Portugal em 7.º lugar no ranking mundial de Liberdade de Imprensa. Assédio online tem aumentado
O país está à frente de Espanha, Reino Unido e França. A Rússia encontra-se em 155.º lugar e a Coreia do Norte em último. Desde o início do ano foram mortos 24 jornalistas, o número mais baixo desde 2000.
Portugal é o 7.º país no mundo onde existe maior liberdade de imprensa, num ranking de 180, divulgou esta terça-feira a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF). O país subiu duas posições face a 2021, sendo agora classificado como estando numa “situação boa”.
De acordo com a 20.ª edição do Relatório de Liberdade de Imprensa Mundial, a liberdade de imprensa em Portugal é “robusta”, e “os jornalistas podem divulgar informações sem restrições, embora alguns enfrentem ameaças de grupos extremistas”.
O relatório, divulgado no Dia da Liberdade de Imprensa, refere que, de forma geral, os partidos políticos respeitam o trabalho levado a cabo pelos meios de comunicação. A única excepção referida foi a campanha do partido de extrema-direita Chega, na qual os jornalistas foram ameaçados e insultados pelos seus apoiantes.
À semelhança dos restantes países mencionados no relatório, a pandemia afectou negativamente os resultados financeiros dos meios de comunicação, tendo Portugal sofrido uma “erosão significativa nas vendas de edições impressas, embora compensada por um aumento das assinaturas digitais”. Por último, a nível da segurança, no país “os jornalistas podem ser vítimas de abuso verbal e físico”.
Na 20.ª edição do relatório mundial de Liberdade de Imprensa, os RSF alteraram a forma como avaliam os países. Esta nova metodologia, explica a organização, define liberdade de imprensa como “a possibilidade efectiva dos jornalistas, enquanto indivíduos e grupos, de seleccionar, produzir e divulgar notícias e informações de interesse público, independentemente de interferências políticas, económicas, legais e sociais, e sem ameaças à sua segurança física e mental”.
Assim, agora são utilizados cinco novos indicadores: o contexto político, económico e sociocultural, o enquadramento legal, e a segurança. Por sua vez, estes são avaliados com base num inquérito quantitativo - sobre violações da liberdade de imprensa e abusos contra jornalistas e meios de comunicação - e num estudo qualitativo baseado nas respostas de centenas de peritos em liberdade de imprensa seleccionados pelos RSF (jornalistas, académicos e defensores dos direitos humanos) a um questionário com 123 perguntas.
Por isso, alerta a organização, “deve ter-se cuidado ao comparar as classificações e pontuações de 2022 com as de 2021. A recolha de dados para o Índice deste ano parou no final de Janeiro de 2022, mas as actualizações para o período de Janeiro a Março de 2022 foram efectuadas para países onde a situação mudou drasticamente (Rússia, Ucrânia e Mali)”.
Espanha, Reino Unido e França abaixo de Portugal
No ranking, Portugal supera também os países vizinhos. Espanha está em 32.º lugar, sendo que, apesar de ter caído três posições, regista um menor nível de violência contra jornalistas, graças a uma diminuição da tensão acerca da independência catalã.
O Reino Unido e França estão em 24.º e 28.º lugares, respectivamente, tendo ambos subido de lugar. Estas posições foram influenciadas pela detenção de Julian Assange, um dos acontecimentos que teve mais impacto recentemente no Reino Unido, enquanto em França os jornalistas ainda sofrem consequências do ataque ao semanário Charlie Hebdo, em 2015, que levou à necessidade de atribuir protecção policial a vários jornalistas.
No continente americano, tanto os Estados Unidos (42.º) como o Brasil (110.º) subiram no ranking. Mas no que toca aos EUA o relatório refere que, apesar da subida de posição, “existem níveis de desconfiança sem precedentes nos meios de comunicação social. A desinformação (...) criou uma atmosfera em que os cidadãos já não sabem em quem confiar”.
No Brasil verifica-se uma situação semelhante. Houve um aumento do clima de desconfiança para com os media, mas mesmo assim o país conseguiu subir uma posição face a 2021. “A retórica agressiva do governo Bolsonaro para com os jornalistas e a imprensa contribuiu para o reforço de uma atitude hostil e desconfiada para com os repórteres”, divulga o relatório. Entre 2010 e 2020, foram mortos pelo menos 30 jornalistas no país.
Em Espanha, França e ambos os países americanos, assim como na maioria dos 180, o assédio online e os ataques a jornalistas, especialmente mulheres e minorias, estão a aumentar, acrescentam os RSF. Contudo, relativamente a Portugal não há alusão a este tipo de violência.
Países nórdicos voltam a conquistar o top
Apenas 8 países estão classificados como estando numa situação “boa” a nível de liberdade de imprensa: Noruega, Dinamarca, Suécia, Estónia, Finlândia, Irlanda, Portugal e Costa Rica.
No topo do índice mantém-se o trio de países nórdicos, que “continua a servir de modelo democrático onde a liberdade de expressão floresce”, lê-se no relatório.
Na Noruega, o país com maior liberdade de imprensa, os media operam num ambiente político favorável, devidamente protegidos pela Constituição, que garante liberdade de expressão e o direito a publicar informação. No país, onde cerca de 230 meios de comunicação operam, foram relatados poucos casos de violência física.
Mas apesar do país ocupar a primeira posição, a segurança não é total. De acordo com um estudo, um em cada quatro jornalistas recebeu uma ameaça, adiantou o relatório. Além disso, “ocasionalmente os profissionais da comunicação social são assediados online”.
Em último lugar (na posição 180), está a Coreia do Norte, que desceu uma posição, e onde, actualmente, um jornalista e um trabalhador da área da comunicação estão encarcerados. A Coreia do Norte faz parte dos 28 países – um número recorde - onde a situação é classificada como “muito má”.
A Agência Central de Notícias Coreana (KCNA), porta-voz oficial do governo, é a única fonte de notícias permitida para os meios de comunicação social. O regime controla de forma rígida a produção e distribuição de informação, proíbe estritamente o jornalismo independente e controla todos os meios de comunicação social domésticos. Isto acontece apesar do 67.º artigo da Constituição do país consagrar a liberdade de imprensa.
Ucrânia e Rússia
A propósito da invasão russa da Ucrânia, o papel da comunicação social dos dois países ganhou mais relevância que nunca. A Ucrânia encontra-se em 106.º lugar, tendo descido nove posições. Mas antes da invasão, a “guerra de informação” com Moscovo já prejudicava o ambiente mediático.
Os meios de comunicação social considerados pró-Kremlin foram proibidos por decreto presidencial e o acesso aos meios de comunicação social russos foi restrito, algo que se intensificou desde o início da invasão russa. Mas antes desta, os meios de comunicação social locais e os sites de notícias foram enfraquecidos pela pandemia e por disputas territoriais. Para sobreviver, muitos recorreram à publicação de conteúdos tendenciosos e patrocinados, alimentando a desconfiança do público em relação aos media. Nos últimos anos, os meios de comunicação ucranianos têm abordado questões sociais até agora negligenciadas, mas a desigualdade de género na área ainda é um problema.
Por sua vez, o país vizinho encontra-se mais abaixo no ranking, em 155.º lugar. Na Rússia, que desceu cinco posições, “nenhum jornalista está a salvo da ameaça de acusações graves ao abrigo de leis draconianas vagamente formuladas”, afirma o relatório.
Apesar de ter acesso à internet, na Rússia quase dois terços da população recebe informação vinda principalmente da televisão, que é controlada pelo governo, e dos meios de comunicação social russos. Além disso, assuntos como a homossexualidade tornaram-se progressivamente um tema fora dos limites para os media.
Confrontados com riscos adicionais desde o início do conflito, muitos jornalistas que trabalhavam para meios de comunicação independentes viram-se obrigados a abandonar o país. Actualmente, estão presos 13 jornalistas e um trabalhador da área da comunicação.
Número de jornalistas mortos, presos, sequestrados e desaparecidos
Desde dia 1 de Janeiro de 2022 foram mortos 24 jornalistas, o número mais baixo desde 2000, e outros 59 foram presos.
No que toca aos quatro tipos de abuso que o relatório contempla (morte, prisão, sequestro e desaparecimento), a China fica em primeiro lugar, com o registo de 120 jornalistas vítimas de abusos, seguindo-se a Síria (86) e Birmânia (70), onde se registou um golpe de estado no início de 2021, que fez recuar a liberdade de imprensa dez anos.
No que toca exclusivamente a desaparecimentos destaca-se o México, com 23. Já no que diz respeito ao número de jornalistas mortos, a Ucrânia fica na primeira posição, sendo que as 7 mortes registadas ocorreram após o início da invasão, seguindo-se o México e o Haiti, ambos com 4 mortes.