Oncologia e cardiologia: Portugal precisa de intervenção psicológica no tabagismo!

Em média morrem 79 pessoas por dia com cancro em Portugal. O cancro de pulmão é o que mais vítimas causa. Já a doença coronária aguda afeta cerca de 10 mil pessoas, por ano, no país.

Em fevereiro, mais precisamente no dia 4 e neste dia 14, “comemora-se” a luta contra duas das patologias que mais matam nos dias de hoje: respetivamente, a doença oncológica e as doenças cardiovasculares.

Embora a pandemia de covid-19, por vezes, nos faça esquecer disso, estas doenças não desapareceram nos últimos anos e continuam a matar. Quando não o fazem, associam-se a elevada morbilidade, causando um impacto significativo na saúde e qualidade de vida dos indivíduos e suas famílias, assim como na economia do país. Este risco é ainda maior considerando todas as medidas de contingência impostas pela pandemia e que, compreensivelmente, implicaram uma reorganização dos esforços do SNS no seu combate. Tal levou a uma diminuição dos rastreios e prevenção destas doenças, com consequente aumento dos casos de maior gravidade, cuja prevalência está ainda longe de ser contabilizada.

Por este motivo, apesar de ser comum utilizarmos a palavra “celebrar” quando nos referimos a dias comemorativos, esta palavra está longe de ser adequada quando pensamos no sofrimento físico e mental associado a estas patologias que retiram a vida a milhares de pessoas todos os anos. Apenas para dar exemplo de alguns números que nos devem fazer pensar, todos os dias morrem em Portugal pelo menos 79 pessoas com cancro. Dos diferentes tipos de cancro existentes, o cancro de pulmão é o que mais vítimas causa, tendo morrido, em 2020, 1,8 milhões de pessoas em todo o mundo. Já a doença coronária aguda afeta cerca de 10 mil pessoas, por ano, em Portugal. Em ambos os casos, o consumo de tabaco tem sido associado ao aumento do risco de desenvolvimento destas patologias, estando associado ao desenvolvimento de 82% dos cancros de pulmão e explicando cerca de 20% das mortes por doença coronária. Sendo esta uma causa evitável de mortes, importa o planeamento e, principalmente, a implementação de políticas de saúde pública que sejam eficazes, relevantes socialmente e apoiadas economicamente.

Esta é uma das áreas em que o saber científico é um aliado dos grandes problemas sociais, podendo ser utilizado como orientador das ações efetivas a desenvolver. A este nível, como em tantos outros domínios em que, nos últimos anos, passamos a valorizar o cuidado da nossa saúde mental, a Psicologia, como ciência, torna-se imprescindível para a correta avaliação dos hábitos tabágicos e seus fatores determinantes e para o desenvolvimento de medidas de intervenção promocional, preventiva e remediativa na cessação tabágica.

A prática psicológica pressupõe, invariavelmente, a promoção do desenvolvimento do indivíduo, incluindo a promoção do seu bem-estar psicológico e físico. Ter o conhecimento, no âmbito da prática clínica, de que o um dado indivíduo é fumador e não planear ou orientar para uma intervenção adequada destinada à cessação tabágica, é incorrer num comportamento que viola os princípios éticos da prática dos profissionais de saúde em geral, e dos psicólogos, em particular, que advogam que “os/as psicólogos/as devem ajudar o seu cliente a promover e a proteger os seus legítimos interesses” e “não devem intervir de modo a prejudicá-lo ou a causar-lhe qualquer tipo de dano, quer por ações, quer por omissão”. Na consecução deste objetivo, a formação profissional centrada nos hábitos tabágicos dos próprios profissionais de saúde, seu impacto ao nível das práticas clínicas e no estudo e implementação de programas de intervenção empiricamente validados ao nível da cessação tabágica, torna-se essencial.

Um das muitas ações a serem desenvolvidas no sentido de contribuir para a diminuição significativa de uma das principais causas das doenças oncológicas e cardiovasculares é o estudo transcultural destinado a avaliar o consumo de tabaco em profissionais de Psicologia e a sua relação com a formação, atitudes, conhecimento e práticas na área da cessação tabágica (mais informações através do e-mail psy.smoke@upt.pt e em https://eusinto.me/profissionais-de-saude-e-saude-psicologica/investigacao-em-saude-psicologica/), o qual resulta de uma parceria entre a Universidade Portucalense, em Portugal, e a Unidade de Controlo de Tabaco do Instituto Catalão de Oncologia e a Universidad Oberta de Catalunya, em Espanha, contando também com o apoio da Ordem dos Psicólogos Portugueses e do Consejo General de la Psicología de España.

Esperamos que esta seja uma das muitas ações em desenvolvimento nos próximos anos para que os dias 4 e 14 de fevereiro passem a ser verdadeiramente dias comemorativos e representativos do combate efetivo ao controlo destas doenças que flagelam a nossa sociedade.

As autoras escrevem segundo o novo acordo ortográfico

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