Ucraniana com contrato de gestação de substituição dá à luz no Hospital de São João

Contrato assinado com qualquer agência ucraniana para gestação de substituição não é válido em Portugal, mas Ministério dos Negócios Estrangeiros já disse que ia criar regime de excepção.

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Nelson Garrido

O esperado começa a acontecer. Uma cidadã de nacionalidade ucraniana deu à luz na madrugada desta quinta-feira, num contexto de gestação de substituição, no Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ).

Se o bebé tivesse nascido na Ucrânia, a mãe renunciaria logo a seguir ao parto e o casal de portugueses iria registá-lo à embaixada. Em Portugal, um bebé que assim nasce é filho da puérpera.

O assessor de imprensa do CHUSJ lançou um comunicado pela manhã a anunciar que a menina nasceu durante a noite, precisamente às 02h53, com 2,975 quilos e 47 centímetros. E que quer a parturiente, quer a criança se encontram “bem, sem complicações a registar”.

Nessa nota, o assessor de imprensa adianta que “a cidadã ucraniana chegou a Portugal há cerca de duas semanas, tendo tido consultas de acompanhamento em obstetrícia”. E que “todas as questões legais e jurídicas foram acauteladas”.

As questões legais são bastante relevantes. Na Ucrânia, a gestação de substituição pode ser um serviço pago (entre 15 a 20 mil euros mais custos relacionados com o processo) e um número indeterminado de casais portugueses fizeram-no, recorrendo a agências de intermediação. Em Portugal, tal procedimento é ilegal.

A tentativa de criar um regime jurídico arrasta-se há anos. A lei nacional sobre gestação de substituição foi aprovada pela primeira vez em 2016, mas, na sequência de um pedido de revisão feito pelo CDS e por alguns deputados do PSD, o Tribunal Constitucional chumbou algumas normas. Acabou por passar em 2021, antes da dissolução da Assembleia da República, mas continua por regulamentar. E prevê apenas a gestação de substituição sem contrapartida financeira, mediante um contrato supervisionado pelo Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida.

O CHUSJ escusa-se a explicar que medidas tomou para acautelar a validade de uma situação que assenta num contrato assinado na Ucrânia para um nascimento que teria ocorrido naquele território se, entretanto, a guerra não tivesse começado. Nem sequer diz se envolveu o Ministério dos Negócios Estrangeiros, que, a propósito da inevitabilidade de situações como esta, já antes tinha declarado ao Expresso que estava a pensar “numa solução excepcional”.

No início da guerra, haveria uma trintena de casais heterossexuais portugueses envolvidos em processos deste tipo. Uns na Ucrânia, já com recém-nascidos. Outros ainda a esperar ao longe pelo desenrolar de uma gravidez de uma mulher com não não manteriam contacto, se não fosse o conflito.

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