Governador do Oklahoma promulga lei anti-aborto desde a fecundação
Nova lei é a mais restritiva em todos os EUA e vai contra uma decisão do Supremo Tribunal norte-americano de 1973, que os actuais juízes se preparam para reverter.
O governador do estado norte-americano do Oklahoma, o republicano Kevin Stitt, promulgou uma proposta de lei que proíbe o aborto a partir do momento da fecundação do óvulo.
“A vida começa no momento da concepção, e é a partir dessa altura que temos a responsabilidade, como seres humanos, de fazer tudo o que for possível para proteger a vida do bebé e a vida da mãe”, disse Stitt durante a cerimónia de promulgação, na noite de quarta-feira.
“Se outros estados quiserem aprovar leis distintas, têm esse direito. No Oklahoma, iremos sempre defender a vida”, declarou o governador.
O texto da lei estipula que a vida começa no momento da fecundação (“quando ocorre a fusão de um espermatozóide humano com um óvulo humano”), mas a lei não proíbe “o uso, a prescrição, a administração ou a venda da pílula do dia seguinte e de qualquer outro tipo de contracepção de emergência” – cuja finalidade é impedir a implantação do óvulo fecundado no útero.
“A nossa intenção é desencorajar o aborto, e não a contracepção”, disse a congressista republicana Wendi Stearman, da Câmara dos Representantes do Oklahoma.
A lei admite excepções para emergências médicas, ou para uma gravidez que resulte de violação ou incesto – desde que esses crimes tenham sido denunciados à polícia.
Movimento anti-aborto
A nova lei foi aprovada na semana passada com os votos da maioria do Partido Republicano na assembleia legislativa do Oklahoma, e é agora a mais restritiva de todos os estados dos EUA.
Em 2021, a maioria republicana no Texas aprovou uma lei que proíbe o aborto a partir das seis semanas de gravidez – desde que é possível, segundo os defensores da proposta, “ouvir o batimento cardíaco do feto”.
Segundo os estágios do desenvolvimento fetal aceites pela generalidade da comunidade médica, só a partir das oito semanas se considera que um embrião se transforma num feto; e, às seis semanas, o coração ainda não está formado e só é possível detectar sinais de actividade através de ultra-sons.
A lei do Texas serviu de modelo a muitos outros estados norte-americanos – como o Oklahoma –, que desde então têm aprovado uma série de leis que restringem o direito ao aborto, indo contra os princípios de uma decisão de 1973 do Supremo Tribunal dos EUA.
Nesse ano, os juízes do Supremo decidiram que os estados norte-americanos não têm o direito de proibir o acesso das mulheres ao aborto durante o primeiro trimestre de gravidez, e que só podem intervir durante o segundo trimestre para proteger a saúde das grávidas.
A decisão de 1973 (no caso conhecido como Roe vs. Wade) seria aligeirada duas décadas depois, em 1992, quando uma outra composição do Supremo decidiu (no caso Planned Parenthood vs. Casey) que os estados podem legislar contra o aborto desde que não imponham “um peso indevido” ao acesso das mulheres a esse direito.
Regresso a 1972
Agora, o Supremo Tribunal – composto por três juízes liberais e por seis juízes conservadores, incluindo três nomeados pelo ex-Presidente dos EUA Donald Trump – prepara-se para reverter a decisão de 1973 na sua totalidade, devolvendo a cada assembleia legislativa estadual o direito a legislar como bem entender sobre o acesso ao aborto.
No início de Maio, na sequência de uma fuga de informação, soube-se que o juiz conservador Samuel Alito é o responsável por uma posição do Supremo que anula a decisão Roe v. Wade, de 1973.
Essa nova posição dos juízes só vai ser anunciada em finais de Junho, mas é provável que o documento que foi divulgado no início do mês (um caderno volumoso com 98 páginas) seja assinado pelos outros cinco juízes conservadores e adoptado como a decisão final do Supremo, com uma votação de 6-3.
Se isso acontecer, chega ao fim um período de quase meio século de legalização do aborto nos EUA, e cada estado poderá aprovar leis mais ou menos restritivas.
Os defensores da legalização do aborto em todo o país (com a imposição de garantias legais mínimas em todos os estados) alertam que a mudança de posição do Supremo irá impedir o acesso ao aborto em condições de segurança a milhões de mulheres, nos estados do Sul e na região do Midwest.
A mudança vai restringir ou proibir o acesso ao aborto numa parte do território dos EUA onde vivem mais de 100 milhões de pessoas, e vai prejudicar de forma desproporcional as populações mais pobres e sem recursos para procurar alternativas em outros estados.