Ler de manhã à noite é na Sertã
Há dez anos que a Sertã organiza um encontro que promove a leitura. Lê-se em todo lado, nem as aldeias e as fábricas escapam.
São 24 horas a ler ininterruptamente e três dias de festa à volta dos livros e das palavras. A Maratona de Leitura da Sertã vai na 10.ª edição e desde quinta-feira juntou mais uma vez escritores, leitores, contadores de histórias e mediadores de leitura. Toda a vila se mobiliza em torno da leitura.
Este ano, um dos convidados foi o físico Carlos Fiolhais, que disse ao PÚBLICO “a ânsia” que sentia por poder participar neste “festival de leitura”, como lhe chamou. “É de exaltar a leitura, que não é muito praticada neste reino…”
“Futuro” foi o tema desta edição e o cientista escolheu ler no Cine-Teatro Tasso, às 19h45 deste sábado, um excerto de Cosmos, de Carl Sagan. Recorda que foi publicado em 1982, por altura do seu doutoramento: “Ele fala sobre o futuro da humanidade, sobre a trajectória humana, indo do passado para o futuro, uma seta no tempo. E de como a compreensão do universo ‘aumenta’ o nosso cérebro.”
Para Carlos Fiolhais, a invenção da imprensa no século XV “permitiu a todos os que sabiam ler um maior conhecimento do mundo e uma maior coesão da humanidade”. Diz que lê muito, “tudo”, e, sempre que for convidado para encontros à volta dos livros, irá. “É a minha forma de pagar, de retribuir. Comecei a ler aos quatro anos e já estou com 66. Foi através da leitura que descobri a ciência e me tornei no que sou.”
Numa conversa animada, o também colunista do PÚBLICO disse estar contente por ir “conhecer a Sertã” e “provar maranhos”. Vila de Rei, perto da Sertã, foi pretexto para falar do “cálculo matemático que a define como o centro do país” e, divertido, explicar: “Se pendurássemos o país, a partir de Vila de Rei, ficava direitinho, não pendia para lado nenhum.”
Carlos Fiolhais participou no Encontro com Escritores na noite de quinta-feira, com Vítor Cardoso e Miguel Montenegro, sob o tema “A melhor maneira de prever o futuro é criá-lo”, e neste sábado de manhã foi às Festas nas Aldeias (Carvalhal e Figueiredo), com Ana Lage e Bru Junça.
Outros convidados: Eduardo Marçal Grilo, Manuel João Vieira, Pedro Paixão, Miguel Poiares Maduro, Mário Augusto, Álvaro Domingues, Possidónio Cachapa, Vítor Rua, Viriato Soromenho Marques, André Neves e Roger Mello (Brasil), Rui David, Maurício Leite, Joana M. Lopes, Andante Associação, Lisbon Poetry Orchestra, Fernando Alvim, Miguel-Manso, Filipe Lopes, Ana Cristina Pereira, Jorge Serafim, Benita Prieto, Cristina Taquelim, Rodolfo Castro, entre outros.
Mais de 7 mil pessoas a ler em voz alta
Até esta edição, a Maratona de Leitura já pôs 7900 pessoas a ler em voz alta, teve 270 convidados, foi apoiada por cem empresas e instituições e por dezenas de voluntários e levou os participantes a visitar 110 lugares. Dados que Ana Sofia Marçal, directora da Biblioteca Municipal Padre Manuel Antunes, revelou num outro encontro, em Pombal, Caminhos de Leitura, no final de Junho.
A bibliotecária informou ainda que a Maratona de Leitura “aumentou a adesão às actividades regulares da biblioteca, afirmou a biblioteca como um serviço notável no seio da comunidade, é uma iniciativa de referência no panorama cultural de Portugal e aumentou o número de empréstimos domiciliários. Em 2019, foi de 32%”.
Desde as zero horas deste sábado até à meia-noite, várias pessoas lerão em voz alta, durante cinco minutos cada, no Cine-Teatro Tasso. “Desafiamos as pessoas a ler em voz alta e procuramos também estimular o acto de ler e de ouvir ler. Porque, como diz o escritor Jorge Luis Borges, ‘a leitura deve ser uma das formas de felicidade’”, escreve-se no programa desta 10.º edição.
A festa encerra no castelo, depois de jovens do concelho declamarem poesia (21h00), O Futuro Está Escrito no Passado – Poesia para Salvar o Mundo, a que se segue Declanto, com Miguel Calhaz e Rui Oliveira (21h40), Um Secreto Regresso (21h50), por Jacarandá (Pedro Lamares e Ana Isabel Dias), e, por último, o espectáculo de poesia Há Sexos Curtos e Outros Que Dão Pelos Joelhos (23h50), com José Carlos Tinoco e Marco Figueiredo, entre outros.
A maratona encerra, mas o lema continua: “Viva a leitura em voz alta.”