Montepio: Tomás Correia diz que nunca houve alerta de risco no investimento na PT

O ex-presidente da Caixa Económica Montepio Geral prestou declarações, na fase final do julgamento dos recursos para o Tribunal da Concorrência das coimas de 620.000 euros aplicadas pelo Banco de Portugal.

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LUSA/ANTÓNIO COTRIM

O antigo presidente do Montepio Tomás Correia disse esta segunda-feira ao Tribunal da Concorrência que nunca houve qualquer indicação de risco na compra de obrigações relacionadas com a PT e que não passou por si a autorização da operação.

O ex-presidente da Caixa Económica Montepio Geral (CEMG) prestou declarações, na fase final do julgamento dos recursos para o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, das coimas de 620.000 euros aplicadas pelo Banco de Portugal (BdP) por incumprimentos quanto a investimentos, nomeadamente em dívida da PT Finance, tendo sido condenado ao pagamento de 70.000 euros pela prática de quatro infracções (três a título negligente e um doloso).

Na decisão do BdP de Outubro de 2021, a CEMG foi multada em 475.000 euros pela prática de sete contra-ordenações (CO) a título doloso, tendo ainda sido visados, além de António Tomás Correia, os ex-administradores Jorge Barros Luís (50.000 euros por três CO a título negligente) e João Neves (25.000 euros por uma CO a título negligente).

Em causa está, nomeadamente, o investimento em duas obrigações Credit Linked Notes (CLN) emitidas, uma pelo Crédit Agricole e outra pela Morgan Stanley, sobre a Portugal Telecom International Finance (PTIF), no montante total de 75 milhões de euros, às quais estavam agregados contratos de ‘swaps’ de risco de incumprimento (Credit Default Swap, CDS), no mesmo valor, em que a CEMG assumia a protecção da emitente.

Na sua decisão, de Outubro de 2021, o BdP considerou que o investimento nas duas CLN gerou uma exposição elevada ao risco de crédito dos emitentes e à PTIF, no montante de 75 milhões de euros, e que as características muito particulares destas operações exigiam dos diversos intervenientes um cuidado diferenciado.

Tomás Correia disse ao Tribunal que só teve conhecimento da existência de risco quando confrontado com o presente processo, admitindo a existência de “erro” no registo da operação, que atribuiu a “ignorância” da Mesa de Negociação, pelo que a Direcção de Risco não se apercebeu da ultrapassagem dos limites definidos pela administração.

O antigo presidente da CEMG afirmou que o Comité de Activos e Passivos (ALCO) fixava os limites para investimentos em CLN, tendo a Direcção Financeira autonomia de decisão dentro dessa margem.

Estes investimentos surgiram no âmbito da decisão, tomada em finais de 2013, de reforçar a exposição a empresas portuguesas para compensar o desinvestimento em dívida pública portuguesa, que chegou a atingir os quatro mil milhões de euros.

Durante o seu depoimento, Tomás Correia recordou o episódio “rocambolesco” da notificação da decisão do BdP, com publicação “na secção de desporto do jornal Público”, dizendo que se sentiu “humilhado”.

Afirmando que o banco foi o único que investiu em dívida pública portuguesa num momento particularmente difícil para o país, Tomás Correia sublinhou as características “únicas” do Montepio e o facto de ter conseguido manter-se, ao contrário do que sucedeu com instituições mutualistas noutros países.

Entre as muitas dificuldades a que a CEMG “resistiu” incluiu as notícias e mensagens aos clientes, em 2014 e no primeiro semestre de 2015, dizendo que o banco ia fechar, o que originou uma perda de “quase cinco mil milhões de euros de recursos”.

“O Montepio contou com a ajuda dos pirómanos”, declarou, salientando que, ao contrário de outros, o banco “nunca pediu ajuda ao Estado, nem para liquidez, nem para capital”.

Tomás Correia afirmou que pode ser multado, mas que a sua consciência lhe diz que fez bem o seu papel.

“Pode haver insuficiência em muitas coisas, mas o saldo é altamente positivo”, disse, pedindo, no final do seu depoimento, “desculpa” por ter havido um momento em que se emocionou ao falar da dedicação dos trabalhadores do banco.

As alegações finais do julgamento ficaram agendadas para os dias 5 e 6 de Setembro, prestando João Neves, que falou no início do julgamento (em Maio), declarações adicionais no próximo dia 11.