Quando Eunice Muñoz abandonou o teatro e se tornou empregada de balcão

“O que sei é que nessa altura já estava muito cansada. Tinha muitos anos de profissão, apesar de ter só 23 anos”, contou numa entrevista em 2011.

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Os lisboetas faziam fila para ver a actriz que passou a ser empregada de balcão (fotografia de jornal da época) DR

Tinha 23 anos, mas muitos anos de profissão e sentiu que precisava de parar. Foi a primeira das várias pausas que Eunice Muñoz fez ao longo da sua longa carreira: aos cinco anos já subia ao palco do teatro desmontável e ambulante dos pais. Quando resolveu deixar o teatro foi trabalhar para uma loja no Príncipe Real, onde se tornou ela própria atracção turística.

“O que sei é que nessa altura já estava muito cansada. Tinha muitos anos de profissão, apesar de ter só 23 anos. Já era profissional há dez anos, já tinha protagonizado peças. Resolvi deixar o teatro e fui trabalhar para um balcão de uma loja”, recordou numa entrevista ao PÚBLICO em 2011, realizada por Tiago Bartolomeu Costa.

Já casada, e com uma filha, foi ganhar “800 escudos ou um conto de réis” na casa das cortiças e as pessoas faziam fila para a ver ao balcão.

O patrão, Mr. Cork, sabia quem ela era e “achava muita graça”. “Achava que era um disparate, queria sempre convencer-me a não fazer nada.”

Não chegou a estar um ano ao balcão, depois foi para a fábrica Celcat, onde secretariou o director técnico e conheceu o segundo marido, com quem teve três filhos. Esteve quatro anos na Celcat, até que Vasco Morgado a convenceu a regressar para fazer a Joana d'Arc, de Jean Anouilh.

Eunice Muñoz, em 1989, aos 60 anos DR/PÚBLICO
Eunice e o seu irmão Hernâni, aqui numa fotografia de 1932, integravam as peças do teatro itinerante dos seus pais. Foi aí que começou o seu percurso de actriz. No fim dos espectáculos, contou em várias entrevistas, gostava de se sentar a contar o dinheiro reunido na noite
As Troianas, em 1996 LUÍSA FERREIRA
Em 1997, com o actor João Grosso no Teatro Nacional D. Maria II BRUNO RASCãO
Madame, no TNSJ, no Porto, com Eva Wilma, em 2000 Paulo Ricca
Em 2004, no Porto, num debate com Fernanda Montenegro MARCO MAURÍCIO
No festival literário Escritaria, em 2014 Nelson Garrido
Em entrevista ao PÚBLICO, em 2011 RUI GAUDêNCIO
O Ano do Pensamento Mágico, em 2009 DANIEL ROCHA
A Dúvida, no Teatro Maria Matos, 2007 JOANA BOURGARD
Eunice Muñoz, em entrevista ao PÚBLICO, em Maio de 2021 teresa pacheco miranda
Nos bastidores da peca A Margem do Tempo, no Auditório Municipal Eunice Muñoz, em Oeiras Paulo Pimenta
Em Setembro de 2021, Eunice Muñoz recebeu o PÚBLICO em sua casa, partilhando um pouco da sua intimidade com o fotojornalista Paulo Pimenta Paulo Pimenta
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Eunice Muñoz, em 1989, aos 60 anos DR/PÚBLICO

Mas parar não foi um capricho, dizia. “Era o interesse de conhecer outras pessoas, outro mundo, outras profissões, outros sonhos. Ali tinha o operariado e tinha os desenhadores. E foi muito bom conhecê-los, saber e sentir quais eram os interesses deles.”

Quanto ao dinheiro, conta que a sua atitude não mudou. “É engraçado... Quando estava a fazer cinema, ou teatro, recebia o meu dinheiro, punha-o na gaveta da cómoda do meu quarto e pronto. Não estava ali presa a nada. E a minha mãe dizia-me: ‘Pois, pois, pois. É porque estás a ganhar muito bem. Um dia estás a ganhar pouco, e vais ver.’ E eu achei muita graça, porque, quando estava a ganhar 800 escudos ou um conto de réis no balcão da casa das cortiças, tratava o dinheiro da mesma maneira.”

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