Matos Fernandes e o fim do carvão: “Vamos criar muito emprego com as renováveis”
O ministro do Ambiente assegura “toda a protecção social” aos cerca de 150 trabalhadores da central termoeléctrica do Pego, em Abrantes.
O fim da produção de electricidade a partir do carvão em Portugal é “muito boa notícia” e não há outra forma de olhar para o encerramento da central termoeléctrica do Pego, em Abrantes. Quem o diz é o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, que promete “apoio social” à transição energética na região do Médio Tejo e anuncia que, até 30 de Novembro, será publicado um aviso para o financiamento de novos projectos nas energias alternativas. “Vamos criar muito emprego nas energias renováveis”, afiança.
Em entrevista neste domingo à RTP, o governante assegurou “toda a protecção social” aos cerca de 150 trabalhadores daquela central termoeléctrica, contrariou a ideia de que o país passa estar mais dependente do exterior em termos de electricidade e garantiu que a factura da luz vai baixar para os portugueses em 2022.
“Hoje é de facto um dia muito relevante”, começou por dizer Matos Fernandes, aludindo à notícia de que sábado, 20 de Novembro, foi o primeiro dia sem produção de electricidade com base no carvão. Lembrando “algum desencanto” que sentia há dias pela falta de um acordo global para o fim do carvão por parte dos países que participaram na COP 26, o governante realçou que “Portugal já acabou” com esse recurso no Pego, que custava 100 milhões ao país, por ano.
“Isto só era possível porque os portugueses pagavam 100 milhões de euros. Ora, 60% do consumo eléctrico já vem das renováveis e os restantes 40% são gás e biomassa”, descreveu. Lembrou depois que a meta nacional é que estes 60% sejam “80% em 2030”, mostrando-se convencido que esse objectivo até vai ser alcançado antes, provavelmente em 2025.
O ministro referiu-se depois à questão do futuro daqueles 150 trabalhadores do Pego, prometendo que “vai mesmo correr bem”, entre duas “bicadas” críticas à Galp pela forma como a petrolífera anunciou o encerramento da refinaria de Matosinhos, a quatro dias do Natal de 2020.
“Temos de cuidar destes trabalhadores e de projectos alternativos para aquela zona”, prosseguiu, anunciando que na terça-feira vai ter uma reunião com sindicatos. “Não vai haver um problema social porque soubemos [do encerramento do Pego] com tempo”, ao contrário do que, segundo o ministro deixa implícito, sucedeu no caso da refinaria nortenha da Galp.
“Isto vai mesmo correr bem em três dimensões: no apoio social, seja através do pagamento de salários seja através da formação profissional; em segundo lugar porque existe um concurso para aquele; e em terceiro porque embora esta via possa demorar mais um ou dois anos, o Fundo de Transição Justa (FTJ) paga e financia, de forma generosa em comparação com os fundos comunitários, novos projectos, não só no domínio das energias alternativas mas também.”
“Não estimo que haja um problema de desemprego de uma noite para a manhã”
Quanto à situação dos trabalhadores, Matos Fernandes argumenta que “as pessoas ainda não foram despedidas”. Lembrou aliás que a Tejo Energia, que explorava o Pego, “é concorrente” no concurso lançado em Setembro e destacou que é factor preferencial na escolha do vencedor desse concurso o número de postos de trabalho a manter.
“Não estimo que haja um problema de desemprego de uma noite para a manhã”, insistiu o ministro, numa nova alusão implícita ao que se passou com a refinaria da Galp. “Se existir, cá estamos para assegurar que não vai haver problema.”
Segundo o ministro, “mais importante para o sistema energético do que a central é aquele ponto de ligação”. O Pego representava uma potência de 628 megawatts. O concurso que decorre com apresentação de propostas até 17 de Janeiro de 2022 pretende aproveitar esse “importante ponto de ligação” para a rede e “há condições para haver magníficas propostas”, anotou.
Mas antes da abertura dessas propostas haverá mais novidades: até 30 de Novembro, como se referiu, será publicado um aviso para financiamento de novos projectos no domínio das renováveis. Solicitado a esclarecer que projectos estão na calha, Matos Fernandes deixou referências genéricas: “fabricação de veículos eléctricos, produção hidrogénio verde, electrolisadores, pequenos camiões eléctricos. “São vários os que existem, já há ali um cluster e um ponto de ligação da rede, são para todos municípios do Médio Tejo, por serem os da transição justa e que vão naturalmente atrair mais projectos.”
As renováveis criaram até agora 9000 postos de trabalho em Portugal, prosseguiu Matos Fernandes na entrevista à RTP, dos quais um terço dizem respeito ao cluster eólico de Viana do Castelo. A conclusão do governante é que as renováveis são “altamente criadoras de emprego” e o mesmo irá suceder nas regiões afectadas pela transição para uma produção com menos carbono, e nas quais se devem incluir o Norte/Matosinhos e o Alentejo Litoral, onde no início de 2021 foi encerrada a central a carvão da EDP em Sines.
Quanto aos 15o funcionários que, a partir de 30 de Novembro, podem enfrentar o desemprego, Matos Fernandes prometeu assegurar “todas as condições para a transição destes trabalhadores”. “Para já, são trabalhadores de um patrão responsável que continuará a pagar salários e tem tido um comportamento normal, não anunciou na véspera como aconteceu na Galp em Matosinhos. Estamos aqui como substituto, caso isso não venha a acontecer, mas estamos sinceramente convencidos que dentro de um ano em alguns destes projectos de menor dimensão e, sobretudo, neste novo projecto de energia renovável naquele local já estarão a ser gerados postos de trabalho. Os trabalhadores querem um salário e querem ter trabalho. Têm todo o direito e vão tê-lo.”
A terminar, Matos Fernandes recusou a ideia de que o fim da produção eléctrica com base no carvão em Portugal, sendo caso único nesta altura na Europa, onde a maioria dos países mantém o recurso àquele combustível fóssil, signifique uma maior dependência externa.
“[Portugal] Não fica mais dependente do exterior. Temos centrais de ciclo combinado a gás, que espero que não durem 20 anos, não estou aqui para enganar ninguém, que produzem electricidade necessária”, destacou, reforçando a aposta no “crescimento da energia solar. A energia renovável predominante vem das barragens e do vento, “o solar ainda tem uma quota pequenina”, reconheceu o ministro. Portugal “produz menos do que a Bélgica ou a Inglaterra”, mas o país vai dar um salto, promete. A produção solar “era 1 GW quando cheguei a ministro, agora são dois e chegará a oito ou nove GW dentro de três ou quatro anos”.
Na ponta final desta intervenção, o ministro insistiu que se trata de uma “muito boa notícia” em termos macroeconómicos, até porque este encerramento dará origem a “muitos outros projectos” nas renováveis, o que se repercutirá de forma positiva na factura.
“Quanto mais renovável consumirmos, mais baixo o preço da electricidade. Sabendo nós que o preço da produção eléctrica chegou a quadruplicar, o preço da electricidade no próximo ano vai baixar para os portugueses.”