Supremo condena seguradora a indemnizar mulher surda atropelada em Matosinhos

O acidente ocorreu a cerca de 45 metros de uma passadeira, quando a mulher saía de um hipermercado e se preparava para atravessar a via para se dirigir ao veículo do seu marido, que se encontrava estacionado do outro lado da faixa de rodagem.

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O acidente ocorreu a cerca de 45 metros de uma passadeira Ana Marques Maia

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) condenou uma seguradora a indemnizar uma mulher surda e disléxica que foi atropelada ao atravessar uma avenida em Matosinhos, apesar de concluir que o condutor não teve culpa no acidente.

O Tribunal de Matosinhos tinha condenado a seguradora do automobilista envolvido no acidente a pagar à vítima 15.583,83 euros, mas a Relação absolveu-a do pedido de indemnização, considerando que o acidente ficou a dever-se de modo exclusivo ao comportamento “negligente e imprudente” da mulher, porque “viu o veículo a aproximar-se e que não obstante isso tomou a decisão de invadir a faixa de rodagem por onde aquele circulava”.

A mulher sustentou que por ser surda não conseguia “ouvir o ruído do motor e do veículo” e por isso “não conseguia estimar a velocidade”, ou seja, não tinha capacidade para avaliar correctamente a velocidade e de tomar uma decisão conscienciosa em função desse elemento.

No entanto, os juízes da Relação entenderam que lhe era exigível “maior cuidado na tomada de decisão uma vez que a surdez não a priva de inteligência, raciocínio, experiência de vida, poder de observação e de ajustamento”.

O acidente ocorreu em 12 de Julho de 2017 a cerca de 45 metros de uma passadeira, quando a mulher saía de um hipermercado e se preparava para atravessar a via para se dirigir ao veículo do seu marido, que se encontrava estacionado do outro lado da faixa de rodagem. Os factos provados referem que a mulher percorreu cerca de um metro da faixa de rodagem, quando foi colhida por um veículo automóvel e foi projectada para o chão, tendo sofrido ferimentos num ombro, numa anca e num pé.

Agora, o acórdão, datado de 5 de Maio e a que a Lusa teve acesso, deu razão à mulher, confirmando a decisão da primeira instância que tinha condenado a seguradora.

Ao contrário da Relação, os juízes conselheiros concluíram que não houve “culpa grave” da mulher de 53 anos, considerando que embora o seu comportamento tenha sido “culposo”, isso “não exprime uma negligência grosseira, escandalosa ou intolerável”. “Embora a imprevidência pudesse ter sido evitada com uma maior diligência ou com um maior esforço, é ainda algo de que dizemos “isso pode acontecer”, e não já algo de que digamos “não se admite que tal aconteça"”, refere o acórdão.

O STJ decidiu assim que os factos dados como provados são suficientes para que se sustente que “houve contribuição do risco do veículo segurado pela ré para o acidente, devendo imputar-se-lhe 40% da responsabilidade”.