Fotografia
Agrações, uma aldeia portuguesa de 12 habitantes à espera do fim
A estrada que rasga em dois a aldeia de Agrações, a 25 quilómetros de Chaves, não liga a lugar nenhum. Quem passa por lá não tem outro remédio que não seja voltar para trás pelo mesmo caminho após o corte abrupto da via. Nas margens da rua sem saída que, ironicamente, se chama 25 de Abril, vivem apenas 12 pessoas. "Aqui não há saneamento básico nem água corrente", descreve o fotógrafo Tiago Fonseca ao P3, em entrevista. "Cada habitante teve de construir o seu próprio depósito de água para as casas de banho e para os animais."
A maior parte das casas permanece vazia, ao abandono, e as que continuam habitadas guardam entre paredes sobretudo saudade: saudade do tempo em que a aldeia tinha vida, saudades dos filhos emigrados em França, na Suíça. "A história é igual em muitas aldeias portuguesas, sobretudo no Norte do país", refere o autor do projecto O Buraco, referindo-se ao ritual anual que enche de filhos e netos as aldeias durante o mês de Agosto.
É comum, ao caminhar por Agrações, não se ver vivalma. "Não se ouve ninguém, tirando os cães", observa Tiago Fonseca. "As pessoas acordam cedo, deitam-se cedo. Ao fim-de-semana vão à Igreja, que não é ali, mas sim em Póvoa de Agrações, a aldeia vizinha." São "vidas de trabalho" de uma população de idade média superior aos 50 anos. "Vivem sobretudo da agricultura, dos animais que criam, e também da apanha da castanha. Não têm dias de folga ou fins-de-semana sem tarefas. Trabalham todos os dias."
Na aldeia vive apenas um casal jovem entre dez idosos. "Devem ser mais jovens do que eu", refere o fotógrafo de 34 anos, natural de Santa Maria de Lamas. "Ambos cresceram na aldeia e o rapaz herdou lá uma casa. Ela trabalha num hotel, em Vidago, e vivem ali por ser mais económico." Durante os vários meses de desenvolvimento do projecto, entre Janeiro e Setembro de 2020, o fotógrafo sentiu ter sido bem recebido pelos poucos habitantes da aldeia. "O acesso às casas era difícil. Nuna pedi para fotografar dentro das casas e só fui quando me convidavam. Cheguei a almoçar com um casal que vive lá. O casal mais idoso."
Nas muitas conversas que teve com os residentes, percebeu que todos sabem que "quando eles desaparecerem, Agrações irá com eles", que "tudo ficará ao abandono, entregue ao fogo e aos animais". E ninguém vê uma alternativa a esse fim. "Não estou a ver a autarquia a fazer obras ou a criar infra-estruturas para servir 12 pessoas", lamenta o fotógrafo, que "sempre quis falar de despovoamento". "Todos os anos há promessas, mas as medidas que se implementam atraem pouca gente. E falo por mim, que hoje não tenho vontade de morar no interior. É necessário investimento para reverter esta tendência." Agrações é um símbolo do despovoamento do interior português, "mostra perfeitamente os problemas que afectam as aldeias do interior de Portugal". "Um país cheio de desigualdades."
A série O Buraco, que foi desenvolvida no âmbito da masterclass de Fotografia com o fotojornalista Mário Cruz, foi distinguida na última edição do concurso Estação Imagem, o que, para Tiago, foi uma surpresa. "Só comecei a fotografar em 2016 e a pensar a sério na fotografia como carreira profissional aos 27 anos." Actualmente dedica-se à Fotografia a tempo inteiro.