Presidente do Partido Conservador britânico demite-se após resultados eleitorais “muito maus”
Oliver Dowden diz que derrotas eleitorais em Wakefield e Tiverton e Honiton são “as últimas de uma série de resultados muito maus para o nosso partido” e que “alguém tem de assumir a responsabilidade”. Boris Johnson garantiu que vai “escutar” os eleitores, mas prometeu “continuar” apesar da derrota do partido Conservador.
O presidente do Partido Conservador britânico, Oliver Dowden, apresentou esta sexta-feira a demissão ao primeiro-ministro Boris Johnson, depois de uma série de resultados eleitorais “muito maus”, incluindo as derrotas nas eleições legislativas parciais de quinta-feira.
Essas derrotas “são as últimas de uma série de resultados muito maus para o nosso partido”, escreveu Dowden numa carta endereçada ao primeiro-ministro. “Os nossos militantes estão irritados e desapontados com os acontecimentos recentes, e eu partilho os seus sentimentos. Não pode continuar tudo na mesma. Alguém tem de assumir a responsabilidade”, acrescentou.
Nas legislativas parciais de quinta-feira, vistas como um teste à popularidade de Boris Johnson junto dos eleitores, os Conservadores perderam o círculo eleitoral de Tiverton e Honiton para os liberais democratas e o de Wakefield para o principal grupo da oposição, o Partido Trabalhista (Labour).
Em Wakefield, no Norte de Inglaterra, estava em jogo o que era tradicionalmente um bastião trabalhista, mas que foi conquistado pelos Conservadores em Dezembro de 2019, contribuindo para a maioria absoluta dos tories. O Partido Trabalhista recuperou um assento que tinha perdido para os tories em 2019 ao arrebatar 47,9% dos votos, contra 30% do Partido Conservador.
A eleição foi desencadeada pela demissão do deputado Imran Khan, que foi condenado a 18 meses de prisão por assédio sexual de um rapaz de 15 anos. O círculo eleitoral foi continuamente mantido pelos Trabalhistas entre 1932 e 2019, mas o forte apoio local ao Brexit beneficiou os Conservadores.
“Hoje, as pessoas de Wakefield falaram em nome dos britânicos. Eles disseram, firmemente: Boris Johnson, o seu desrespeito por este país já não é tolerado”, afirmou o deputado eleito, Simon Lightwood.
Para o líder do Labour, Keir Starmer, o resultado no círculo eleitoral do norte de Inglaterra “mostrou que o país perdeu a confiança nos Conservadores”. Starmer reivindicou este resultado como um “veredicto claro sobre um Partido Conservador que ficou sem energia e ideias”.
Mas foi em Tiverton e Honiton, no Sudoeste de Inglaterra, que ficou exposta a fragilidade do Partido Conservador, onde perdeu para os Liberais Democratas, que conquistaram 52,9% dos votos, uma subida de 38 pontos percentuais face a três anos. O Partido Conservador, que tinha conquistado 60% dos votos em 2019, ficou-se pelos 38,5%.
O deputado eleito, Richard Foord, avisou “os deputados Conservadores que continuam a apoiar o primeiro-ministro débil”. “Os Liberais Democratas vêm aí” e “se não tomarem medidas para restaurar decência, respeito e os valores britânicos em Downing Street, também arriscam derrotas eleitorais com aquelas a que assistimos aqui”, garantiu.
O líder dos Lib Dems, Ed Davey, reivindicou a maior reviravolta eleitoral na história britânica e reiterou o pedido de demissão sobre Boris Johnson. “A população de Tiverton e Honiton falou em nome do país. As pessoas já estão fartas das mentiras e do desrespeito pela lei de Boris Johnson e está na altura de os deputados conservadores finalmente fazerem o que está certo e despedirem-no”, afirmou.
Em Tiverton e Honiton, uma circunscrição eleitoral que pertencia aos tories desde que foi criada, em 1997, os eleitores votaram para escolher o sucessor de Neil Parish. O deputado de 65 anos demitiu-se após ter admitido ver pornografia no telemóvel enquanto estava no Parlamento. O antigo agricultor de profissão alegou ter entrado numa página para adultos por engano enquanto procurava tractores e que depois, num “momento de loucura”, voltou ao mesmo site.
Num sinal do mal-estar dentro do partido, a candidata em Tiverton e Honiton, Helen Hurford, recusou-se por duas vezes a comentar a honestidade de Boris Johnson, numa entrevista ao diário The Guardian. O primeiro-ministro “pensa que é honesto”, respondeu.
Boris Johnson determinado a continuar
O primeiro-ministro Boris Johnson garantiu que vai “escutar” os eleitores, mas prometeu “continuar”, apesar da derrota. Em declarações aos jornalistas no Ruanda, onde se encontra numa reunião da Commonwealth, reconheceu os “resultados difíceis”, que atribuiu à inflação e o impacto no preço da energia, combustíveis e comida.
"Penso que como Governo tenho de ouvir o que as pessoas dizem, em particular as dificuldades que as pessoas enfrentam em relação ao custo de vida, o que penso que para a maioria das pessoas é a questão número um”, afirmou. O líder conservador, que na véspera tinha considerado um “absurdo” demitir-se por causa de eleições intermédias, prometeu fazer mais e continuar: “Tendo em conta as preocupações das pessoas até ultrapassarmos este mau bocado”.
Boris Johnson sobreviveu a uma moção de censura interna no início de Junho ao obter 59% dos votos dos deputados do Partido, determinando as regras que não se possa repetir uma nova moção no espaço de 12 meses.
Considerada uma máquina vencedora de eleições após o triunfo nas legislativas, há dois anos e meio, sob a promessa de concretizar o “Brexit”, a reputação de Johnson tem vindo a ser atingida por sucessivos escândalos durante o mandato.
Ansioso por se afirmar no palco internacional, Johnson cancelou na semana passada a presença num encontro de Conservadores no Norte de Inglaterra para visitar Kiev pela segunda vez e, ao lado do Presidente ucraniano, Volodmyr Zelensky, reiterar o apoio do Reino Unido face à invasão russa.
No plano interno, o contexto não é favorável para o Governo, com a inflação a 9,1%, o mais alto nível em 40 anos, algo que está a aumentar a agitação social, com greves em curso nos transportes ferroviários e outras previstas na educação e saúde.
Com a imagem desgastada pelo escândalo das festas na residência oficial de Downing Street durante o confinamento imposto devido à pandemia, o Executivo envolveu-se novamente em controvérsia recentemente, devido ao fracasso da tentativa de deportação de migrantes ilegais para o Ruanda.
Entretanto, surgiu uma nova polémica, que a imprensa apelidou de “Carriegate”, sobre alegadas tentativas repetidas de Boris Johnson para obter empregos remunerados para a mulher, Carrie.