D. Manuel Clemente reuniu-se com o Papa

Encontro “realizou-se num clima de comunhão fraterna e num diálogo transparente sobre os acontecimentos das últimas semanas que marcaram a vida da Igreja em Portugal”.

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D. Manuel Clemente foi recebido numa audiência privada daniel rocha

O cardeal-patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, foi recebido, na manhã desta sexta-feira, pelo Papa Francisco, em audiência privada, no Vaticano. A informação foi avançada pelo Patriarcado de Lisboa numa nota publicada no site oficial daquela entidade.

De acordo com o Patriarcado de Lisboa, o encontro foi pedido pelo próprio cardeal-patriarca de Lisboa e “realizou-se num clima de comunhão fraterna e num diálogo transparente sobre os acontecimentos das últimas semanas que marcaram a vida da Igreja em Portugal”.

D. Manuel Clemente comentou, há uma semana, a notícia de que terá ocultado das autoridades judiciais e policiais um caso de abusos sexuais no interior da Igreja. “Aceito que este caso e outros do conhecimento público, e que foram tratados no passado, não correspondem aos padrões e recomendações que hoje todos queremos ver implementados”, escreveu numa carta aberta.

O cardeal dizia, então, querer “esclarecer o que na verdade” testemunhou, tendo em conta “os muitos equívocos e perplexidades”, como lhes chamava, que tem constatado em “torno dos relatos sobre o doloroso caso denunciado em 1999”.

Em causa está o caso de um padre que, nos anos de 1990, tinha a seu cargo duas paróquias da zona norte do distrito de Lisboa e terá abusado sexualmente de crianças, como avançou o Observador na semana passada. A denúncia, de pelo menos um destes casos, foi feita pela mãe de uma das alegadas vítimas, ainda nessa altura, ao então cardeal-patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, e, mais recentemente, a D. Manuel Clemente. Em ambos os casos, não terá havido qualquer denúncia às autoridades civis nem um procedimento interno da Igreja.

Na carta aberta, o patriarca referiu que, tanto agora como em 2019, quando reuniu com a alegada vítima, não entendeu “ter estado perante uma renovada denúncia da feita em 1999”. E garantiu que, se assim tivesse sido, a denúncia teria sido remetida à Comissão Diocesana, criada por essa altura, de forma a cumprir os procedimentos recomendados à data. “Recordo que as regras e recomendações de 16 de Julho de 2020 são posteriores.”

Mais dois bispos ocultaram

Além desta suposta situação de ocultação, soube-se esta sexta-feira que pelo menos mais dois bispos terão agido de forma semelhante. Segundo a investigação do Expresso, em causa, estarão o bispo da Guarda, Manuel Felício, e o bispo emérito de Setúbal, Gilberto Reis.

Os dois bispos terão tido conhecimento de queixas de abusos sexuais cometidos por padres e não comunicaram essas suspeitas à Polícia Judiciária (PJ) ou ao Ministério Público (MP), as autoridades civis com competência para investigar este tipo de crimes.

Quanto ao bispo da Guarda, as suspeitas surgiram há quase dez anos, aquando da denúncia dos pais de 17 menores do seminário do Fundão que apresentaram uma queixa-crime à PJ por suspeitarem que os filhos tinham sido alvo de abusos sexuais pelo padre Luís Mendes, vice-reitor do seminário. Ao que o mesmo jornal noticia, de acordo com “fonte próxima do processo”, o bispo “ficou irritado e não escondeu esse mal-estar.

É ainda noticiado que um dos pais revelou à PJ, já depois da detenção de Luís Mendes, que Manuel Felício lhe disse que deveria ter falado primeiro com ele e não com os inspectores daquela força de investigação.

Luís Mendes foi condenado a dez anos de prisão por, enquanto vice-reitor do Seminário do Fundão, ter cometido 19 crimes de abuso sexual de menores. A sentença foi proferida no final de 2013, tendo o tribunal dado como provado que o padre tinha por costume surpreender as crianças enquanto estas dormiam – para as confortar, tal como qualquer pai faria, segundo o acusado; para as obrigar a praticar sexos orais e actos masturbatórios, segundo o tribunal. A Polícia Judiciária encontrara no computador do padre uma foto sua vestido de mulher, em poses eróticas, bem como outras fotografias com ex-seminaristas em “trajes menores”, em “tronco nu”, com “chantili” e na “cama”.

Quanto ao caso de suposta ocultação pelo bispo emérito de Setúbal, Gilberto Reis — bispo entre 1998 e 2015 —, o clérigo terá recebido queixas contra um padre que ainda hoje está no activo. Segundo uma resposta enviada por escrito ao Expresso pela diocese, “existiu uma averiguação canónica organizada pelo bispo à data, com audição de todas as partes envolvidas, ou seja, o alegado perpetrador e as alegadas vítimas”.

O padre suspeito esteve suspenso entre 2008 e 2015, enquanto a investigação canónica decorreu. Depois disso, o decreto do Vaticano “permitiu que o sacerdote em causa voltasse a exercer o seu ministério, com o ofício de pároco”, lê-se ainda. Na mesma resposta, a diocese admite que “não foi feita uma participação ao Ministério Público, tendo em conta as recomendações canónicas e civis que estavam e vigor à data”.

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