“Presidente do Conselho Europeu pode pela primeira vez vir a ser um português”

Luís Amado não ficou surpreendido com a passagem dos Assuntos Europeus para a tutela de António Costa e admite que socialista suceda a Charles Michel pois o grande objectivo que era ganhar a maioria absoluta para o PS está cumprido

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Luís Amado foi ministro da Defesa e dos Negócios Estrangeiros Rui Gaudêncio

Pela primeira vez, este Governo retira a pasta dos Assuntos Europeus ao ministro dos Negócios Estrangeiros e coloca-a na tutela directa do primeiro-ministro. Ficou surpreendido?

Não fiquei. Essa questão não é nova. É uma questão recorrente quando se formam governos. Eu já vi essa possibilidade aberta, pelo menos, três vezes no passado.

Mas nunca foi em frente.

Não era público, nunca se concretizou, mas foi colocada. Quem forma o governo é o primeiro-ministro, que tem toda a responsabilidade, autoridade e poder para formar o governo que entende. Se me pergunta se concordo, não tenho que concordar. Eu, seguramente, enquanto fui ministro dos Negócios Estrangeiros, não favorecia essa desarticulação, mas eu não era primeiro-ministro, era ministro dos Negócios Estrangeiros e defendia uma integração das funções e das competências do ministério na sua plenitude.

Esvazia o papel do ministro?

Não necessariamente. Depende, não faço ideia como pretende articular essas responsabilidades. Em tudo o que tem a ver com a crise da Ucrânia, é óbvio que as competências têm que ser permanentemente equacionadas na base da política europeia.

Gostava de ver António Costa num cargo europeu?

É da vontade dele. Eu acho que ele faria bem qualquer cargo a nível europeu. Não tenho nenhuma dúvida sobre isso. É um político competente, respeitado, com autoridade nacional inequívoca, sobretudo depois da maioria absoluta, mas isso depende da ponderação que há-de fazer mais à frente, dos interesses do país e da sua perspectiva de carreira.

Também depende dos cargos que possam estar disponíveis. O cargo de Charles Michel [presidente do Conselho Europeu] caberia no perfil de António Costa?

Em abstracto, não tenho dúvida nenhuma que, hoje, com a autoridade que tem no Conselho [Europeu] e com a visibilidade internacional que tem tido com a experiência que adquiriu ao longo destes anos, seria um presidente do Conselho, tanto mais que os ventos estão a mudar um pouco na relação de forças a nível das famílias políticas europeias. Não tenho nenhuma dificuldade em perceber que, de facto, essa função é uma função que pode, pela primeira vez, vir a ser desempenhada por um português.

Mas nesse caso saindo do governo a meio da legislatura, em 2024.

Essa é uma área da competência do primeiro-ministro. Tem todo o direito de tomar as decisões que toma no âmbito daquilo que são as suas responsabilidades e as suas competências.

Sair com maioria absoluta é diferente da situação [de saída do Governo em 2004] de Durão Barroso? Seria mais fácil sair depois de ter conseguido maioria absoluta?

Sem dúvida que um dos atributos da sua gestão durante todo este tempo foi garantir a estabilidade política e a estabilidade governativa do país. Isso é reconhecido internacionalmente.

Que avaliação faz dos mandatos de Marcelo Rebelo de Sousa?

Faço uma avaliação positiva. Eu até aceitei publicamente apoiar a sua recandidatura. O país identifica-se muito com a gestão extrovertida que o Presidente tem colocado e que dessacraliza um pouco a função pública no actual contexto. Isso foi positivo. Exagera eventualmente um pouco nos comentários, aqui e ali, mas, no conjunto da sua acção, o povo português identifica-se com o magistério que tem garantido não só estabilidade, mas alguma afectividade nas relações entre o mundo da política e o mundo da sociedade.

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