A história não contada do funaná
Em Funaná, Raça e Masculinidade encontramos, profundamente detalhada, a história de um género musical, o funaná. Não só: através dela, Rui Cidra conduz-nos pelo percurso de um país, Cabo Verde, da colonização à independência, daí seguindo até à sua diáspora. Só assim podemos compreender verdadeiramente esta “música do diabo” que é marca de identidade, som de libertação.
Tudo nasceu de uma pergunta lançada por Rui Cidra. Estávamos nos anos 1990 e Cesária Évora tornava-se estrela global, levando a música de Cabo Verde, em particular a morna, aos quatro cantos do mundo. Fê-lo a partir de Paris e foi isso que levou este antropólogo e investigador na Faculdade de Ciência Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa a questionar-se. “Porque é que um projecto que envolvia músicos que viviam em Portugal não se divulgou a partir de Portugal?”. Quando fez a sua primeira viagem a Cabo Verde, em 2003, partiu em busca dos músicos e da música, a morna e as coladeiras, que tinham posto o país no mapa musical mundial. Acontece que se dá então um encontro decisivo. Dju di Mana, líder dos Rabenta, tocador de gaita, o acordeão diatónico que, com o acompanhamento rítmico do fero (um ferro raspado e percutido com faca), é a base do funaná, propôs levá-lo ao interior da Ilha de Santiago e dar-lhe a conhecer a expressão musical nascida no seio das comunidades criadas por escravos fugidos do trabalho colonial, a realidade do batuko praticado pelas mulheres nos terreiros, a história dos “badiu” que percorriam as localidades para montar o baile noite após noite. “Uma história mais invisível, mais marginal, que não era contada em narrativas nacionais em torno da cultura e da música em Cabo Verde”, como diz Rui Cidra ao Ípsilon. “Foi esse também o meu interesse. Escrever sobre uma história que não estava contada”.
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