Programa Aldeia Segura para proteger do fogo “é mais show-off”, diz Xavier Viegas

Segundo dados disponíveis no site dos programas “Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras”, até ao momento participaram nos projectos 2057 aglomerados, mas só foram desenhados 826 planos de evacuação e realizados 281 simulacros.

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Xavier Viegas é defensor dos sistemas de monitorização e vigilância com câmara Adriano Miranda

O investigador Xavier Viegas criticou o programa “Aldeia Segura” por ser “mais show-off”, alertando que o trabalho junto das populações para as ajudar em caso de incêndio “tem estado bastante parado” e por existirem povoações prioritárias que foram preteridas.

Num momento em que o país atravessa um período de alto risco de incêndio, o especialista considera que o país está “mais bem preparado” para atacar os fogos do que estava em 2017, mas admite que poderá não ser suficiente e alerta que, no limite, poderá estar em causa a segurança das pessoas.

Caso se registe uma situação particularmente grave e extrema de propagação do fogo deixa de ser “possível fazer parar ou circunscrever o fogo por mais recursos que haja” e, nesses casos, é preciso contar com a população, alerta o professor em declarações à Lusa.

“No limite pode acontecer uma situação em que por mais forças que haja não se consegue acudir as pessoas, não se consegue proteger uma casa, nem defender uma aldeia. Daí ser tão importante, os cidadãos estarem preparados para, em última análise, conseguirem enfrentar e reagir”, sublinha.

Depois dos grandes incêndios de 2017, o Governo lançou os programas “Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras” para preparar as populações a reagir perante um fogo, através da realização de simulacros e planos de evacuação e com a identificação dos locais de refúgio e pontos críticos a evitar no caso de as chamas chegarem perto.

“O “Aldeia Segura” teve um arranque muito forte em 2018 mas, infelizmente, tem estado bastante parado nos últimos anos”, alerta o especialista, que tem acompanhado o programa.

Para Xavier Viegas, tem-se trabalhado de forma “pouco consistente” com apenas um “grupo reduzido” de pessoas: “O que vimos foi serem escolhidas aldeias e comunidades sem grande critério, relativamente à urgência que há em muitas aldeias para se trabalhar com a maior brevidade possível”.

Segundo dados disponíveis no site dos programas “Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras”, até ao momento participaram nos projectos 2057 aglomerados, mas só foram desenhados 826 planos de evacuação e realizados 281 simulacros. Mais de metade dos aglomerados que participaram nos programas tem identificados os locais de abrigo (1306) e de refúgio (1266), segundo os dados do site.

“A Aldeia Segura é mais show-off”. Quando há uma apresentação ou um simulacro, chamam a comunicação social, mas fora disso tem havido pouco trabalho consistente e permanente junto das populações”, lamenta. Questionado se o país está preparado para atravessar o actual período de alto risco de incêndio, o especialista lembra que este ano já houve outros dias de risco bastante elevado e “não se registaram grandes ocorrências”. Motivo: Houve poucas ignições. Xavier Viegas recorda que mais de 95% dos fogos são causados pela actividade humana - por descuido ou ato criminoso - e, por isso, é fundamental a actuação das pessoas: “Temos de ter mais cuidado e estar mais atentos para evitar focos de incêndio”.

Nos últimos anos, o país tem vindo a reforçar os seus meios, tendo hoje mais meios aéreos, mais forças de prevenção, detecção e combate, mas também “melhorou a qualidade da formação e treino” das pessoas envolvidas.

“Mas os avanços não correspondem ao desejável nem ao que poderia ter sido feito desde 2017”, lamenta, sublinhando que o país está “mais bem preparado, mas poderá não ser suficiente”. Desde 2017/2018, houve mais limpeza em torno das casas, das aldeias e dos caminhos, mas “ainda falta fazer muito em todo o território”.

O vazio deixado pelas populações que ao longo das últimas décadas foi trocando as zonas rurais pelas cidades também tem impacto na vigilância e combate aos incêndios.

“Há uns anos tínhamos pessoas a viver no mundo rural, mas essa já não é a nossa realidade e tivemos de substituir essa presença. Hoje temos militares e bombeiros mas também temos sistemas tecnológicos como os sistemas de videovigilância, drones e satélites”, sublinhou.

Xavier Veigas é defensor dos sistemas de monitorização e vigilância com câmara, que permitem perceber a evolução dos incêndios e assim tomar decisões no momento de enviar meios mas também acabam por ter o efeito dissuasor, uma vez que alguém com um intuito criminoso sabe que poderá ser detectado e apanhado.

“Não estou tão preocupado com os sistemas de detecção, porque os alertas são dados muitas vezes pelos cidadãos antes mesmo de serem identificados pelos postos de vigia e de outros sistemas de detecção. Hoje em dia há uma boa cobertura de rede e qualquer pessoa tem um telemóvel, por isso preocupa-me mais a questão da monitorização”. Xavier Viegas saudou o programa apresentado na quarta-feira pelo ministro do Ambiente - “Resiliência dos Territórios Face ao Risco” - que conta com 45 milhões de euros para acções de recuperação, beneficiação e rearborização de áreas florestais.

“Os programas agora lançados são importantes e exemplares, mas só vão mostrar resultados dentro de alguns anos. São um caminho que se devia ter começado há, pelo menos, uma dezena de anos, mas são um caminho”, disse.