Biden e Lapid unidos contra “um Irão nuclear” e em defesa de uma “coligação moderada” no Médio Oriente
O primeiro-ministro israelita diz que só a força impedirá Teerão de chegar à bomba atómica, o Presidente dos EUA continua a acreditar na diplomacia. Visita de Biden à Arábia Saudita é “extremamente importante para Israel e para a região”, diz Lapid.
Um encontro descontraído, onde terá havido tempo até para falar de basebol (segundo brincou Yair Lapid), terminou com Joe Biden e o primeiro-ministro israelita a assinarem a Declaração de Jerusalém, onde se reafirmam “os laços inquebráveis” entre os dois aliados e “o compromisso duradouro dos Estados Unidos com a segurança de Israel”. Esta é a décima visita de Biden a Israel, a primeira enquanto chefe de Estado.
Na conferência de imprensa conjunta desta quinta-feira, Lapid disse a Biden que só “uma ameaça militar credível” travará as ambições nucleares do Irão – no documento que ambos assinaram, Biden garante que os EUA estão prontos a “usar todos os elementos do seu poder” para garantir que Teerão não chegue à bomba atómica. Mas não deixou de discordar do seu anfitrião sobre a forma: “Continuo a acreditar que a diplomacia é o melhor caminho”, afirmou, defendendo assim o esforço que Washington continua a pôr no relançamento do acordo sobre o programa nuclear iraniano, mesmo após os avanços realizados por Teerão desde que Donald Trump rasgou o pacto internacional.
Na sua primeira viagem ao Médio Oriente desde que foi eleito – a Israel, segue-se, na sexta-feira, a Arábia Saudita –, uma viagem que o Presidente norte-americano tentou justificar com a necessidade de promover a integração regional de Israel, os dois líderes participaram ainda numa cimeira virtual com os dirigentes dos Emirados Árabes Unidos e da Índia. No primeiro encontro de chefes de Estado e de Governo do recém-criado fórum I2U2, Biden, Lapid, Mohamed bin Zayed e Narendra Modi anunciaram projectos de colaboração nos campos da segurança alimentar e da energia limpa.
Obrigado a defender a sua decisão de visitar a Arábia Saudita, o país que descreveu como “pária” na campanha presidencial, e de se encontrar com Mohammed bin Salman, o príncipe herdeiro que a CIA diz ter autorizado o assassínio do jornalista Jamal Khashoggi, Biden ouviu Lapid descrever essa visita como “extremamente importante para Israel e para a região, para a nossa segurança e para a prosperidade futura do Médio Oriente”.
A reaproximação entre Biden e MBS (o príncipe é conhecido pelas suas iniciais) é vista por americanos e israelitas como fundamental para a futura normalização de relações entre Israel e a monarquia do Golfo e para “tentar construir uma coligação mais moderada [anti-Irão e pró-EUA] no Médio Oriente, há muito necessária”, nas palavras de Lapid.
Em Jidá, o porto saudita do mar Vermelho onde estará entre sexta-feira e sábado, para além do encontro com MBS, Biden vai participar numa cimeira do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG). Quase a cumprirem-se dois anos desde que Israel anunciou a “normalização de relações” com os Emirados (e logo depois com o Bahrein), Lapid pediu a Biden que leve uma mensagem aos líderes das outras nações árabes, Arábia Saudita, Qatar, Kuwait, Omã e Iraque (que não integra o CCG mas estará presente): “A nossa mão está estendida para a paz. Estamos prontos a partilhar a nossa tecnologia e a nossa experiência, prontos para que os nossos povos aprendam mais uns sobre os outros, prontos para que os nossos cientistas colaborem e os nossos empresários cooperem”.
Colonatos e palestinianos
Desde o primeiro dos Acordos de Abraão, Israel e Emirados não pararam de aprofundar a sua cooperação, tendo até assinado um acordo de comércio livre global, em Maio. Em paralelo, os sinais de aproximação entre sauditas e israelitas também se têm sucedido. O Governo de Israel espera que Biden consiga progressos palpáveis nesse processo; a Casa Branca avisou que a probabilidade de um anúncio formal de passos concretos em direcção à desejada aliança era de 50/50.
A maioria dos analistas estima que MBS não está pronto para dar esse passo – nem quererá fazê-lo antes de conseguir mais da parte de Biden. Para já, o grande objectivo do Presidente norte-americano é sair do reino com um compromisso de que Riad voltará a garantir o aumento da produção de petróleo, permitindo tranquilizar um pouco um mercado que a invasão russa da Ucrânia deixou em alvoroço.
Se é verdade que Biden e Lapid sorriram muito, também concordaram em discordar em vários tópicos. Sobre Israel e a Palestina, a Declaração de Jerusalém refere que os EUA “afirmam o seu longo e consistente apoio a uma solução de dois Estados [política enterrada por Trump] e ao progresso para uma realidade em que israelitas e palestinianos possam desfrutar de idênticas garantias de segurança, liberdade e prosperidade”. Na prática, segundo a imprensa israelita, Biden prometeu a Lapid que não fará grande pressão para avanços ou conversações de paz, pedindo-lhe em troca que não surpreenda Washington com anúncios sobre novos colonatos (as construções ilegais onde civis israelitas vivem em território ocupado ou anexado).