Equipas médicas podem ser deslocadas entre hospitais para evitar fechos de urgências? Ministério diz que lei não permite
Escalas médicas de Agosto continuam a não estar todas preenchidas e Lisboa e Vale do Tejo e o Alentejo são as regiões mais afectadas.
Para evitar que urgências de ginecologia e obstetrícia e blocos de partos fechem temporariamente por falta de médicos, como tem vindo a repetir-se nas últimas semanas, obrigando ao encaminhamento de grávidas de um hospital para outro, a comissão nomeada pelo Governo para ajudar a mitigar a crise das maternidades propôs a concentração temporária de algumas equipas médicas durante o Verão. “Mas foi-nos transmitido [pelo Ministério da Saúde] que, do ponto de vista legal, não é possível deslocar [equipas médicas] de um serviço para outro”, revelou esta segunda-feira o coordenador da comissão, Diogo Ayres de Campos, numa conferência de imprensa em que fez um apelo veemente aos ginecologistas e obstetras para que colaborem e façam “um esforço adicional” para manter as urgências abertas durante o Verão.
Esta foi “uma das primeiras propostas” apresentadas ao Governo, frisou. Sem esclarecerem a questão desta impossibilidade legal, os dois secretários de Estado presentes no encontro com os jornalistas admitiram que as escalas médicas de Agosto não estão todas preenchidas e que os constrangimentos deverão “manter-se e até repetir-se no Natal”, ou seja, que o fecho temporário e as limitações de funcionamento (contingências) de algumas maternidades irão continuar. Lisboa e Vale do Tejo e o Alentejo são as regiões mais afectadas.
“A concentração de recursos só será possível”, assim, na sequência da anunciada proposta de revisão da actual rede de referenciação, que permitirá concentrar serviços e, eventualmente, fechar maternidades, mas isso “ocorrerá apenas depois dos meses de Verão”, frisou Diogo Ayres de Campos. A proposta está a ser preparada para ser apresentada ao Governo no final de Setembro, disse.
Relativamente a estas medidas, o secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Lacerda Sales, foi cauteloso: “Quer a concentração de recursos, quer um eventual encerramento de maternidades” são assuntos que exigem “muita ponderação”.
Mas Lacerda Sales e a secretária de Estado da Saúde, Maria de Fátima Fonseca, acreditam que o decreto-lei que define um novo regime remuneratório do trabalho suplementar dos médicos em todos os serviços de urgência — em vigor desde terça-feira passada — vai ter impacto, convencendo alguns profissionais a fazerem mais horas extraordinárias, que agora podem ser pagas com valores superiores — entre 50 a 70 euros, se já tiverem acumulado este ano mais de 50 horas extras ou mais de 150, respectivamente. O secretário de Estado adjunto enfatizou ainda que é possível chegar-se aos “90 euros por hora”, por estar prevista uma majoração de “15%” em alguns casos.
Depois de uma maratona de encontros com todos os presidentes dos conselhos de administração dos hospitais para esclarecer os contornos do diploma que foi contestado por prever uma espécie de norma travão — a despesa entre este mês de Agosto e Janeiro de 2023 não poderá exceder a do segundo semestre de 2019 —, os dois governantes estão convencidos de que a situação irá melhorar porque, além de se pagar mais pelas horas extras aos médicos dos quadros das unidades, também passou a ser possível contratar sem termo profissionais que actualmente trabalham em prestação de serviços (os chamados “tarefeiros"). O objectivo é reduzir ao mínimo o recurso a prestadores de serviços, repetiu Maria de Fátima Fonseca.
O novo regime remuneratório é “uma solução de curto prazo”, porém, e não chega para resolver os problemas que se arrastam há anos. Diogo Ayres de Campos apresentou uma nova proposta: a de que a remodelação dos serviços de ginecologia e obstetrícia seja “incluída no financiamento do PRR [Plano de Recuperação e Resiliência] “de forma a que seja possível criar “condições hoteleiras adequadas e não deixar que o Serviço Nacional de Saúde [SNS] se torne um parente pobre da medicina privada”.
No SNS há actualmente 826 médicos desta especialidade e 281 internos “e não os 1800 a que algumas pessoas” têm aludido, especificou, lembrando que as equipas médicas estão “muito desfalcadas” e têm “médias etárias muito elevadas”.