Jogar doze minutos sem fim
Tal como prometido, não é preciso experiência em videojogos para a explorar a “narrativa interactiva” desenvolvida pelo português Luís António. A desvantagem? Não é só o protagonista que fica farto de repetir os mesmos doze minutos, sem fim.
O videojogo Twelve Minutes, do português Luís António, foi criado para ser uma espécie de filme interactivo, em que o jogador é o protagonista a viver, repetidamente, os mesmos doze minutos. Começa quando chega a casa, ao final do dia, até ao momento em que um alegado polícia entra e ataca a sua esposa, acusando-a de matar o pai dele. Dirige-se a fãs de Shining, de Stanley Kubrick, e Memento de Christopher Nolan. Não há quaisquer pistas, pontos, ou dicas ao longo do jogo, mas o objectivo parece básico: ajudar o protagonista a quebrar o ciclo. Não é fácil.
Uma das grandes críticas feitas a Twelve Minutes, que foi lançado a semana passada para PC e Xbox (21 euros), é a dificuldade em perceber o que o protagonista tem de fazer para avançar na história quando pode fazer quase tudo — mas é precisamente esse o desafio.
A estrutura do jogo é simples: a história centra-se nas quatro divisões da casa (kitchenette, casa de banho, quarto e arrecadação). A única opção é clicar no cenário (visto de cima) com o botão esquerdo do rato: seja para explorar o ambiente (abrir e fechar portas, ligar luzes, ver o que está dentro do frigorífico e de armários), guardar objectos (desde comprimidos a canecas, facas e telemóveis) ou falar com a mulher. A cada doze minutos, o ciclo recomeça. Por vezes, antes disso: se o protagonista for atacado pelo agente, ou se tentar sair do apartamento.
Como não é um filme, o jogador dita todas as acções do protagonista: desde comer pudim e dançar com a mulher, a fazer-lhe perguntas sobre o passado e acusá-la aos gritos de mentir. Tudo o que se aprende num ciclo pode ser usado no próximo.
A capacidade de o personagem principal agir de forma abusiva com a mulher (seja para a insultar ou “envenenar” com comprimidos para dormir) tem sido criticada online. O criador do videojogo, Luís António, argumenta, no entanto, que as acções do protagonista dependem dos valores e prioridades do jogador.
“O jogo não diz o que se deve fazer. O jogo torna-se o que alguém acha que devia estar a fazer”, explicou ao PÚBLICO Luís António, durante uma conversa no final de Julho, antes do lançamento do videojogo. “[O Twelve Minutes] joga um bocado com isso. Quais são as expectativas e o correcto e o errado de acordo com os valores da pessoa”, continuou, lembrando que o jogo destina-se a maiores de 18 anos.
“O público-alvo são adultos, pessoas com mais de 18 anos, visto que há violência e temas sérios”, sublinhou o designer português que está a trabalhar no jogo há vários anos.
O objectivo inicial era criar um jogo centrado numa cidade, com 24 horas de hipóteses para explorar. Com o tempo, a ideia foi rejeitada para evitar ciclos demasiado longos. Com doze minutos, deveria ser mais fácil, mas há ciclos em que o jogador sente que não aprendeu nada (ou talvez tenha aprendido que não vale a pena guardar todas as canecas no bolso do casaco).
Há alturas em que o videojogo, que tanto tenta ser um filme interactivo, parece demasiado irreal: por exemplo, o protagonista é capaz de gritar com a mulher para a convencer de que estão presos num ciclo interminável, antes de desistir (“deixa lá, esquece”, diz) e decidir que quer comer pudim.
Ainda assim, há vários desenlaces que quebram a prisão dos doze minutos. Nenhum é particularmente brilhante (o motivo de todo o drama acaba por ser um pouco decepcionante), mas o jogo em si é uma boa forma de passar o tempo. Numa sala de espera, por exemplo.
Também já há vários guias online a explicar como “vencer” o jogo.
Uma das promessas que Twelve Minutes cumpre é a facilidade em jogar. Não é preciso ser fã, nem “profissional” de videojogos. Basta um computador para começar a explorar a narrativa.
A história de Luís António recebeu uma pontuação de 8 (em 10) do site de críticas de videojogos IGN, e 53% (de 100) do PC Gamer. O áudio é em inglês — com vozes dos actores James McAvoy , Daisy Ridley, e Willem Dafoe — mas tem legendas em português de Portugal.