Há trabalho forçado nas fábricas que fornecem a chinesa Shein? A retalhista online não responde

Nos últimos 18 meses, a Shein conquistou o mundo da moda fast fashion. As contas do Instagram e TikTok da empresa têm mais de 23 milhões de seguidores.

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Dado Ruvic/Reuters

A Shein, empresa retalhista chinesa que opera online e que chega a todo o mundo, não divulga as condições de trabalho ao longo de toda a cadeia de abastecimento. Esta informação é exigida por lei em vários países onde vende, como o Reino Unido, e a Reuters descobriu que recentemente a marca colocou no seu site declarações falsas sobre as condições nas fábricas, referindo que estas estavam certificadas por organismos internacionais.

Na Grã-Bretanha, as empresas acima de um determinado tamanho devem declarar nos seus sites as medidas que estão a tomar para combater o trabalho forçado. A página de “responsabilidade social” de Shein afirma que “nunca, nunca” se envolve em trabalho infantil ou forçado, mas não fornece os dados da cadeia de abastecimento, que são exigidos pela lei britânica. Na página portuguesa também não são feitas quaisquer referências aos fabricantes com quem trabalha, fazendo uma declaração generalista: “Não poderíamos fazer o que fazemos sem os nossos incríveis funcionários, parceiros e fornecedores. É por isso que promovemos um ambiente de trabalho seguro, justo e feliz para todos.”

À Reuters, no início do mês, a Shein recusou-se a fornecer os dados da sua receita anual, mas os analistas calculam que a avaliação da empresa é de 15 mil milhões de dólares (12,6 mil milhões de euros), e a sua receita anual é de pelo menos cinco mil milhões de dólares (4,22 mil milhões de euros). O porta-voz da empresa chinesa informou que estão a ultimar as declarações exigidas pela lei britânica e que essas serão publicadas no site “nas próximas semanas”. O Governo respondeu que não comenta casos específicos.

Na Austrália, uma lei semelhante exige que as empresas com receita acima de 100 milhões de dólares australianos (62,54 milhões de euros) anuais submetam uma declaração sobre escravidão moderna à Força de Fronteira Australiana. Embora esta ainda não tenha recebido qualquer declaração da retalhista asiática, o porta-voz da Shein diz que tudo está de acordo com a lei australiana.

Baixos preços, falta de transparência

Nos últimos 18 meses, a Shein — uma empresa privada, cujo nome oficial é Zoetop Business Co Ltd, com sede na China e os seus maiores investidores incluem a Sequoia Capital China e a Tiger Global Management —, conquistou o mundo da moda fast fashion. As contas do Instagram e TikTok da empresa têm mais de 23 milhões de seguidores. Em Junho, de acordo com a SimilarwebSeu, empresa de análise de tráfego na Internet, o site atraiu mais de 160 milhões de visitantes, ultrapassando a Zara e a H&M.

Além destas duas retalhistas europeias, outras concorrentes são a ASOS, Boohoo e Zalando. Todas elas têm declarações públicas nos sites, bem como informações detalhadas sobre as suas cadeias de abastecimento, como listas das fábricas e códigos de conduta. Por exemplo, o site da H&M inclui uma lista, que pode ser descarregada, com os nomes e moradas de milhares de fábricas e instalações de processamento. A Inditex tem um código de conduta de oito páginas, também para descarregar, e um mapa que mostra o número de fábricas e fornecedores em cada país.

Os preços extremamente baixos e a falta de transparência levaram as organizações de defesa do trabalho, incluindo o Worker Rights Consortium e o Business & Human Rights Resource Centre, a questionar como é que a Shein produz as suas mercadorias de forma tão barata.

No final de Julho, a Shein informou a Reuters que as fábricas com as quais trabalhava foram “certificadas” pela Organização Internacional de Padronização (ISO) e que estava “orgulhosamente em conformidade com os rígidos padrões de trabalho estabelecidos por organizações internacionais como a SA8000”. Essa informação estava no seu site.

A SA8000 é uma norma de sistemas de gestão baseada nos princípios internacionais de direitos humanos descritos pela Organização Internacional do Trabalho e as Nações Unidas, que mede o desempenho das empresas em oito áreas, incluindo trabalho infantil, trabalho forçado e saúde e segurança. A ISO é uma organização global que desenvolve padrões comerciais, industriais e técnicos. As empresas contratam organismos de certificação para implementar e auditar esses padrões nas suas organizações.

Contudo, a ISO apenas define os padrões e não realiza certificações por conta própria, informou um porta-voz. Logo, uma empresa “não pode ser credenciada ou certificada pela ISO”, esclareceu. Já a Social Accountability International, que administra a norma SA8000, disse que a Shein não foi certificada por meio de seu programa e que não teve nenhum contacto para tal. Voltando a ser questionada pela Reuters, a Shein retirou essa informação do site.