Plano estratégico para os resíduos urbanos, uma oportunidade (quase) perdida
O Persu é omisso em aspetos primordiais como a recolha dos resíduos que é a base para a obtenção das metas previstas em directivas europeias.
No passado mês de março foi colocado em consulta pública o Plano Estratégico para os Resíduos Urbanos 2030 (Persu 2030). Este plano, pautado pelas diretivas europeias transpostas para a legislação nacional, ao mesmo tempo que coloca a prevenção como princípio prioritário, preconiza um incremento da recolha seletiva com vista ao aumento da qualidade dos resíduos recuperados, e estabelece um vasto conjunto de ações a serem implementadas pelos Sistemas de Gestão de Resíduos Urbanos (SGRU).
A preocupação de atingir as metas estabelecidas nas diretivas acaba, contudo, por distanciar o plano da realidade, ao estabelecer pressupostos que esquecem o historial de produção de resíduos e as eficiências dos sistemas de tratamento, ao mesmo tempo que define prazos para cumprimento de metas impossíveis de alcançar.
A questão de fundo que se coloca na sua leitura é se devem ser propostas ações para resolver os problemas atuais com base nos números atuais, ou se devem ser propostas ações para os números que gostaríamos de ter?
A optar-se por esta segunda via como foi a opção do Persu 2030, a desfasagem com a realidade levará a que as soluções propostas não atinjam as metas estabelecidas, levando a descargas em aterro que ultrapassarão o limite de 10% e à ausência de soluções para a fração resto.
As ações preconizadas no PERSU 2030 não assentam numa análise crítica que tente compreender as razões de não se terem alcançado as metas estabelecidas nos planos anteriores, pelo que se teme que este seja mais um plano em que os resultados estarão longe dos objetivos.
O plano é omisso em aspetos primordiais como a recolha dos resíduos que é a base para a obtenção das metas. Os diversos métodos de recolha de indiferenciados e seletivos, os métodos tarifários associados, a utilização de contentor dedicado para os biorresíduos ou a utilização de sacos óticos não foram discutidos, merecendo ser objeto de aprofundamento.
A interligação entre as entidades que fazem a recolha (Sistemas “em baixa“) e os Sistemas que fazem o tratamento/valorização (Sistemas “em alta” ) que é essencial para definir o método de recolha e os locais de encaminhamento dos Indiferenciados e dos seletivos, não foi abordada, tal como a necessária intervenção das empresas privadas .
No que respeita a financiamentos, não foram considerados quaisquer montantes para a recolha. Quanto ao tratamento, foram avançados montantes significativos para a valorização de multimaterial, de ecocentros e de biorresíduos, que poderão revelar-se excessivos se as taxas de captura e de tratamento não forem tão altas como as preconizadas. Pelo contrário, para aterros e centrais de valorização energética (CVE) não foram considerados quaisquer investimentos, o que se considera merecer imediata revisão. Os aterros existentes não têm capacidade para mais de quatro anos à taxa atual de deposição e só a valorização energética de resíduos poderá garantir uma descarga em aterro inferior a 10%.
Sugere-se que numa nova versão do PERSU 2030 sejam revistas as taxas de captura e de eficiência de tratamento, que se admita um menor crescimento da produção, mas não valores de produção inferiores aos atuais, e que se avancem com soluções de tratamento que não excluam as CVE, à semelhança dos países europeus que já hoje cumprem a meta de descarga em aterro.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico