“Este ano, um milhão de crianças no Afeganistão morrerão de desnutrição aguda grave”
Unicef alerta que 98% da população afegã está desnutrida e 9 milhões de pessoas estão “à beira da fome”. O país “está a aproximar-se de uma catástrofe” e “a fome poderá matar mais pessoas do que décadas de guerra”.
Quase toda a população afegã, 98%, não tem o suficiente para comer e 9 milhões de pessoas estão “desesperadas, à beira da fome”, alertou esta terça-feira o porta-voz da Unicef de Itália, Andrea Lacomini. Entre os afegãos mais vulneráveis estão naturalmente as crianças, com 3,9 milhões a sofrerem de desnutrição grave.
Para além disto, “mais de 13 milhões de crianças precisam desesperadamente de ajuda, um aumento de 3,4 milhões num só ano”, acrescentou Lacomini. “Este ano, um milhão de crianças no Afeganistão morrerão de desnutrição aguda grave. As camas hospitalares estão sobrelotadas. Há pais sem trabalho, face a uma economia de rastos e com filhos famintos”, sublinhou este responsável. É por isso, diz, que “muitas famílias que não têm dinheiro para alimentar os filhos” ficam tão desesperadas que “vendem os mais pequenos, [registando-se um] aumento do trabalho infantil e dos casamentos precoces”.
Esta é “uma das crises mais graves da história”, com “uma duplicação dos casos de desnutrição aguda grave e isto é apenas o começo”, notou o responsável, num comunicado. “Em muitas áreas, os funcionários dos hospitais não são pagos e não têm equipamentos nem medicamentos essenciais”, adiantou.
“O mundo não pode ficar de braços cruzados quando no Afeganistão há 9 milhões de pessoas desesperadas, à beira da fome”, disse Lacomini. A ONU, insiste, avisa que o país “está a aproximar-se de uma catástrofe” e que “a fome poderá matar mais pessoas do que décadas de guerra”.
A situação é bem conhecida por Muhajira Amanallah que, todas as manhãs, bem cedo, enfrenta o frio intenso para caminhar até uma pequena padaria em Cabul, onde afegãos recebem pão para matar a fome.
Para a sua família e para os outros que fazem fila em frente à loja e ao modesto forno, a ementa do dia limita-se, muitas vezes, a estes poucos pedaços de “naan”, um pão achatado fino típico da Ásia central e do sul.
“Se eu não trouxer pão daqui, vamos dormir sem comer”, explicou Amanallah citada pela agência francesa de notícias AFP. Com dois filhos e um marido viciado em drogas ao seu cuidado, Amanallah confessa que já pensou “em vender as filhas”, mas diz que desistiu e decidiu “confiar em Alá”.
Esta distribuição de pão, lançada no sábado em Cabul, faz parte de uma campanha organizada por um professor universitário da cidade, sob o lema “Salvem os afegãos da fome”.
A situação humanitária no Afeganistão tornou-se dramática desde o regresso ao poder dos taliban, em Agosto passado, e consequente suspensão da ajuda internacional que financiava quase 80% do orçamento do país. O desemprego disparou e muitos funcionários públicos não recebem salários há meses.