Activistas alemães fingiram distribuir panfletos eleitorais de partido de extrema-direita

Pelo menos um milhão de panfletos do partido nacionalista Alternativa para a Alemanha (AfD) não chegaram às mãos dos eleitores. Colectivo de arte Center for Political Beauty criou empresa de distribuição falsa para desviar os folhetos antes das eleições.

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O partido nacionalista Alternativa para a Alemanha (AfD) defende uma retórica anti-imigração ANNEGRET HILSE/Reuters

Activistas alemães fingiram ter uma empresa de distribuição e conseguiram estabelecer um acordo com o partido nacionalista Alternativa para a Alemanha (AfD) para distribuir milhões de panfletos eleitorais. Mas, dois dias antes de as urnas abrirem na Alemanha, uma grande parte dos panfletos foi devolvida e entregue nos escritórios do partido.

“Confiável, pontual e barato”: foi assim que a suposta empresa de distribuição, chamada Flyerservice Hahn, promoveu o seu serviço de entregas junto da AfD, que a encarregou de distribuir camiões de panfletos antes das eleições. Segundo o jornal The Washington Post, o website da empresa parecia tão real quanto o perfil no LinkedIn do seu suposto director. Os panfletos eleitorais acabaram por não chegar às mãos dos eleitores e as pilhas foram devolvidas ao remetente.

Os activistas que organizaram o esquema revelaram a sua identidade, protestando contra as políticas de extrema-direita defendidas pelo partido. O colectivo de arte com sede em Berlim, intitulado Center for Political Beauty (“Centro para a Beleza Política”, numa tradução livre), tem na mira políticos que alimentam a retórica contra os refugiados ou desvalorizam o Holocausto e assumiu, na terça-feira, que se fez passar por um serviço de entregas e que entrou em contacto com a AfD com vista a uma colaboração.

A empresa falsa — que os activistas agora descrevem como “o líder do mercado mundial na não-distribuição de panfletos nazis” — recebeu encomendas “no valor de milhões” para distribuir os folhetos e recolheu aquilo que diz ser “72 toneladas de lixo da AfD”.

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Center for Political Beauty/YOUTUBE

O partido conseguiu eleger deputados para o Parlamento alemão (Bundestag) pela primeira vez há quatro anos, defendendo uma retórica anti-imigração e com o apoio dos nacionalistas que criticaram a decisão de Merkel, em 2015, de abrir as fronteiras a mais de um milhão de refugiados, entre os quais sírios, iraquianos e afegãos. Na campanha para as eleições federais de 26 de Setembro, o partido prometeu lutar contra as regras impostas para travar a pandemia da covid-19.

Um porta-voz da AfD disse à agência de notícias alemã Deutsche Presse-Agentur que não foi ainda averiguado o prejuízo total, mas o partido revelou que pelo menos um milhão de panfletos não chegaram às mãos dos eleitores. Já o colectivo Center for Political Beauty fala em cinco milhões de panfletos desviados.

Ao jornal The Washington Post, um representante da AfD confirmou que o partido vai apresentar uma queixa criminal às autoridades. “Na verdade, não se pode falar em ‘acção artística’”, disse.

Dias antes das eleições, o partido classificou o esquema como uma “operação fraudulenta”. “Os panfletos agora são inúteis para a nossa campanha”, disse o membro da direcção do partido Tino Chrupalla, em comunicado citado pela agência Reuters. “Este era precisamente o objectivo daqueles por trás desta operação. Eles estão a tentar prejudicar intencionalmente a AfD nas eleições”, acrescentou.

Perante uma possível batalha legal com a AfD, os activistas já conseguiram angariar 100 mil euros através de uma campanha de crowdfunding. Os fundos, garantem, servirão para ajudar a reciclar os panfletos que reuniram e para defender a “liberdade artística”. Os apoiantes que fizerem donativos poderão receber isqueiros e T-shirts com o logótipo da empresa que não existe.

“Queríamos apenas manter o lixo fora da campanha eleitoral”, explicou ao The Washington Post Thilda Rosenfeld, membro do colectivo, garantindo que as partes não chegaram a assinar nenhum contrato.

A activista disse ainda que, no início, apenas estavam a tentar colocar “uma ideia” em prática. “Quando começou a funcionar, ficamos surpreendidos porque a AfD escolheu-nos várias vezes”, acrescentou.

Nas eleições de domingo na Alemanha, o Partido Social-Democrata (SPD) venceu por uma pequena margem, com 25,7% dos votos segundo os resultados preliminares, e a CDU/CSU caiu para 24,1%, o pior resultado da sua história. As negociações para o novo executivo prosseguem, com Scholz a garantir que é o seu partido que deve liderar o próximo governo. O candidato democrata-cristão, Armin Laschet, defende, por sua vez, que o seu partido tinha um mandato eleitoral para formar governo, apelando a verdes e a liberais para negociar consigo. No entanto, nem todos na CDU/CSU concordam e há quem peça que o chefe do partido conceda a derrota.

Já o partido nacionalista AfD desceu de terceira maior força parlamentar (e a maior da oposição) para quinta força a nível nacional, embora tenha sido a mais votada nos estados federados da Turíngia e da Saxónia, no Leste (antiga RDA).

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