Governo quer criar 600 vagas em cadeias à volta da capital para fechar prisão de Lisboa
Encerramento da cadeia da capital está prevista desde 2017, mas para o anterior Governo tal seria resolvido com a construção de uma nova prisão no Montijo, a que a ministra da Justiça não se referiu esta quarta-feira no Parlamento, onde foi ouvida.
A ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, avançou esta quarta-feira no Parlamento que o Governo pretende criar mais de 600 novas vagas em quatro cadeias à volta de Lisboa (Alcoentre, Linhó, Pinheiro da Cruz e Sintra) para conseguir fechar o estabelecimento prisional de Lisboa, cujo encerramento está previsto pelo menos desde 2017 e que a governante considerou prioritário.
No discurso de abertura da audição que decorreu até ao início da tarde na Assembleia da República, para apreciar o Orçamento do Estado para este ano na área da Justiça, Catarina Sarmento e Castro comprometeu-se com o reforço de funcionários judiciais para os tribunais, sem, contudo, quantificar o número de oficiais de justiça a admitir futuramente, apesar de ter sido repetidamente questionada sobre este assunto.
Este é um dos principais problemas de recursos na área da Justiça, uma necessidade reconhecida de forma consensual pelos diversos operadores do sector, mas que não teve eco no orçamento deste ano. A governante diz ser um objectivo deste Governo rever o estatuto profissional dos funcionários judiciais e sublinhou que já reuniu com os sindicatos que representam esta classe.
Catarina Sarmento e Castro precisou que a despesa total para a Justiça em 2022 é de 1,610 milhões de euros, um montante que, diz, corresponde a um aumento de 115 milhões de euros face ao orçamentado para 2021, ou seja, mais 7,7%. “Este é o orçamento inicial do Ministério da Justiça mais elevado de sempre”, afirmou.
Nas mais de cinco horas de audição, a ministra não fez qualquer referência à construção de uma nova cadeia no Montijo, a solução avançada pelo Governo anterior para encerrar a cadeia de Lisboa, cujas condições desumanas e degradantes foram denunciadas por organismos internacionais como o Comité Europeu para a Prevenção da Tortura. E é frequentemente alvo de queixas por parte dos reclusos.
"É fundamental continuar a trabalhar na dignificação das condições materiais dos estabelecimentos de privação da liberdade, para corresponder às recomendações das instâncias internacionais de Direitos Humanos, dando início às obras de ampliação e requalificação de 13 pavilhões-tipo nos Estabelecimentos Prisionais de Alcoentre, Linhó, Pinheiro da Cruz e Sintra”, afirmou a ministra. E acrescentou: “Estas obras, que já têm os projectos de arquitectura concluídos, proporcionarão o aumento de capacidade para acolhimento de 624 reclusos, com vista ao encerramento do Estabelecimento Prisional de Lisboa”.
Mesmo assim, este reforço de vagas não responderá totalmente às necessidades, já que, no final do ano passado, encontravam-se na cadeia da capital 894 reclusos.
Informatização e digitalização
Catarina Sarmento e Castro disse que o Governo pretende avançar para a segunda fase de requalificação do Estabelecimento Prisional S. José do Campo, em Viseu, e para a construção da nova cadeia de São Miguel, nos Açores. Nunca se referiu à nova cadeia de Montijo, que teria uma capacidade entre os 600 e os 800 lugares, contra os 148 que possui actualmente.
Apesar da principal novidade ser nos serviços prisionais, as palavras mais repetidas pela ministra durante a audição foram informatização, digitalização e inteligência artificial, o que levou a deputada do PSD Mónica Quintela a rejeitar que a transformação digital seja a “panaceia de todos os problemas da Justiça”.
"A aposta nas novas tecnologias, que se pretende reforçar, contará, nos próximos anos, com cerca de 267 milhões de euros do PRR, que será catalisador de um novo processo de modernização do sistema judicial, com foco especial nos Tribunais Administrativos e Fiscais e nas áreas da insolvência e da cobrança de dívidas”, sublinhou Catarina Sarmento e Castro. A ministra realçou que o “novo paradigma” pretende desenvolver um modelo com base no digital, “que permita desenhar novos mecanismos de simplificação e agilização processual”. A governante falou ainda na criação de ferramentas que reúnam mais conhecimento e permitam melhorar a gestão dos recursos.
Sobre as pendências nos tribunais comuns, a nova titular da pasta da Justiça sublinhou que há nove anos que se verifica uma redução consecutiva dos processos pendentes na primeira instância. “Em 2021, o número de processos pendentes nos tribunais judiciais foi o mais baixo dos últimos 26 anos. O número de processos findos foi superior ao número de processos entrados, o que justifica o decréscimo da pendência em cerca de 8,9%”, detalhou.
Sobre os tribunais administrativos e fiscais, os mais congestionados do país, que demoram, por vezes, duas décadas a decidir de forma definitiva um processo, a ministra admitiu “melhorias demasiado tímidas”, tendo falado num “novo” plano de acção estratégica, que, contudo, foi lançado pela sua antecessora, Francisca Van Dunem. Catarina Sarmento e Castro afirmou que esse plano teria metas, medidas calendarizadas e entidades responsáveis pela sua concretização, mas não concretizou nenhuma.
A ministra garantiu ainda que este orçamento terá um foco no combate à corrupção, após a aprovação da estratégia nacional no final do ano passado no Parlamento. “O passo fundamental que se segue será a instalação e operacionalização do Mecanismo Nacional Anticorrupção, entidade independente, que será dotada dos meios necessários para exercer as suas funções de iniciativa, controlo e sanção”, afirmou, sem se comprometer com datas. Destacou, neste âmbito, que a investigação criminal tem um reforço de 14 milhões de euros face a 2021, montante distribuído pelos orçamentos da Polícia Judiciária, Procuradoria-Geral da República e Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, numa área que soma 297 milhões “a terceira maior expressão financeira do orçamento” da Justiça.
“A actividade da Polícia Judiciária usufruirá da modernização tecnológica dos sistemas de suporte à investigação criminal, perícias informáticas e investigação financeira, que inclui a renovação dos equipamentos do Laboratório de Polícia Científica e seu apetrechamento com novas tecnologias analíticas, tendo em vista melhorar a qualidade das perícias”, especificou Catarina Sarmento e Castro, que realçou que tal vai permitir fortalecer a actividade laboratorial e as perícias informáticas e tecnológicas.
A ministra aproveitou também para fazer um balanço do projecto Balcão Único do Prédio, que, em cerca de ano e meio, já foi alargado a 137 dos 152 municípios sem cadastro, possibilitando que mais de 70 mil proprietários realizassem quase 450 mil identificações das propriedades.