crítica frequente, e plenamente justificada” às decisões judiciais, “praticamente ininteligíveis para o cidadão médio”.
“Nas sentenças deve usar-se linguagem tão clara quanto possível e o discurso argumentativo deve ser sintético, ainda que suficiente para perceber o “iter” decisório. Evitem, também, as técnicas de copy paste ou usem-nas na medida do absolutamente necessário e sempre com critério e propriedade”, recomendou o juiz conselheiro, que terminou a intervenção reiterando que os “portugueses podem confiar nos seus juízes”.