Estátua de Pedro Álvares Cabral pichada e incendiada no Brasil

Supremo Tribunal discute futuro das demarcações de terras indígenas. Autoridades investigam possíveis autores do acto de vandalismo no Rio de Janeiro.

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Imagens partilhadas nas redes sociais mostram incêndio Twitter

Uma estátua do navegador Pedro Álvares Cabral foi incendiada e pichada, esta terça-feira, no Rio de Janeiro. Este monumento está localizado no Largo da Glória, na zona Sul do Rio, com o acto de vandalismo a ser motivado pela discussão do futuro das demarcações de terras indígenas no Brasil.

O crime foi comunicado às autoridades, que investigam agora a identidade dos autores. Estão também a ser avaliados os danos causados pelas chamas à estátua, com as entidades locais a iniciarem um trabalho de limpeza do largo onde se encontra o monumento. As imagens partilhadas nas redes sociais mostram a extensão dos danos provocados pelo fogo. Pedro Álvares Cabral é o navegador português a quem se atribui a descoberta do Brasil a 22 de Abril de 1500. Este monumento feito em bronze foi inaugurado em Maio de 19o0, em comemoração dos 400 anos desde a chegada do navegador ao Brasil. 

Com recurso a tinta vermelha foram gravadas as palavras “Não PL490”, em protesto contra as novas regras de demarcação de terras previstas no projecto de lei 490. No Supremo Tribunal Federal (STF) está a ser discutido o “marco temporal”, que decidirá se as comunidades indígenas têm direito às terras nativas, mesmo que não as estivessem a ocupar no momento da promulgação da Constituição de 1988.

“São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”, pode ler-se no artigo 231.º da Constituição do Brasil. Contudo, o ponto de discussão prende-se com as terras que não estavam ocupadas no momento em que este documento constitucional entrou em vigor. Há, neste momento, mais de 30 disputas por terras que poderão ser decididas com o veredicto do STF sobre a matéria. Esta, pelo menos, era a intenção do antigo Presidente Michel Temer, em 2017, com advogados e activistas a levantar objecções, afirmando que não é possível estender o que foi decidido neste caso para todos os outros.

O conceito de “marco temporal” surgiu em 2009, durante o julgamento do caso Raposa Serra do Sol, no qual ficou decidido que apenas seria possível garantir os direitos dos índios às terras caso eles estivessem a ocupá-las no momento da promulgação da Constituição de 1988.

Esta decisão foi o ponto de ignição para um debate aceso que se prolonga há mais de uma década. Múltiplas vozes argumentaram que a perseguição intensa dos colonizadores obrigou muitos índios a abandonarem as suas terras de origem, algo que lhes retiraria, de acordo com o “marco temporal”, qualquer direito nas demarcações futuras.

Um dos casos mais sensíveis a ser disputado judicialmente é o do povo Xokleng, de Santa Catarina. Perseguidos e massacrados pelos colonizadores nas décadas iniciais do séc. XX, viram-se forçados a abandonar as suas terras. Contudo, em 1996, os Xokleng conseguiram obter a demarcação de 15 mil hectares – num território que triplicou de tamanho, para 37 mil hectares. A terra indígena Ibirama-Laklanõ alberga também índios Guarani e Kaingang.

O Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina reivindicou estas terras, com o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região a permitir a reintegração de posse desta área. A Fundação Nacional do Índio recorreu desta decisão para o STF, que decidirá sobre a matéria

Esta terça-feira, mais de 160 mil pessoas assinaram uma carta aberta contra a adopção do “marco temporal” e a pedir a protecção dos direitos indígenas. Académicos, juristas, artistas e outras personalidades das mais variadas áreas da sociedade brasileira emprestaram a assinatura à causa.

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