Exibidores e cineclubes pedem fim de teste obrigatório para ir ao cinema
Os subscritores do apelo ao Governo lembram que o cinema “sofreu enormes quebras de afluência” com a obrigatoriedade de apresentação de um comprovativo de teste laboratorial ou autoteste com supervisão.
Cerca de 40 exibidores, cineclubes, festivais e associações apelaram esta quarta-feira ao Governo para que acabe com a obrigatoriedade de teste à covid-19 nas idas ao cinema, defendendo que as salas têm “baixíssimas probabilidades de infecção”.
Num comunicado intitulado “Pelo direito à cultura cinematográfica”, os cerca de 40 subscritores lamentam a falta de coerência na comunicação das medidas de contenção da covid-19 e falam em “excesso de zelo” na obrigatoriedade de apresentação de um teste negativo para aceder a uma sala de cinema.
Para os exibidores, cineclubes, festivais e associações, as salas de cinema são “espaços seguros com baixíssimas probabilidades de infecção” e “a generalidade dos exibidores está disponível para reduzir a lotação das salas”.
“As pessoas não estão motivadas para fazer um teste para ir ao cinema”, disse ao PÚBLICO Tiago Santos, do festival Caminhos do Cinema Português, em Coimbra, que é um dos subscritores deste manifesto. E ilustra com um exemplo recente. Depois de a DGS ter vindo esclarecer, na madrugada de 29 de Dezembro, que era mesmo preciso apresentar um teste negativo para entrar num cinema, não bastando o certificado digital de vacinação, a Casa do Cinema de Coimbra tinha agendada para essa mesma noite a estreia de um documentário sobre a banda brasileira Secos & Molhados. “As pessoas não traziam testes consigo, nem estavam dispostas a fazê-los no local, e voltaram para casa”, conta Tiago Santos.
Lembrando que é hoje muito fácil ver cinema de qualidade em casa, defende que “o que a sala de cinema pode dar é escala, mas também comunidade e socialização, num contexto em que estamos todos cada vez mais individualistas”. E lamenta que estas restrições estejam a empurrar o público para o sofá de casa, quando “vários estudos europeus, de institutos de investigação isentos e sem quaisquer interesses comerciais no sector” vêm demonstrando que “a sala de cinema, pela colocação dos espectadores, pelo uso obrigatório de máscara durante as sessões, pela tecnologia de renovação do ar, é um sítio improvável para se ser infectado”. Conclusão que Tiago Santos vê empiricamente reforçada no facto de, “até ao momento, a imprensa não ter noticiado qualquer surto de covid-19 com origem num recinto cinematográfico”.
Se acham que a obrigatoriedade de apresentação de um comprovativo de teste laboratorial ou autoteste com supervisão torna insustentável a exibição de cinema em sala, e originou já enormes quebras de afluência, os subscritores deste apelo defendem ainda que se trata de uma medida discricionária face a “outras actividades do quotidiano”, como o uso de transportes públicos e o acesso à restauração ou ao comércio.
O apelo é assinado por vários cineclubes (Faro, Barcelos, Guimarães, Alvalade, Joane, Tavira), por salas independentes, como o Cinema Ideal e o Cinema Trindade, pelos exibidores Algarcine Cinemas e Cinemas Cinebox, pela Agência da Curta Metragem, por associações como a Apordoc, Filhos de Lumière e Ao Norte, por festivais de cinema, como IndieLisboa, Fantasporto e Queer, e pela produtora Ukbar Filmes.
A eles junta-se ainda, a título individual, o administrador da Nos Cinemas Luís Mota e também a Academia Portuguesa de Cinema e a Fevip – Associação Portuguesa de Defesa de Obras Audiovisuais.
A exigência de teste em eventos culturais, incluindo exibição de cinema, foi aprovada na reunião do Conselho de Ministros de 23 de Dezembro, em que foram alteradas as medidas no âmbito da situação de calamidade, introduzindo um conjunto de novas restrições.
Na semana seguinte, a 28 de Dezembro, a Direcção-Geral da Saúde (DGS) actualizou as orientações sobre eventos de grande dimensão e eventos de natureza cultural, dizendo que o acesso a eventos culturais poderia ser feito com teste negativo ou com certificado digital de vacinação.
No dia seguinte, a DGS acabou por admitir que tinha havido um “lapso” e esclareceu que se mantinha a exigência de comprovativo de teste à covid-19 para acesso a eventos culturais, ou a realização de autoteste.
Depois, ainda há a questão das datas em que vigora esta exigência. A decisão do Conselho de Ministros refere que é até 9 de Janeiro e aquele esclarecimento da DGS indica um prazo até 2 de Janeiro. A Fevip e a Associação Portuguesa de Empresas Cinematográficas, num comunicado conjunto divulgado esta quarta-feira de manhã, alertam que até 9 de Janeiro está excluída a possibilidade de autoteste no acesso às salas.
“A forma como as medidas são comunicadas aos cidadãos e aos promotores cinematográficos tem lançado a confusão generalizada, impossibilitando a boa preparação das actividades e sobretudo afastado os públicos das salas de cinema”, sublinham os subscritores do manifesto.
O apelo dos subscritores é dirigido também ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ao conselho directivo do Instituto do Cinema e Audiovisual e à directora-geral da Saúde, Graça Freitas.