Os emojis podem ajudar a combater o assédio online
Perceber como diferentes países usam ícones de corações e bonecos nas mensagens pode ajudar sistemas automáticos a barrar conteúdo impróprio. Portugal é dos que menos os usa.
Mensagens online com pequenos ícones de corações azuis no meio são muito populares nas nações do Médio Oriente; no mundo ocidental é mais frequente usar bonecos com diferentes emoções, como alegria ou tristeza. No Brasil, o coração é reservado para publicações sobre a família, enquanto nos EUA esse tipo de publicações raramente vêm com símbolos anexados. Em Portugal, o ícone a chorar de tanto rir é dos mais utilizados, mas o país está entre aqueles onde menos se usam bonecos nas mensagens.
Estas conclusões surgem num estudo do Instituto de Ciências e Informação da Universidade do Sul da Califórnia que foi publicado esta semana na revista académica Online Social Networks and Media. Baseia-se na análise de mais de quatro milhões de publicações da rede social Twitter de trinta idiomas e países diferentes, incluindo português de Portugal, que foram recolhidos ao longo de 29 dias. Foram considerados 1700 emojis.
A equipa defende que perceber como diferentes países e línguas usam emojis (ícones que ilustram mensagens) pode ajudar sistemas de inteligência artificial a perceber melhor a forma como as pessoas falam online. Por exemplo, quando é que alguém está a ser irónico.
A teoria é que podem existir vantagens em “deixar de tratar emojis como ‘palavras’ universais que têm a mesma implicação em todas as línguas e países.” Isto pode ser usado para melhorar sistemas que filtram mensagens online para assédio, ou para adaptar programas de computador que simulam conversas (os chamados chatbots) a diferentes culturas.
Diferenças geográficas
Os resultados mostram que o lugar de onde alguém escreve influencia mais o uso de emojis do que a língua em que escreve. Embora a palavra “emoji” tenha origem no japonês, os países com uma maior percentagem de ícones nas mensagens são a Indonésia (36,54% das mensagens online têm bonecos), as Filipinas e o Kuwait. Portugal está entre os países onde há menos ícones: 12% das mensagens publicadas no Twitter em território nacional incluem estes bonecos. A Índia (11%) e a Venezuela (8%) estão no fim da lista.
Regra geral, porém, os emojis mais utilizados tendem a ser parecidos: sorrisos e caras com diferentes emoções no topo, seguidos de emojis de comida, bebida ou actividades. Bandeiras nacionais são os menos escolhidos. Mas há excepções. “Descobrimos que o Médio Oriente tem um uso de emojis muito diferente do resto do mundo, com o emoji de um coração azul a ser imensamente popular”, partilha com o PÚBLICO Mayank Kejriwal, que liderou a investigação da Universidade do Sul da Califórnia.
O Twitter foi a plataforma escolhida por apelar a uma grande variedade de utilizadores. “As pessoas mais novas usam mais o Tik Tok, enquanto os baby boomers [pessoas nascidas entre 1946 e 1964] usam mais o Facebook”, nota Kejriwal.
Apesar de o estudo ser deste ano, a equipa optou por analisar dados de 2016. “Foi uma escolha deliberada”, explica Kejriwal. “Não estávamos à procura de tendências específicas (como por exemplo como as pessoas usam emojis após uma eleição, ou um evento desportivo específico como a final do Campeonato do Mundo) mas sim tendências gerais”, continua. “Queríamos escolher um mês no período pré-pandémico que fosse suficientemente estável.”
“Devido à proliferação de línguas francas dos tempos modernos, como o inglês e o espanhol, o país e a nacionalidade de uma pessoa podem servir como um marcador mais distintivo da sua identidade social do que a sua língua”, sugerem os investigadores.
Com a pandemia, os ícones mais usados em todo o mundo mudaram. Segundo dados desta semana, partilhados pelo Facebook a propósito do dia mundial do emoji, a 17 de Julho, tem-se notado um aumento do uso de emojis com protecção facial, micróbios, e vacinas devido à pandemia da covid-19.
Os investigadores da Universidade do Sul da Califórnia defendem que “são necessários mais estudos sociológicos” para perceber o efeito da proliferação do uso de “símbolos não linguísticos, mas culturalmente relevantes” como é o caso dos emojis. “Os resultados que apresentamos podem ser usados para melhorar a análise de sentimentos e algoritmos que procuram opiniões [de redes sociais], especialmente em contextos multilingues e culturalmente diversos”, conclui-se.